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Um jardim que sobe pelas paredes

Por Liliana Pascoal Borges

Se lhe vem à mente uma hera suja que trepa pela fachada de uma casa quando pensa em jardins verticais, esqueça. Nas paredes exteriores de uma casa da Lapa, em Lisboa, há uma obra de arquitectura paisagista.

Os bairros incaracterísticos, anónimos, sem nada que os distinga, podem ter os dias contados. Pelo menos é esse o objectivo de Luís Rebelo de Andrade, Tiago Rebelo de Andrade e Manuel Cachão Tojal, os arquitectos que projectaram um jardim vertical na recuperação de um edifício devoluto na Travessa do Patrocínio, na Lapa, em Lisboa. O espaço verde que sobe pelas paredes ocupa 100 metros quadrados, preenchidos por cerca de 4500 plantas, de 25 espécies diferentes.

Para além de funcionar como uma pintura e uma escultura viva que atrai muita gente para a contemplar, o jardim garante o equilíbrio térmico do edifício, reduzindo os gastos de energia e tornando-o mais sustentável. Luís Rebelo de Andrade, responsável pela coordenação do projecto, vê nele uma solução estética e de rentabilização de espaço, mas também uma intervenção ecológica. "Hoje em dia as cidades vivem com problemas de poluição muito complicados. Isto é um upgrade", afirma.

"Quando apresentámos o projecto, chamaram-nos malucos", conta Tiago Rebelo de Andrade. "Mas nós tínhamos de marcar a nossa passagem por este mundo. Não podíamos fazer um revivalismo qualquer, mas alguma coisa inovadora, que se destaque do que há no mercado", justifica Luís Rebelo de Andrade.

João Salgueiro, director da ADN Garden Design, uma marca dedicada à construção destes jardins, explica que "a estrutura foi desenhada com base nas indicações dos arquitectos, em coordenação com eles, e demorou dois meses a ser criada".

Luís Rebelo de Andrade detalha como foi construída a estrutura. "A casa, em termos de construção, é totalmente tradicional, com betão, e depois, por fora, levou uma estrutura pendurada na fachada e solta dela. Criou-se uma fachada ventilada, o que evita problemas de humidade. Nessa construção, agarrada a um painel de PVC, são postas duas mantas. Entre elas é colocado um sistema de rega e na manta de fora são abertos uns rasgos onde são postas as plantas. Depois o sistema trata de as alimentar com os nutrientes indicados."

Esta técnica de cultivo de plantas sem terra é conhecida por hidroponia, sendo todos os ingredientes necessários à vida da planta fornecidos automaticamente através de uma solução aquosa nutriente. O material da manta utilizada na construção do jardim vertical baseia-se em fibras sintéticas e de algodão "provenientes do mercado nacional", sublinha João Salgueiro, acrescentando que ele permite "um desenvolvimento radicular sustentado".

Os arquitectos pediram especificamente plantas portuguesas, criadas em viveiros nacionais. "Sabemos que os viveiros importam muito e quando o fazem criam muitos problemas porque as plantas adaptam-se mal."

Apesar de o projecto ainda estar em fase de conclusão, o jardim já parece pronto há cerca de um ano, o que confirma a durabilidade da instalação, reforçada pela opção por "plantas espontâneas que aparecem nas nossas dunas, plantas autóctones, plantas resistentes, adaptadas à exposição deste edifício."


Esqueça as velas aromáticas

Por acreditarem que "a arquitectura é feita para os cinco sentidos", os arquitectos arrumaram as plantas aromáticas consoante as funções da casa. "Nos quartos temos alfazema, na piscina temos caril e na sala temos o alecrim. Cada compartimento tem o seu cheiro próprio, fruto das plantas a que estão associados." O projecto previa a utilização dos parapeitos das janelas da cozinha como canteiros de ervas de culinária e pequenas plantas de cultivo, como morangos. A ideia acabou por não avançar porque exigiria dois tipos de sistemas de rega. "Há que ir arrumando as coisas com algum bom senso, deixando umas ideias e conjugando outras."

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