Fugas - Viagens

Daniel Rocha

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A casa das histórias de Pedro Canavarro

A missão que Pedro atribuiu a si mesmo foi a de reunificar a herança, logo a começar pela casa. Depois, à entrada do novo milénio, quis abrir um novo ciclo, criando a Fundação que hoje gere a propriedade. Levou dez anos, ou um pouquinho mais, a preparar a casa para visitas e a introduzir adaptações numa perspectiva museológica. "A casa pertence à Fundação mesmo antes de abrir ao público, mas sou eu quem dela tem o usufruto. Achei que era importante abrir ao público, primeiro porque é necessário rentabilizar. Por outro lado, tenho consciência - sobretudo neste período de interregno em que vivemos desde o 11 de Setembro - que é fundamental dar a conhecer berços às pessoas. Desde que conhecemos os nossos berços, seja a nível familiar, de cidadania ou nacional, podemos voar porque sabemos de onde vimos."

Entramos no sustento doutrinário da casa-museu de Santarém: "Tem a vertente histórica ligada aos espaços henriquinos, o aspecto político do Passos Manuel e ainda o aspecto literário conotado com o Almeida Garrett, que imortalizou esta casa [na obra] Viagens da Minha Terra. Eu, que sou sobretudo um homem do século XX, também consegui dar-lhe um humanismo peregrino, quando fui, com 28 anos de idade, criar o leitorado de português no Japão. Daí, aliás, ter começado cedo a trazer coisas de lá." Entretanto a casa tornou-se mais galeria de arte em virtude de importantes doações de obras de Mimi Fogt e de Pedro de Sousa.

Cada sala é um mundo

Santarém fica obviamente a ganhar com a abertura da Casa-Museu Passos Canavarro, porque representa um novo pólo turístico, mas também porque este é diferente dos outros já consagrados na cidade ribatejana. É o guia-proprietário quem declara: "Santarém tem um património religioso riquíssimo, mas um património profano menor. Este museu pode ser um complemento, ao nível da colecção de objectos que aqui tenho e da própria dinâmica da visita. Não haverá maravilhas de embasbacar, mas é uma combinação interessante de casa, jardim, paisagem e galeria de arte."

O que se visita, afinal, na Casa-Museu Passos Canavarro? A resposta é simples e surpreendente: tudo o que tem lá dentro. Ou seja, aqui não há demarcação entre espaços públicos e privados, como é costume quando estas instituições ainda são habitadas. "Toda a casa é visitável, é uma questão de atitude minha. Eu nasci no quarto onde ficou Almeida Garrett, que é precisamente aquele onde vivo hoje. As pessoas perguntam-me: 'E se um dia apanhar uma gripe ou estiver mal disposto?' Eu digo: 'Não sei. Escondo-me? Ponho uma máscara? Ou pagam o dobro para ver o doente?' Logo veremos..."

Pedimos a Pedro Canavarro para seleccionar as jóias da colecção e os pontos altos da visita guiada. Ele começa pela Sala dos Mapas, divisão que deve o nome ao conjunto de cartas penduradas nas paredes, que datam do século XVI. Não se conhece o(s) autor(es), mas sabe-se que foram produzidas para ilustrar uma cópia do manuscrito de D. João de Castro, que documenta as viagens dos portugueses de Goa ao Suez, no ano de 1541. Aqui estão 15 dos 16 mapas originais, o que certifica a raridade do conjunto, para mais em notável estado de conservação.

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