Fugas - Viagens

Luís Maio

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Sintra para além das vistas

Quando Dom Fernando II chegou a Sintra, a serra era quase desprovida de vegetação de porte arbóreo, entretanto desbastada pela expansão das pastagens. Por outro lado, o que havia em Monserrate antes de Cook era uma quinta de pomares e outras culturas. No lugar de pastagens e pomares, o que cresceu em Sintra nos últimos 150 anos foi a floresta, abatida por incêndios cíclicos, desequilibrada pela progressão das espécies invasoras. Mas nunca como agora, desabafa Valdemar Alves, o futuro pareceu tão negro.

Grandes manchas de floresta conhecem poucos ou nenhuns trabalhos de manutenção, sobretudo aquelas que se situam em terrenos particulares (cerca de 26 por cento de 5000 hectares de área florestal), entretanto votados ao abandono. Daí uma mancha verde cada vez mais densa e exuberante, mas também impenetrável e intratável, onde os caminhos desapareceram e as árvores caídas se multiplicam por todo o lado. Um verdadeiro barril de pólvora, que só por sorte ou por obra da Providência não voltou a ser fustigada por um incêndio das proporções de 1966.

Outro problema grave que se coloca em Sintra é o da expansão urbana e da construção de segundas habitações de férias. A Avenida Atlântico, entre Colares e a Praia das Maças, é famosa pelas suas belíssimas vivendas dos anos 30-40, que declinam o figurino de casa portuguesa doutrinado por Raul Lino. Mas mesmo ao lado, atrás e um pouco em toda a parte cresceram casas de fraca ou nenhuma graça arquitectónica. Estes mamarrachos são poluição visual, que descaracterizaram a paisagem de Sintra, mas, pior que isso, concorrem para uma excessiva humanização, fragmentação e poluição dos habitats, ameaçando ou já tendo ditado a extinção de várias espécies de mamíferos, répteis e aves.

Claro que não é o género de conversa que se espera ouvir num eléctrico de lazer. Mas não consta que a Biologia faça parte das operações de branding turístico e se as coisas não mudarem, e depressa, Sintra corre o risco de não ser mais do que um eléctrico chamado saudade.

Informações

O eléctrico de Sintra circula de sexta a domingo, até 26 de Setembro. O primeiro arranca da vila (Estefânia) pelas 9h20 e o último regressa da praia pelas 19h00. 2€ custa o bilhete normal, 1€ o meio bilhete (+65 anos) e é grátis para crianças até aos seis anos de idade (mais informações em www.cm-sintra.pt).

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