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Samaná Luís Maio

Samaná: Praia e autenticidade na República Dominicana

Por Luis Maio

Algumas das praias mais bonitas e das paisagens mais luxuriantes da República Dominicana encontram-se em Samaná, a península que ocupa a ponta nordeste da ilha. Luís Maio foi a banhos, mas também aproveitou para conviver com o pitoresco local e até passou uma tarde inteira nas lutas de galos

Os encantos naturais de Samaná começaram por chamar gente de fora nos anos 70 do século passado. Ou seja, mais de uma década antes de Punta Canta colocar a República Dominicana nos roteiros das agências de viagens.

Na altura não havia quase nada neste canto remoto da ilha, cuja venda para fins militares chegou a estar apalavrada com os Estados Unidos. Os primeiros a procurar Samaná como destino de férias eram viajantes singulares, um pequeno contingente formado por dominicanos citadinos e alguns aventureiros estrangeiros pelo meio. Jogando na antecipação, boa parte acabou por comprar por tuta e meia o seu canto de paraíso à beira-mar.

Se Punta Cana virou zona internacional do dia para a noite, já a menos acessível antes eram precisas cinco horas de carro para lá chegar desde Santo Domingo, capital da ilha, Samaná foi crescendo desde então a conta-gotas.

A inauguração do aeroporto internacional El Catey, em 2006, seguida da abertura da auto-estrada de ligação a Santo Domingo, denota uma estratégia concertada da parte das autoridades para promoverem o desenvolvimento turístico da região. Por enquanto, todavia, esse crescimento é relativo e perfeitamente equilibrado.

As primeiras vagas de expatriados gente de cultura hippie/new age, na maior parte de origem francesa limitaram-se a abrir pequenas pensões e restaurantes, enquanto o mais recente fluxo de dominicanos com posses tende a fixar-se em condomínios fechados. Entre o independente e o chique, esta demografia está longe de constituir uma multidão e concentra-se em estâncias balneares de pequena dimensão. Resorts tudo incluído, por outro lado, contam-se ainda pelos dedos de uma mão.

Samaná não é certamente um segredo bem guardado, mas também não parece para já ameaçada pelo turismo de massas. Em relação a outros destinos mais problemáticos das Caraíbas, a península dominicana oferece as vantagens da hospitalidade e da segurança, a que se deve acrescentar a da suavidade dos preços. Não partilha, no entanto, do carisma e do hedonismo que faz a fama de concorrentes como a Colômbia ou a Jamaica. A única chatice, pelo menos para uma certa franja de turistas, é que Samaná não conhece animação nocturna, nem nada que se pareça.

Praias imaculadas

A península é banhada pelas águas do Atlântico, mas para todo o efeito é "Caribe" puro. Ou seja, a conjugação de elementos que fazem a magia das Caraíbas incluindo sol tórrido e calor húmido, mar tépido e transparente, praias de areias brancas e cortinas de palmeiras, reproduz-se um pouco por todo o litoral de Samaná.

Numa escala que só varia entre o bom e o excelente, as melhores praias são aquelas que se alinham nessa espécie de pinça de caranguejo que remata a ilha a nordeste, entre os cabos Cabron e Samaná. São praias virgens, livres de quaisquer construções e equipamentos, acessíveis apenas por barco ou 4X4. A base de operações é a pequena aldeia piscatória de Las Galeras, onde a estrada acaba, a meio caminho entre os dois cabos.

A oeste de Las Galeras, a 40 minutos de jeep e a meia hora de lancha, encontra-se a Playa Rincón. Esta unha de areal dourado alonga-se por sete quilómetros, até atingir a foz do rio do mesmo nome, que desagua aos pés das falésias de Cabo Cabron (600 metros de altura). O areal é estreito, mas continuamente bordejado por palmeiras, dando lugar a uma densa floresta tropical por alturas do cabo. Não se encontra vivalma a maior parte do tempo, exceptuando nas proximidades do rio de águas frias, onde os dominicanos gostam de se ir refrescar e tirar o sal. Aproveitam depois para aviar umas cervejas e encomendar peixes na grelha, nas duas únicas e toscas barracas de madeira, montadas à beira rio.

