Regressando à falta de novos actores. O sucesso da Quinta da Pellada, por exemplo, não é suficientemente inspirador para que outras pessoas comecem a olhar para o Dão como um "terroir" especial onde vale a pena investir?
O Álvaro Castro é o melhor exemplo que existe e o Dão deve-lhe muito. Mas, como dizia, se a trajectória se tivesse mantido como nós pensávamos, talvez isso hoje fosse uma realidade.
A crise também afectou as outras regiões e nem por isso caíram na apatia que se sente no Dão. Há poucos jovens enólogos a dar nas vistas…
Ou a região não tem gente ou a que tem não fica cá ou os que estão cá têm medo, não consigo saber. Muitos produtores vivem de uma primeira actividade que não é o vinho. São médicos, engenheiros, que mantêm a exploração agrícola com uma marca agregada, sob a responsabilidade de duas ou três pessoas. Falta alguma ambição, falta ir a feiras, mostrar o vinho, e não ficar à espera que os compradores apareçam. No entanto, há vários projectos muitos interessantes ainda pouco conhecidos que vão começar a ser falados. A Júlia Kemper é um deles, mas podia falar do Chão da Quinta e do Cmwines [vinhos Allgo], de um empresário português que vive na Alemanha. A própria Lusovini [produtora e distribuidora sediada em Nelas mas com filiais em Angola, Moçambique e Brasil], de que sou fundador e acionista, é uma alma nova na região. Com a Lusovini, já saem do Dão cerca de um milhão de garrafas de vinho. Há alguma renovação, mas ela ainda não é muito visível, porque estes novos produtores instalaram-se em contraciclo. O que fizeram desde o primeiro dia? Exportar, porque o Dão não está divorciado do mundo.
Mas está do país?
Eu não diria divorciado, mas as outras regiões sobrepuseram-se ao Dão e abafaram-no. Andaram mais depressa. O Dão talvez não tenha feito o seu trabalho. A tal rota, os ícones…
A vinda de Dirk Niepoort para o Dão [a Niepoort comprou vinhas no concelho de Gouveia e vai brevemente lançar um vinho novo] pode dar uma ajuda…
É importantíssimo. É a prova de que a região está a tornar-se atractiva novamente. Não é só o Dirk Niepoort. Também já estão cá o João Portugal Ramos [que arrendou as vinhas da Quinta da Bica e passou a comercializar os vinhos daquela casa histórica], o Jorge Moreira [vinhos Poeira], o Jorge Serôdio Borges [Pintas] e o Francisco Olázabal [Quinta do Vale Meão], os três com o projecto MOB. É o tal sangue novo. São pessoas com nome que podem ajudar a virar os holofotes para a região. A Bairrada, desde que o Dirk foi para lá, passou a ter os Baga Friends [formação semelhante à dos Douro Boys].
Porque não existe um grupo semelhante no Dão?
Não sei explicar. O Dão tem todas as condições para chamar a si o título de região com a melhor Touriga Nacional do mundo. Não sei se a Touriga Nacional é originária do Douro ou do Dão, embora os estudos de variabilidade genética da videira indiquem que é do Dão. Mas é no Dão que ela se comporta melhor, onde se expressa de forma soberba. É o seu "terroir". Apesar disso, nunca se fez nada em torno da Touriga Nacional. Deveria haver um Touriga Nacional Friends ou qualquer coisa do género. Era importante que um conjunto de produtores, mesmo que de forma informal, se agregasse em torno da Touriga Nacional. Devo dizer que ainda tente fazer uma coisa dessas há cerca de 10 anos, mas encontrei algumas reticências por parte de vários produtores. Podia dizer o mesmo da casta Encruzado, que está para os brancos como a Touriga Nacional está para os tintos. É uma casta soberba e igualmente bastante plástica. Já a experimentei em outras regiões e o seu comportamento é muito bom. Se temos a melhor Touriga Nacional e o melhor Encruzado, só precisamos de os promover, de ir a mais feiras e concursos, de aparecer mais em revistas e jornais.