Fugas - Vinhos

Uma região na encruzilhada

Por João Portugal Ramos

A Fugas convidou João Portugal Ramos a projectar ideias sobre o futuro do Alentejo. O enólogo e gestor aceitou o desafio e neste texto revela o contributo da região para a nova vaga do vinho nacional e deixa no ar as ameaças que “a dificuldade de equilibrar a oferta à procura” lhe colocam

Falar do Alentejo é para mim muito gratificante, pois mesmo muito antes de chegar à região e dar os meus primeiros passos como enólogo e gerente da Adega Cooperativa da Vidigueira em 1981, era esta a minha região de eleição.

Havia uma série de atributos da região que, de facto, eram especiais, e ainda por cima sendo para mim a caça uma paixão, foi também aqui que dei os primeiros passos nessa actividade, desde muito novo acompanhando o meu pai.

Foi também aqui que, a determinada altura, resolvi iniciar a minha actividade de produtor-engarrafador, é no Alentejo que vivo há 25 anos e foi aqui que os meus filhos cresceram.

Por outro lado, falar nesta altura sobre a região do ponto de vista vitivinícola não é uma tarefa fácil, pois tive a felicidade de estar aqui quando o Alentejo passou a ser a região de referência do país no que a vinhos diz respeito.

E neste contexto, tão exigente e difícil em quase todas as actividades, o Alentejo, que continua a ser a região de referência e de preferência da esmagadora maioria dos consumidores portugueses, tem rapidamente que resolver uma série de problemas se não quiser perder essa liderança.

Quando em 1981 fui convidado para enólogo e gerente da Adega Cooperativa da Vidigueira, Cuba e Alvito, a região detinha apenas 2% da quota de mercado mas com uma qualidade média dos vinhos muito boa. Em cerca de duas décadas passou a ter mais de 40% do consumo de vinhos de qualidade em Portugal!

O Alentejo nessa época tinha uma produção de cerca de 25hl/hectare (mais ou menos ao nível dos grandes vinhos da Borgonha), as vinhas eram velhas e os solos onde as vinhas estavam implantadas eram relativamente pobres, perfeitamente adequados à cultura da vinha, pois os mais férteis eram normalmente utilizados para outro tipo de culturas.

Havia de facto uma enorme qualidade média de uvas. Para além das excepções da Tapada de Chaves, Mouchão, Quinta do Carmo, Montes Claros e José de Sousa Rosado Fernandes, que produziam e engarrafavam pequenas quantidades de vinhos, a esmagadora maioria era destinada às seis Adegas Cooperativas existentes na região que as vinificavam, engarrafavam e promoviam os vinhos e a região.

O primeiro produtor-engarrafador, para além dos atrás mencionados, foi a Sociedade dos Azeites de Moura, com a marca Paço dos Infantes, pertencente à família Almodôvar, com a colheita de 1982. Foi portanto uma época em que a região produzia pouco e bem, e para além disso havia uma grande harmonia ao nível dos preços, pois também me lembro muito bem da tradição de se realizar um almoço pós-vindima com as direcções das Adegas Cooperativas a trocarem impressões sobre a vindima que terminara e quais as políticas a adoptar.

Na segunda metade da década de 80, quando surgem os primeiros Q.C.A. (Quadros Comunitários de Apoio) os investimentos apontaram para vinhas e adegas, e todos ou quase todos se candidataram, investindo em vinhas e tecnologias de produção ao nível das adegas. Aqui, e não foi só no Alentejo, ficou de fora um apoio tão ou mais importante: a área comercial para dar suporte ao aumento que já se perspectivava de mais vinhas e adegas. Hoje, como bem sabemos, todos os apoios e projectos em curso apontam em especial para o investimento na promoção dos vinhos.

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