Está um homem sozinho sentado a uma das mesas do LAB, um dos dois restaurantes do chef catalão Sergi Arola na Penha Longa, em Sintra. É difícil resistir à tentação de especular se será um inspector do guia Michelin – o que terá pedido como bebida, como é que terá pago, que menu escolheu? Todos os clichés sobre o que se imagina que seja o comportamento de um inspector Michelin são discretamente discutidos na nossa mesa.
Toda esta atenção tem uma razão de ser: o LAB é o irmão gémeo (embora nascido mais tarde) do Sergi Arola Gastro, em Madrid, que tem duas estrelas Michelin. Daí que seja expectável que, mais cedo ou mais tarde, também aqui surja esse reconhecimento. O LAB abriu no Verão, mesmo ao lado do primeiro restaurante do chef na Penha Longa, chamado apenas Arola e onde, num ambiente mais descontraído e a preços mais acessíveis, se pode conhecer a cozinha de Sergi.
Mas, mesmo para quem já esteve no Arola, vale a pena ter a experiência do LAB, que partilha com o Gastro não apenas os pratos – cada nova carta do restaurante madrileno estreia aqui cerca de duas semanas depois – mas também o visual, das toalhas de pele ao cuidado dado ao atendimento e à garrafeira (aqui o escanção é Nuno Miranda). Sendo que, na Penha Longa, se pode ainda gozar a extraordinária vista sobre o parque, que se estende à nossa frente para lá da parede-janela.
Existem três menus: o Descobertas (90 euros), o menu Sergi Arola (105 euros) e o menu De Loucura em Loucura (130 euros). Experimentámos o Sergi Arola, que começa com uma viagem gastronómica por várias regiões de Espanha, com versões de clássicos como as batatas bravas, a Bomba de la Barceloneta, os pastéis de atum de Bilbao ou os calamares. “É muito importante usar as mãos”, aconselha Sergi, que vem à mesa apresentar os petiscos.
Segue-se o primeiro prato que é já um clássico do LAB neste seu primeiro ano de vida e que terá que fazer parte de qualquer lista de imperdíveis: molejas de vitela assadas em especiarias, com guarnição inspirada na tradicional sopa de cebola. As molejas são um produto que nunca sai da carta, mas que vai sendo trabalhado por Sergi de formas diferentes em cada estação.
A seguir vieram medalhões de tamboril servidos com rissino-rossejat e molho de Romesco, usando também outro clássico que Sergi já tinha na anterior carta, o rissino, um falso arroz feito de massa de trigo e que ganha um sabor intenso ao ser cozinhado num jus feito com as espinhas e os fígados do tamboril.
O prato de carne é compostouns excelentes lombinhos de vaca Rubia Gallega (raça da Galiza) envelhecida, com manteiga de pimenta da Jamaica, que foi acompanhado por um excepcional vinho Vega Sicília Único 2007, da Ribera del Duero. A refeição terminou com uma sobremesa de bergamota, morango e hibiscos e com mais uma viagem por Espanha – fazendo espelho com a do início – mas desta vez através de doces.
Na cozinha do LAB, Sergi Arola trabalha com o chef português Milton Anes, que o acompanha frequentemente a Madrid, precisamente para cimentar esta relação muito próxima entre os dois restaurantes. “Estou muito satisfeito com o trabalho do Milton e de toda a equipa”, diz o chef, que não esconde o entusiasmo com este projecto. “Para mim, a Penha Longa representa o paraíso. É, de entre os meus espaços, aquele que, juntamente com o Gastro de Madrid, é verdadeiramente de alta cozinha. Na verdade, aqui é a minha segunda casa.”
Sublinha que o menu é exactamente o mesmo que se pode provar em Madrid e que “há uma relação transversal” entre os dois restaurantes. Há pratos que são criados em Madrid e que em Portugal sofrem transformações que se reflectem depois na versão final. “São dois restaurantes dependentes um do outro”. Quanto à cozinha portuguesa, vê-a como “mais popular, mais de raízes” e é algo que, claro, reflecte-se nas suas criações, mas a par de outras influências das muitas viagens que faz pelo mundo.
Sergi confessa que não se importaria nada de viver em Portugal. “Encanta-me este país”, afirma, na breve conversa que temos a meio do jantar. “Se tivesse que deixar Espanha, sem dúvida que a minha principal opção seria vir para Portugal”, prossegue, enquanto lança constantemente um olho para a zona da cozinha, de onde saem os pratos - e, de quando em quando, levanta-se mesmo para corrigir algum empratamento. “Acho que vocês têm um país genial. Aqui sinto-me em casa.”