A Playa do Rincón é muitas vezes citada como das melhores do mundo. Quem, porém, visitar outras também selvagens na ponta inferior da pinça de caranguejo, no mínimo hesitará sobre qual merece a primazia. As praias Madame e Frontón podem ser mais exíguas, formando areais em concha, apertados entre falésias, mas isso também lhes confere outro dramatismo.

A praia Madame fica a um par de quilómetros a oriente de Las Galeras (20 minutos a pé) e é enquadrada por um fotogénico colar de rochedos, que formam grutas e lagunas. O tipo de praia que é perfeitamente recomendável para famílias, mesmo se nem sequer dispõe de barraquinha de gelados. Bem mais complicado é o acesso à Playa Frontón, que só se atinge de lancha ou por um trilho de duas horas no meio da selva. O prémio é uma praia de 450 metros de comprimento por 14 metros de largura, rodeada a três quartos pelas paredes rochosas do Cabo de Samaná, que aqui se elevam a 200 metros de altura. O principal encanto são, no entanto, as águas transparentes e cheias de peixes multicolores, fazendo dos óculos de mergulho um adereço de exploração indispensável.

Estas praias virgens são autênticos paraísos, mas é preciso tomar cautelas, sobretudo com os cocos no alto das palmeiras, que em queda livre se podem converter em mísseis assassinos.

Esse problema já não se coloca nas praias mais civilizadas de Samaná, onde os frutos dos coqueiros são regularmente colhidos para evitar acidentes. É o que sucede na muito justamente designada Playa Bonita, meia dúzia de quilómetros a oeste de Las Terrenas. As areias imaculadas, as águas cristalinas e cheias de peixes não destoam do melhor da costa da península, mas aqui as palmeiras crescem em áreas ajardinadas e entre elas espreitam alguns dos condomínios e casas de hóspedes mais elegantes da ilha. No capítulo da praia elegante e com estilo, a Bonita é virtualmente imbatível.

Depois há sempre Cayo Levantado, também muito formoso, mas que já pertence a outro campeonato. Coberto por profusa vegetação tropical, aos pés dos quais espreitam línguas de areia de uma brancura luminosa, banhado por águas de um feérico azul-turquesa, o ilhéu sete quilómetros a sudeste de Santa Bárbara de Samaná é um verdadeiro monumento natural.

Acontece que a cadeia Bahía Príncipe comprou três quartos desse encanto, o que é um seguro benefício para os clientes do luxuoso resort, mas uma fronteira para os demais. Em compensação, o outro quarto do ilhéu continua a ser público e é nele que se encontra a mais fotogénica das suas praias, aquela mesma em que foram tiradas as fotografias de uma famosa campanha do rum Bacardi.


Outras águas

As principais atracções da península são todas naturais, mas nem todas são praias. A mais emblemática é sem dúvida o Parque Nacional dos Haitites, mancha verde de 600 quilómetros quadrados, que bordeja a costa meridional da Baía de Samaná, espraiando-se depois para o interior. É um território de pequenas montanhas onduladas, rematadas no mar por um sem número de ilhéus chamados mogotes.

Os ilhéus calcários, que se elevam 30 e 40 metros a pique sobre as águas, formam uma espécie de cortina que bloqueia os ventos, fazendo de Los Haitites a zona com maiores índices de pluviosidade da ilha (2000-2500 mm anuais). É, por consequência, uma região de floresta húmida, pântanos e mangais, onde se dão bem pequenos peixes e mariscos, que servem de sustento à sua extraordinária biodiversidade.

O interior do parque é impenetrável, à excepção de um pequeno trilho de quatro quilómetros, delineado a partir de Sabana de la Mar, povoação que marca o limite inferior da área classificada. O principal acesso faz-se por barco, em excursões de lancha que partem de Sabana, ou então de Sanchez, na fronteira setentrional do parque. O que mais deslumbra pelo caminho são as falésias costeiras cobertas de floresta cerrada e os mogotes carregados de pássaros de todos os tamanhos e feitios, desde garças a pelicanos, passando por pombos e abutres. As principais paragens em terra firme fazem-se à beira de grutas, esculpidas em terrenos calcários pela constante erosão das águas.

