Agora que a noite chega mais tarde, a serra de Sintra acompanha pelo menos metade do jantar no Il Mercato, o restaurante italiano do Penha Longa Hotel. Até vale a pena antecipar a refeição só para prolongar a vista por mais tempo. Há um ambiente relativamente informal, com um sofá no meio da sala, porque “conforto” é a palavra de ordem para Paulo Pedro. O novo chef do Il Mercato – “irmão” do Midori e do LAB by Sergi Arola – ficará feliz se os seus clientes saírem com a sensação de terem passado por uma “experiência gastronómica, mas confortáveis”.
O jantar começa com uma brusqueta de pancetta, parmesão e manteiga de trufa, oferta da casa. Bem-vindos a Itália. De seguida, um amuse-bouche com atum braseado e jus de vitela – “é uma inversão do vitello tonatto”, explica Paulo Pedro, referindo-se ao prato característico do Norte de Itália, de vitela com molho de atum. Colocar o atum na posição nobre é “honrar o peixe português”.
Este será o mote para o resto do jantar: o chef gosta de “brincar” com as duas gastronomias. “Adoro os sabores da minha terra. O hotel está virado sobretudo para os clientes estrangeiros, e assim conseguimos dar-lhes um bocado do que é nosso. Quando vou à mesa e eles pedem uma sugestão, sugiro um risotto de caldeirada: as pessoas ficam sempre com um bocadinho das nossas tradições.”
Esse arroz bem al dente também virá para a mesa, mas antes disso há vieiras marinadas com polenta branca, gel de yuzu (um limão japonês), chutney de ruibarbo e telha de torresmos (mais uma vez, “a ponte para Portugal”); um ravioli de camarão com cogumelos shitake (“a terra e o mar juntos”, explica); e um robalo salteado com orzo (uma cevada com grão redondo, “típica de Itália, que ligamos como se fosse um risotto”), acompanhado ainda com couve-flor em várias preparações (uma delas, torrada e em puré).
“É isto que eu quero trabalhar aqui: sendo um restaurante com linha italiana, ampliar os sabores de Portugal. É esse o meu grande desafio. E é um desafio que me faz crescer”, adianta Paulo Pedro. “Porque não haveremos de fazer um ravioli com uma ligação ou outra, em que o conjunto vai dar-nos umas amêijoas à Bulhão Pato? Quero trabalhar estas pequenas coisas que nos identificam e tentar pô-las no prato de um restaurante italiano. Orgulho-me muito das nossas raízes e temos que aproveitar sermos actualmente conhecidos.” Para além disso, Portugal tem bons produtos e é deles que as pessoas vêm à procura, adianta.
Mas há uma terceira identidade em jogo, que se manifesta nos seus jus “bem ricos”, por exemplo. O chef, de 34 anos, deve a sua formação à escola francesa: primeiro na Escola de Hotelaria de Lisboa, depois, durante seis anos, na Fortaleza do Guincho. “Ainda apanhei lá o chef Marc Le Oudec – com aquela escola um bocado militar – e depois fiz o percurso todo com o Vincent [Farges, chef do Fortaleza durante dez anos], um bocado ‘mais para a frente’, com grande visão”. Ainda passou pelo Myriad Sana Hotel, em Lisboa, antes de vir para a Penha Longa.
Houve outra vida antes desta. Paulo Pedro foi campeão nacional de natação (no estilo costas). “Passei a minha vida dedicado ao desporto e à paixão pelas piscinas e pelo mar, pelo body board, que é o meu escape ainda hoje.” Até uma lesão nos ombros o obrigar a retirar-se. “A cozinha foi um escape. Também me apaixonei, porque é uma profissão de paixão. Paixão e rigor. É [uma profissão] rija, há muita pressão, mas é reconfortante.” Lá está.