Fugas - restaurantes e bares

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Do Douro para Londres: o restaurante português que deixou o Guardian a querer lamber o prato

Por Mara Gonçalves

O Bar Douro nasceu no final de Novembro no bairro londrino de Bankside, com petiscos tradicionais e uma longa lista de vinhos portugueses. O Guardian chamou-lhe uma “pequena estrela”.

Max Graham e Tiago Santos chegaram a Londres em Agosto do ano passado com uma missão: “dar a conhecer os pratos mais tradicionais e clássicos da culinária portuguesa, mas com um toque contemporâneo”. Depois da experiência em supper clubs londrinos e da abertura de uma esplanada temporária nas caves da Churchill's, em Vila Nova de Gaia (Max é filho do fundador da mais jovem companhia britânica de vinho do Porto), a dupla queria “evoluir para um restaurante”. Max na gestão, Tiago na cozinha. Com casa fixa e horário definido. Em Londres.

Sentiam que era o “momento certo” para dar tecto às ideias que fervilhavam há três anos: o “aumento do turismo” e a “nova onda de restaurantes em Lisboa e no Porto” atraíam cada vez mais a comunidade internacional à mesa lusa. Estava na hora de também “começar a exibir a gastronomia e os vinhos portugueses em Londres”, afirmam. No final de Novembro de 2016, nascia o Bar Douro, um pequeno restaurante com cozinha aberta ao balcão e uma mesa alta a ondular junto à vidraça, tampos de mármore e painéis de azulejos azuis e brancos. À mesa, uma viagem pelos sabores tradicionais portugueses, em petiscos e copos de vinho.

Ainda não tinham passado seis meses desde a abertura quando uma das mais prestigiadas críticas de gastronomia do Reino Unido visitou o restaurante, localizado no Flat Iron Square, o novo projecto gastronómico e cultural que pretende revitalizar o bairro londrino de Bankside, aproveitando as estruturas e edifícios que se aninham debaixo da linha de comboio. Marina O'Louglin, crítica no Guardian, fez precisamente o trajecto que tinham antecipado à clientela. Saiu do avião que chegava de Lisboa, “empolgada” com o que provara em Portugal, e deu por ela à mesa do novo restaurante português da capital britânica.

As expectativas eram baixas. A gastronomia lusa é “uma das mais subvalorizadas” e o cenário em Londres ainda mais desanimador: no TripAdvisor, o top 20 de restaurantes portugueses na cidade incluía 11 espaços da cadeia Nando's, enumerava no artigo de opinião. Mas enganou-se. Debaixo do arco 35 do caminho-de-ferro de Southeastern encontrou uma “pequena estrela”, com “excelentes produtos cozinhados lindamente”. Provou o pão com chouriço, os croquetes de alheira, uma tábua de queijos e enchidos. Quando chegou à mesa a dose de porco à alentejana, O'Louglin quase perdia a etiqueta britânica: “Tive de me conter para não lamber o prato”.

Foi através da crítica de O'Louglin, publicada em meados de Abril, que soubemos da existência do Bar Douro. A primeira entrevista telefónica decorria pouco depois, interrompida pelo bulício da cozinha, prestes a abrir, a crescer em ruído de fundo. O aumento do volume de trabalho e o atentado no início de Junho na London Bridge, a 800 metros de distância, adiaram sucessivamente o final da conversa. Ao segundo contacto, acabámos por voltar àquele texto, marco inolvidável na curta história do restaurante, que os deixou “over the moon”, na escala espacial da felicidade. “Aumentou definitivamente o tráfego no nosso restaurante, mas também o interesse pela comida e pelos vinhos portugueses em Londres”, admite Max Graham.

Passar “o país a ferro” para construir uma carta

O jovem britânico, proprietário do Bar Douro, passou a infância entre as ruas da cidade do Porto e as caves da Churchill's, em Vila Nova de Gaia. O pai fundou a companhia em 1981, mas a produção de vinho fortificado no Douro era já uma tradição familiar com quase dois séculos. A língua de Camões não lhe sai perfeita, enrola-se nos quase dez anos que viveu em Londres, mas confessa que “sempre foi apaixonado por comida e vinhos portugueses”. Impulsionado pelo negócio da família, criou a Churchill’s Port House em 2013, um bar pop-up no bairro londrino do Soho. Durou apenas oito meses mas foi o primeiro passo para aqui chegarmos. Nascia ali a ideia de um dia abrir um restaurante português em Londres.