Três dessas grutas exibem pictogramas, isto é, desenhos pintados nas paredes à maneira de grafitos pelos indígenas Taíno (exterminados pouco depois da chegada de Colombo). O destino mais comum das lanchas é a Gruta da Linha, assim chamada pela contiguidade com o antigo terminal da linha ferroviária que ligava as plantações locais de cana do açúcar e banana com a capital dominicana.

Há muito que estas explorações agrícolas foram desafectadas e o que resta da linha é uma fila de pedras, que agora mais parece uma obra de land art. Os motores das lanchas costumam também calar-se à beira da gruta de São Lourenço, sem acesso por terra, mas onde desemboca um riacho, que oferece aos turistas a oportunidade de mergulharem em água doce.

Outra maravilha natural onde também se vai a banhos é o Salto El Limón, junto da aldeia do mesmo nome, a cerca de três quilómetros de Santa Bárbara de Samaná. Trata-se de uma cascata monumental formada por três quedas de água que se precipitam de 47 metros de altura, para se juntarem numa piscina natural, suficientemente profunda para os chamados "Tarzans do Limón" desempenharem saltos acrobáticos lá de cima.

Os visitantes podem chegar a pé, através de um trilho de apenas um quilómetro, mas que para lá é sempre a subir e quando chove é impraticável. O que torna mais recomendável os programas que oferecem a cobertura do trajecto a cavalo mais almoço por cerca de 25€, organizados pelos agricultores que vivem à beira da estrada.


Pitoresco garantido

Em Punta Cana toda a gente é de fora, inclusive os dominicanos que lá estão a trabalhar. Muito pelo contrário, a Península de Samaná tem uma população de 100 mil residentes, a maior parte dos quais se dedica a actividades tradicionais, como a agricultura e a pesca. É uma segura mais-valia, que confere à província uma autenticidade inverificável em destinos das Caraíbas mais turísticos, Sobretudo quando a maior parte desta população vive e trabalha literalmente, ou quase, no meio da rua.

As residências unifamiliares declinam o mesmo modelo singelo: são metade tijolos de cimento, metade ripas de madeira, cobertas por chapas de zinco reforçado com folhas de palmeira. Fazem pouco uso do vidro, mas em compensação não dispensam as grelhas em ferro forjado nos pátios e nas janelas.

Os estabelecimentos comerciais são tão ou mais precários, muitos simples barracas pintadas com desenhos e letras de fantasia popular. As mulheres andam de rolos de cabelo na rua, os homens não perdem uma oportunidade de jogar dominó, as crianças brincam descalças nas ruas. Toda a gente se reúne nos colmados, mercearias-botequins onde o que mais sai é cerveja Presidente e Bandeira, o prato nacional à base de frango, arroz e feijão.

A maior colónia de expatriados concentra-se em Las Terrenas, onde têm vindo a abrir pequenos negócios apontados ao turismo independente. O que é notável é que estes estabelecimentos alternativos não marginalizam, mas inserem-se sem descontinuidade no meio dos locais, produzindo uma salutar compressão e misturada na dezena de quarteirões que constituem o centro de estância.

Na mesma rua encontra-se um talho que vende frango ao livre ao lado, uma loja de material de mergulho, um restaurante italiano, uma livraria de bíblias, um bar de cocktails e uma carrinha que vende ao desbarato lotes de vestuário em algodão importados do Panamá. Esta invulgar harmonia do pitoresco e do cosmopolita terá os dias contados, mas por enquanto é ainda uma das delícias de Samaná.


Lutas de galos

O entretenimento número um do país. A luta de galos é o entretenimento número um na República Dominicana. Ganha, porém, especial relevância em áreas agrícolas como a Península de Samaná, onde constitui a principal, ou mesmo a única, diversão partilhada pela população masculina.

É uma coisa comunitária, de bairro ou de vizinhança, e há centenas de arenas semelhantes a praças de touros em ponto pequeno disseminadas por toda a província. Às sextas, e sobretudo aos domingos à tarde, é nestas "galleras" que marcam encontro os homens das redondezas, independentemente da cor da pele ou da classe social.

