Se nos países não produtores de vinho costuma reinar uma certa bonomia e abertura de espírito para aceitar a presença de vinhos de todas as nacionalidades e estilos, nos países produtores perdura um genuíno chauvinismo vinícola que condiciona e condena a presença de vinhos provenientes de outras paragens.
O chauvinismo vínico, interno e externo, é uma condição a que poucos países ou regiões produtoras conseguem permanecer imunes. Há mesmo quem raramente se aventure na ideia de beber vinhos de outras regiões que não a sua, como se o mero acto de beber um vinho de outra região do mesmo país constituísse um crime de patriotismo deslocado. Mesmo em Portugal, país pequeno e socialmente coeso, podemos encontrar casos de bairrismo exacerbado, visíveis por exemplo na dificuldade em descobrir vinhos de regiões como a Bairrada, Dão, Douro, Lisboa, Vinho Verde ou Tejo na quase totalidade dos restaurantes alentejanos.
E se até o bairrismo pode valer como entrave directo à penetração de vinhos de outras regiões nacionais, como classificar então os vinhos estrangeiros? Sobretudo quando a maioria dos portugueses desconhece quase por inteiro a sua existência e as suas particularidades. A maioria dos portugueses assume com naturalidade que países como a França, Itália ou Espanha sejam produtores de vinho mas essa mesma maioria sentirá maior dificuldade em acreditar que países como a Austrália, Chile, Argentina, Estados Unidos da América ou África do Sul possam produzir vinhos minimamente decentes. E apesar de outros países nos serem mais próximos, pelo menos geograficamente, poucos acreditam que países como a Áustria, Alemanha, Suíça, Grécia, Hungria ou Nova Zelândia produzam sequer vinho… quanto mais de qualidade que possa ser comparável à dos vinhos portugueses. Assunções terrivelmente erradas mas que caracterizam a maioria dos consumidores nacionais.
Para além da rejeição natural que muitos lhes devotam espontaneamente, há ainda que contar com o desconhecimento dos muitos e diversos estilos e variedades, com o receio do desconhecido e com a obrigação de investir tempo e dinheiro no conhecimento. Para nem invocar todos os preconceitos culturais mais ou menos invisíveis, aqueles que marcam de forma indelével uma nação, memórias que nos afastam intuitivamente de determinados países e regiões. Veja-se, no caso português, a dificuldade que os vinhos espanhóis sentem em penetrar no mercado nacional, tal como os vinhos portugueses em Espanha, condenados por séculos de afastamento e de intolerância mútua.
Curiosamente, e ao contrário do que seria expectável, as grandes superfícies têm liderado o processo de introdução de vinhos estrangeiros, sempre com o factor preço em atenção, tacteando o mercado e auscultando sensibilidades de consumidores, trabalhando com um leque reduzido de referências que prenunciam uma evolução na atitude de distribuidores e consumidores.
Porém, e apesar de alguns tímidos progressos, Portugal continua a ser um mercado diminuto e imaturo, refém de uma distribuição e comercialização ainda demasiado amadora e casuística que mantém critérios de selecção pouco compreensíveis e que flutuam ao sabor das circunstâncias e oportunidades. Subsistem as importações aleatórias, com uma ou outra colheita importada logo seguida por longos anos sem actualizações, perduram os catálogos com referências de valor e interesse duvidoso, persistem os importadores/distribuidores que não sobrevivem mais de um ano… e, entretanto, vão nascendo alguns projectos megalómanos, totalmente alienados por realidades que não se compadecem com erros de cálculo tão grosseiros.