Entretanto, Max Graham conheceu Tiago Santos, chef natural de Aveiro, cujo percurso profissional passou, entre outros restaurantes, pela Casa de Chá da Boa Nova, pelo The Yeatman e pelo Largo do Paço (no hotel Casa da Calçada), os três distinguidos actualmente com estrelas Michelin. Cedo começaram a trabalhar juntos, com projectos temporários em supper clubs londrinos (chamemos-lhes restaurantes escondidos, ou clandestinos, para facilitar). Pop Brixton em Janeiro de 2016. Carousel no mês seguinte (por onde também passaram, em breves residências, os portugueses Leonardo Pereira e Leandro Carreira).

As ideias ganhavam corpo com a experiência e crescia a vontade de se lançarem com um restaurante próprio em Londres. Enquanto decorriam as obras em Flat Iron Square, lançaram uma esplanada pop-up nas caves da Churchill’s, em Vila Nova de Gaia. Foi uma espécie de antestreia. Foi na margem do rio Douro que o nome do restaurante subiu à estampa pela primeira vez e foi ali que experimentaram alguns dos petiscos que hoje figuram no menu londrino, como o polvo com batata-doce. E sempre que podiam, faziam-se à estrada.

“Passámos o país um bocado a ferro antes de irmos”, recorda Tiago. Procuravam produtos, experimentavam pratos regionais. O objectivo era pegar nas receitas, nas técnicas e nos ingredientes típicos portugueses e “adaptá-los a uma Londres cosmopolita”, dando uma roupagem contemporânea a pratos tradicionais como porco à alentejana, gambas à Guilho ou pataniscas de bacalhau. A carta é um puzzle de pratos regionais, um retrato de alguns dos mais tradicionais petiscos portugueses. Há rolos de chanfana, raia com manteiga de algas de Aveiro e especialidades como bacalhau à Brás e leitão à moda da Bairrada (que também vendem inteiro, por reserva). Para sobremesa, o inevitável pastel de nata, pudim Abade de Priscos, baba de camelo e um bolo de azeite e laranja com marmelo e requeijão.

São muitos os portugueses que visitam o restaurante, mas a maioria dos clientes, define Max, “são profissionais e amantes de comida de todas as nacionalidades que vivem em Londres”. “Também temos uma grande lista de vinhos portugueses, o que atrai muitos entusiastas de vinho.” A adega soma mais de 80 referências, incluindo algumas “preciosidades” como Barca Velha 2008 ou Adega Viuva Gomes Colares 1969 e uma diversa lista de vinhos do Douro – “provavelmente a mais extensa de Londres”.

Este mês, o projecto expandiu-se em esplanada, com zona coberta e mesas feitas a partir de pipas de vinho. Para aproveitar o sol de Verão e continuar, com aquecedores, Inverno adentro. E existem “planos para projectos futuros”, admite Max Graham, sem levantar mais o véu.

Nos últimos anos, a capital britânica começou a descobrir, a pouco e pouco, a gastronomia portuguesa. Nuno Mendes tem sido um dos principais impulsionadores, com a Taberna do Mercado e um legado de formação de jovens chefs nos projectos por onde passou. Leandro Carreira, braço direito de Nuno Mendes n’O Viajante, teve um pop-up de um ano no Climpson’s Arch em 2016 e prepara-se para abrir um restaurante em Londres no Outono. Outros projectos portugueses estão a nascer na parte Este da cidade. No Bar Douro, o balanço do primeiro semestre é “muito encorajador”. “As pessoas em Londres estão sempre entusiasmadas com coisas novas. Era apenas uma questão de tempo até Portugal entrar no radar.”

Bar Douro
Arch 35b Flat Iron Square, Union Street – Londres
Tel.: +44 20 73 78 05 24
Email: info@bardouro.co.uk
www.bardouro.co.uk
Horários: de segunda a sábado das 12h às 24h; domingo das 12h às 17h

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