Fugas - Viagens

  • Grutas da Ponta da Piedade
    Grutas da Ponta da Piedade
  • Há mais de 30
anos que José
Jorge conduz
turistas pelos
encantos da
Costa d’Oiro,
    Há mais de 30 anos que José Jorge conduz turistas pelos encantos da Costa d’Oiro,
  • Grutas da Ponta da Piedade
    Grutas da Ponta da Piedade
  • Rocha da direita - Grávida, rainha Vitória ou De Gaulle
    Rocha da direita - Grávida, rainha Vitória ou De Gaulle
  • Gorila de perfil na rocha da direita com cabeça virada para a esquerda
    Gorila de perfil na rocha da direita com cabeça virada para a esquerda

Pelas grutas de Lagos, no mar transparente das histórias

Por Mara Gonçalves (texto e fotos)

Um passeio de barco serpenteando pelas impressionantes enseadas da Ponta da Piedade, entre a verdade natural e a imaginação prodigiosa dos pescadores e guias. E dos visitantes.

“Esta rocha aqui atrás é a boneca, parece que está grávida”, aponta José Jorge Costa, 63 anos. Um pequeno rosto de perfil perfeitamente delineado — o olho, o nariz, a boca, o queixo, o cabelo — sobre um corpanzil de barriga redonda até ao mar.  “Para os ingleses chamo-lhe rainha Victoria, que de tão gordinha que era até ficou na história. Para os alemães digo que é o Helmut Kohl, para os russos o Gorbachev. Também eram gordos, é só mudar o nome”, ri-se.

Há mais de 30 anos que José Jorge conduz turistas pelos encantos da Costa d’Oiro, um intrincado rendilhado de falésias douradas, onde a natureza esculpiu grutas, arcos, pequenas praias, enseadas e rochedos solitários de mil formatos. Fazer um passeio pelas grutas de Lagos é antes de mais uma lição de imaginação. Em cada recorte de costa há uma figura para ser descoberta e se à primeira a maioria nos passaria certamente despercebida, quando nos dão as coordenadas certas torna-se quase impossível não as ver, algumas mera lembrança da realidade, outras tão perfeitas que parecem moldadas pelo homem.

O bico de um falcão ali em cima, a cara de um mocho na rocha seguinte, um dromedário a dividir ao meio a praia do Camilo, as gémeas “que dão beijinhos à esquimó”, o perfil do general De Gaulle, que para os menos conhecedores da história francesa também pode ser o Snoopy. “Estas, por exemplo, são o Titanic e o icebergue. Agora chamo-lhe o Costa Concordia, que é mais moderno”, conta, apontando para os rochedos seguintes, uns metros afastados do mar. “No princípio era o ferro de engomar a carvão, mas agora há ali um ferro especial. Tantos nomes que já teve... até foi o Yellow.” E entoa em jeito de explicação: “Yellow submarine, yellow submarine.”

Vamos sensivelmente a meio da viagem, a partida feita junto à Avenida dos Descobrimentos. É o local de embarque mais distante da Ponta da Piedade (centro nevrálgico do passeio, onde fica a maioria das grutas propriamente ditas), mas em compensação temos a panorâmica mais abrangente de toda a costa, um desfilar de praias sem fim e da história que as acompanha. Primeiro o Forte Ponta da Bandeira e o areal do Cais da Solaria, onde em tempos ficava a lota do peixe. A praia Formosa, mais conhecida por praia da Batata, “talvez porque antigamente as pessoas do campo só vinham tomar banho de mar uma vez por ano [a tradição ainda hoje é comemorada com festas durante a noite de 29 de Agosto] e traziam comida, muitas vezes batatas doces”, avança José Jorge.

Logo a seguir, uma sucessão de pequenos areais: dos Homens, dos Estudantes, da Caldeira, do Pinhão (aqui uma monumental escadaria de pedra, “feita pelos militares no tempo de Salazar”, hoje interdita por falta de segurança), depois a coqueluche, diversas vezes nomeada a mais bela do mundo, agora centro de polémica. “Para mim isto é quase uma destruição da praia da Dona Ana. Dizem que vai ficar melhor e que as areias não saem. Vamos ver um dia”, diz, pouco convicto. Quando lá passámos, retroescavadoras compunham o esporão de 40 metros que irá ligar a arriba a um leixão próximo para segurar os 150 mil metros cúbicos de areia que ali serão colocados para duplicar o tamanho da praia.

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