Chegam primeiro os criadores e treinadores das aves, que vêm cedo para encontrar o oponente mais conveniente para o seu bicho. Os potenciais duelistas vão primeiro para uma balança, depois são colocados frente a frente, para se compararem em altura e capacidade de resposta. Começa a discussão, as provocações, os insultos, as acusações de cobardia e até parece que são os donos dos galos quem se presta a defrontar-se no ringue. Estes preliminares constituem, no entanto, a parte mais pacífica do ritual.

Uma vez combinado quem vai à guerra com quem, os animais passam a ser armados para o efeito. Implica cortarem-lhes as esporas naturais e, no lugar destas, colarem-lhes às patas esporas artificiais (lacadas), de modo a que nenhum parta em vantagem sobre o outro. Tudo isto se passa num terreiro ao ar livre, mas coberto, à entrada do redondel, onde finalmente se entra (bilhetes a dois euros, cortados pelo polícia de serviço no local) já ao entardecer.

Mal os galos são colocados aos pares na arena, saltam rolos de notas dos bolsos dos assistentes e é com elas à vista que se aposta, de forma cada vez mais intensa e ruidosa à medida que o combate avança. Há na realidade uma chocante (para quem está de fora, pelo menos) assimetria entre o fragor da parada de apostas e o profundo silêncio com que os animais se debicam até à morte.

Morte que, se está prevista, muitas vezes não acontece. Na verdade, dos cinco combates a que assistimos só um acabou com um dos oponentes inerte. De resto, as lutas duram cinco minutos e ganha quem apostar no galo que no final desse tempo estiver por cima. Encerrado o espectáculo, chegam as mulheres e toda a gente se junta para dançar e beber cerveja (única bebida à venda) no terreiro de entrada. É outra festa que começa aí, mas não convém chegar demasiado perto de quem está a beber para esquecer o que, se calhar, nem tinha.

Será quase escusado dizer que as lutas de galo são um desporto aberrante, mas para quem vai só para experimentar tem a virtude de levantar uma série de questões.

Porque será que os dominicanos, povo de brandos costumes, quando chega a hora de se divertirem não se contentam com menos que o sangue e o sofrimento dos animais? O que é que uma luta de galos tem de mais nobre ou de mais condenável que uma corrida de touros? Vale a pena banir os espectáculos de lutas entre animais antes de pararmos de os matar para comer? Aliás, quem consegue comer frango ao jantar no resort, depois de assistir a estes banhos de sangue?

Como ir

A modalidade mais directa e também mais económica de explorar Samaná é comprar um pacote como o da Soltour, que oferece avião directo (White Airways) + hotel tudo incluído (Bahía Príncipe), entre os 750 e os 1000€ por semana. Os viajantes independentes têm a alternativa de viajar com a Air Europa (via Madrid) para Santo Domingo (a partir de 300€) e depois seguirem de auto-estrada (90 minutos) até Santa Bárbara de Samaná.


Onde ficar

Península House
Camino Cosón - Las Terrenas, Samaná
Tel.: 1(809) 3627447
www.peninsulahouse.com
Mansão vitoriana plantada entre coqueiros à beira-mar, apenas seis quartos, não aceitam crianças. Um dos cinco melhores alojamentos segundo a Condé Nast em 2010. Duplos desde 430€.

Serenity House
Las Galeras
Tel.: 1(809) 5380000
www.villaserena.com
Uma versão um pouco menos faustosa, mas bem mais acessível, da Península House, semeada a meio da praia das Galeras. Duplos a partir de 45€.

Hotel Residence Playa Colibri
Calle Francisco Tamayo Deno, Las Terrenas
Tel.: 1(809) 2406434
www.playacolibri.com
Apartamentos em edifícios elegantes de três andares frente ao mar, perto do centro, mas já longe da agitação de Las Terrenas.
Duplos desde 30€ (num regime de ocupação semanal).


O que fazer

A baía de Samaná é um santuário de baleias corcunda, que aqui vêm acasalar e produzir descendência durante o Inverno, chegando a colónia a registar 4000 espécimes. Há várias agências de avistamento de baleias que organizam excursões, entre 15 de Janeiro e 20 de Março.

A Fugas viajou a convite do Ministério do Turismo da República Dominicana

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