Fugas - Viagens

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A ilha que é bipolar quer ser ainda mais verde

Gotland tem, na verdade, a maior concentração de igrejas medievais em todo o norte da Europa, quase uma centena, e algumas delas ainda mantêm frescos desse tempo em que se construía um templo religioso em cada aldeia. Visby, por seu lado, tem uma dúzia e meia delas ou o que resta como testemunho de uma época de ouro, como as ruínas de St. Hans' e de St. Per's, precisamente no lugar onde foi erguida a primeira igreja em toda a ilha.

O dia esgota-se, tudo tem o seu tempo, como Visby, que no século XIV começou a perder a sua posição dominante na Liga Hanseática antes de conhecer desastres como a peste negra ou de ser atacada, ocupada e parcialmente destruída, como sucedeu mais do que uma vez até perder, definitivamente, toda a sua grandeza, em 1525, perante a força das tropas provenientes de Lübeck.

A manhã do dia seguinte mostra-me uma face de Visby que ainda não conhecia, as ruas estão cheias como um ovo, é o dia da graduação, os pais empunham cartazes com fotos dos filhos quando eram crianças, a música compõe uma moldura onde cabem expressões sorridentes, um sentimento de orgulho e outro de nostalgia perante a recordação de um tempo que passou a voar.

Por ali fico umas horas, até que um ou outro carro alegórico desfile pelas ruas de Visby, mas logo me decido a abraçar uma face mais rural da ilha que vou apreciando até chegar a Tofta, uma praia que por agora nada mais oferece do que solidão mas que, mal o Verão se anuncia, logo se transforma numa espécie de Ibiza, com os seus bares e os seus clubes onde se dança até aos primeiros alvores de um novo dia.

A pé, percorri duas dezenas de quilómetros, sempre para Sul, pelo meio de um silêncio apaziaguador, uma vez ou outra interrompido por conversas em voz baixa, sons imperceptíveis que me chegavam de uma casa que avistava ao fundo de um campo pintado de verde ou quando me cruzava com alguém que passeava um cão ou, ainda, quando testemunhava a alegria de crianças que nadavam nas águas do mar. Saboreava cada momento em toda a sua plenitude, atento ao mais pequeno detalhe, como se pensasse já, em cada lugar onde era um espectador, num tempo em que teria vontade de o reconstituir.A paisagem da ilha, envolta numa permanente aura silenciosa, transmitia-me serenidade.

- Há pelo menos seis anos que não me lembro de ver alguém à boleia na ilha.

Não sabia o que responder. Para mim, alugar um carro, sozinho, significa não proximidade (dos lugares) mas distância (das pessoas). E eu aprecio viajar pelos lugares e pelas pessoas - mais ainda por estas.

Aquele homem carregava, na mala do carro de fabrico sueco, carne de um produtor local para um restaurante. À minha volta, tudo se pintava de verde. Também havia algumas flores e quando as avistava lembrava-me sempre de Terese Jonsby.

- Como um jardim, cheio de cor, o milho e, especialmente, as papoilas, cobrindo os campos como uma passadeira vermelha, era o quadro que Terese Jonsby traçava da sua infância feliz.

Aquela que é a maior ilha da Suécia, com uma área ligeiramente superior a 3000 m2 e com 60 mil habitantes, tem um desafio que encara como sagrado – viver, até 2025, das energias fósseis, do sol, do vento, da água e dos bio-combustíveis. Já há bons exemplos mas muitos outros também desejam uma vida cem por cento verde. A questão parece simples, pelo menos aos olhos da política e dos residentes locais. Mas Gotland recebe, todos os anos, entre 700 e 800 mil turistas, a maior parte deles proveniente da Suécia.

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