É uma alavanca de madeira, uma "palanca" — como os rolos de madeira utilizados para deslocar no cais os barcos de pesca. É a falta de juízo, uma fixação ou uma atracção muito forte por algo. É, para os peruanos e para um chef chileno, uma das variedades mais comuns de malagueta. Chama-se Panca e também é um restaurante Cevicheria & Pisco Bar, o novo inquilino da Rua Sá de Noronha, na Baixa do Porto.
Não há um início para esta história. Ou talvez seja o Chile, Santiago, onde Camilo Jaña nasceu, ou Valparaíso, onde o chef sempre sonhou viver — pelo menos até conhecer o Porto, "as suas arribas, a proximidade ao mar, a zona velha...", e perceber que o paraíso também podia estar ali. Todos sabemos o que ele (conhecemo-lo do Cafeína e da Casa Vasco) e o chef brasileiro Ruy Leão (Shiko Tasca Japonesa) fizeram no Verão passado: apresentaram o ceviche à cidade através do quiosque Panca, no Parque da Cidade. Mas, com 12 anos de Portugal e com "o tubo de ensaio" devidamente agitado, Jaña quer que "o ADN circule". Depois do pequeno Panca, o grande Panca.
Trocadilhos à parte, Panca significa cozinha sul-americana com churrasco feito ao carvão e ceviche fresco que saboreamos com uma colher que é um garfo que é uma colher ("Peixeirada" com peixe branco, batata doce e chulpi; "Mariscal Puro, Mar Adentro" com... tudo a que temos direito) e empanadas (três unidades, por favor: chili com carne, queijo com camarão e bacalhau de cebolada); significa contrastes e Pisco Sour (aguardente de uva peruana, clara de ovo e lima); significa pinceladas valentes de cozinha nikkei (a combinação das cozinhas japonesa e peruana está no tártaro e no ceviche de atum) e bolo macio. Reflecte "aquela cozinha de mercado e de rua que se vê em todo o lado no Chile e na América Latina, o que como desde criança, desde que nasci", descreve o chef, à mesa com a Fugas. "O Porto está a mudar, está a crescer e está a abrir. Já não se fazem restaurantes como há 10 anos. Então tinham que ter uma carta internacional, com pratos variados para agradar aos clientes. Hoje as pessoas sabem comer, gostam de experimentar e tornam-se fãs da comida de outros países."
Hoje, Jaña, dinâmico na cozinha e atencioso na sala, sente-se "muito mais confortável" com a "evolução dos sabores", o aperfeiçoamento dos molhos e dos caldos, com o "aprofundar da técnica" e a introdução de matérias primas (como o "leche de tigre, preparado na casa com paixão e respeito"). "Fazemos um profundo trabalho de investigação. Tenho uma linha de pensamento e um grupo de cozinheiros que devoram livros, que vivem intensamente o Panca. Aproximamos o sabor da origem. Apanhamos algas, trazemos o mar", diz, orgulhoso — e consciente das diferenças entre duas cidades afastadas mais de dez mil quilómetros. "As limas não são as mesmas, este peixe é do Atlântico... mas o que eu defini é o ADN do ceviche, o registo que te marca numa viagem pela América Latina."
Mergulhamos no Panca. De cabeça. No peixe branco e firme, nos tons cítricos e nos cheiros verdes, nos bivalves, numa carta pequena com sabores do Brasil, do Chile, do Peru, do Japão. Abre-se a porta e lá dentro é uma semi-selva cosmopolita — "plantada" pela arquitectura de Ana Godinho de Almeida e pelo design de Alejandra Jaña, padrões a que os restaurantes de Vasco Mourão nos têm habituado. Estamos no terraço interior. Fechamos os olhos, boca cheia — Panca cheio, pança cheia. Estamos no mercado de Valparaíso, encostas íngremes junto ao Pacífico.
Panca - Cevicheria & Pisco Bar
Rua Sá de Noronha, 61 Porto
Tel.: 222 033 144
www.facebook.com/Pancacevicheria/
@panca_cevicheria
Horário: Todos os dias das 12h à 1h
Preços: menu de almoço a 12,50€; preço médio 30€.