Poucas pessoas saem bem da investigação feita por Benjamim Wallace e cujos direitos foram já comprados pela indústria de Hollywood. O caso dá mesmo um filme, porque não se trata de uma simples falsificação de vinho. Na fraude e no seu esclarecimento estão envolvidos alguns dos mais importantes laboratórios de Física do mundo, inúmeros institutos estatais da Alemanha e dos Estados Unidos, as principais leiloeiras do planeta, os mais renomados produtores de Bordéus, inúmeros milionários e os críticos de vinho mais influentes do sector. Quando a história chegar aos ecrãs de todo o mundo, é de esperar um abalo ainda maior ao provocado pelo filme Mondovino, de Jonathan Nossiter.
Os factos apurados parecem estar do lado de Benjamim Wallace, embora alguns dos envolvidos continuem a negar as evidências e tenham recorrido aos tribunais para se defenderem da insinuação de terem agido criminosamente. Michael Broadbent, por exemplo, conseguiu que a venda do livro fosse suspensa em Inglaterra. Mas a sua reputação ficou seriamente abalada. Antes deste caso, a sua palavra era o selo de garantia de qualquer vinho.
Foi Broadbent que convenceu Rodenstock a leiloar uma das tais garrafas Lafite 1787, apesar de nos arquivos do famoso produtor bordalês, hoje baptizado de Lafite Rothschild, não haver qualquer referência a esse lote supostamente encomendado por Thomas Jefferson. O valor atingido superou todas as expectativas e foi notícia mundial.
As suspeitas surgiram uma semana depois, quando a pesquisadora Cinder Goowin, que passara 15 anos investigando os arquivos de Thomas Jefferson em Monticello (o palácio da Virgínia que foi propriedade do terceiro presidente dos Estados Unidos e onde está reunido o seu espólio), publicou um relatório questionando a autenticidade das garrafas.
Depois de consultar os registos de todos os vinhos comprados por Thomas Jefferson (o político era um enófilo organizado e registava meticulosamente todas as suas despesas), Goodwin descobriu uma carta com uma encomenda de vinhos Lafite do ano de 1784 e não de 1787, o ano da garrafa leiloada. A investigadora notou também que no lote de Hardy Rodenstock atribuído a Jefferson havia garrafas de vinhos de quatro chateaux diferentes gravadas com as mesmas iniciais e da mesma maneira, o que não fazia sentido, uma vez que o político tinha o hábito de comprar o vinho directamente na propriedade. E, sendo assim, cada château gravaria o vinho de maneira diferente. Testes posteriores feitos à técnica de gravação provaram que esta tinha sido feita com recurso a um instrumento moderno, provavelmente uma broca de dentista.
Mas, descartada a propriedade das garrafas, restava ainda provar que o vinho era mesmo daquele ano. Não foi fácil. Depois do leilão da Christie`s, Hardy Rodenstock vendeu duas garrafas do suposto lote de Thomas Jefferson ao coleccionador alemão Hans-Peter Frericks por 9100 dólares. Em 1989, Frericks decidiu leiloar parte da sua adega e contactou a Sotheby`s, cujo responsável pelos vinhos concluiu que uma boa parte dos vinhos, comprada através de Rodenstock, era falsa. Frericks contactou então a Christie`s, que aceitou leiloar as garrafas. Mas, à última hora, Rodenstock exigiu que Frericks as retirasse, argumentando que lhas tinha vendido para serem consumidas e não leiloadas.