Duas calamidades consecutivas que quebraram o espírito dos produtores dos vinhos de Carcavelos e que levaram a que poucos reformassem as vinhas, replantassem o que tinha sido destruído em pouco mais de três décadas de doenças sucessivas e incontroláveis. Um abandono da actividade agrícola que foi intensificado a meio do século XX, quando a região começou a ser invadida por prédios e urbanizações infinitas, acabando por se transformar num dos principais subúrbios de Lisboa, transfigurando-se de região vinhateira em região urbana. Ainda hoje algumas das urbanizações mais famosas dos concelhos de Oeiras e Cascais carregam o nome de antigas quintas produtoras de vinho de Carcavelos.
A rápida urbanização dos dois concelhos desmoronou quase por completo a produção do Carcavelos. Por mais de um instante, tudo pareceu perdido e por mais de uma vez a região esteve a ponto de se autodestruir, de se apagar voluntariamente do mapa. Só mesmo o esforço de uns poucos e a presença da Estação Agronómica de Oeiras permitiram a salvação daquela que é uma das mais pequenas denominações de origem do mundo. A produção é irrisória e hoje quase se resume a um produtor, a Estação Agronómica de Oeiras, organismo estatal, com o apoio material e moral da Câmara Municipal de Oeiras, que aceitou a responsabilidade de se transformar em guardião do Carcavelos.
Apesar de os vinhos poderem ser elaborados legalmente com uvas tintas, a tradição da denominação determina que o Carcavelos seja elaborado com um conjunto de castas brancas, algumas delas particulares da região. A mais importante, e também a mais característica da região, é o Galego Dourado, casta branca em desuso e quase extinta no resto do país. A acompanhar o Galego Dourado surgem as castas Arinto e Ratinho, a última das quais é mais uma das muitas castas obscuras de Portugal, um cruzamento das castas Malvasia Fina e Síria. Nas tintas estão aprovados o Castelão e Amostrinha, nome local para a variedade Preto Martinho.
Não será fácil encontrar Carcavelos à venda porque as produções são mínimas, a distribuição é quase inexistente e a maioria dos vinhos deixou de ser produzida há muitos anos. Mas vale a pena procurar em garrafeiras e lojas ou mercearias com stocks de vinhos velhos. Procure por garrafas da Quinta do Barão, um dos nomes mais seguros de Carcavelos. Procure igualmente por vinhos mais jovens mas especialmente interessantes, como o Quinta dos Pesos 1991, um grande vinho generoso que o tempo ajudou a tornar ainda mais complexo e subtil. Ou procure por aquele que será o Carcavelos mais fácil de encontrar, o Conde de Oeiras, o vinho que continua a ser produzido na Estação Agronómica de Oeiras e que beneficiou de um grande investimento na adega e nas vinhas da Estação. A recompensa é garantida.