Fugas - Vinhos

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Os fantásticos brancos e tintos Viña Tondonia

Por Pedro Garcias

Na região espanhola da Rioja, assolada na última década por uma febre de arquitectura vanguardista ligada ao vinho, as Bodegas Lopez Herédia continuam a fazer brancos e tintos como faziam há 100 anos.

Quando nos aproximamos da vila riojana de La Guardia, erguida em torno do seu castelo e assente em caves subterrâneas de vinho, há uma construção ondulada que se intromete na paisagem dominada pelos montes cantábricos. As formas fazem ecoar ainda bem longe o traço do arquitecto espanhol Santiago Calatrava, contratado pela Domeq no auge da bolha financeira da década passada para desenhar uma adega que fosse também um ícone turístico. O impacto é poderoso.

Mal surge no horizonte, a adega age sobre o visitante como um íman, que só se desprende após ser cruzada a porta de entrada. Lá dentro, a imagem não é tão prodigiosa: há uma adega em remendos, com cubas invertidas sem uso — o baixo pé direito do piso obrigou a desenhar cubas especiais que não deram bons resultados —, tectos com marcas de infiltrações e uma enorme cave transformada em mostruário de barricas. E pouco mais.

Pensada para vinificar cerca de um milhão de garrafas, a adega Isyos faz actualmente cerca de 150 mil, mais ou menos duas garrafas por cada visitante. Números modestos. A crise trouxe os responsáveis da Domeq à terra e a política agora é fazer vinhos de terroir, aproveitando as vinhas velhas que a empresa possui na Rioja Alavesa. Um deles, o Isyos Edición Limitada Tinto 2009, é magnífico.

Não muito longe, na localidade de El Ciego, um monumental hotel de luxo, assinado por Frank O. Gerhy, ilumina as bodegas dos herdeiros do Marquês de Riscal. O seu impacto no cenário envolvente é da mesma grandeza da adega Isyos. As suas formas e silhueta, similares às do Museu Guggenheim de Bilbau, são espectaculares, rebrilhando de modernismo no meio de uma paisagem tipicamente rural.

Este hotel vínico de Gehry e a adega de Calatrava são, sem dúvida, os principais ícones do vanguardismo arquitectónico da Rioja vinhateira, mas quem gosta de arquitectura e de vinhos encontra o céu em Haro, a capital da chamada Rioja Alta. É ali que se situam as Bodegas Lopez de Herédia, as mais antigas de Haro e uma das três primeiras de toda a Rioja.

O termo “bodegas”, no plural, ajusta-se na perfeição ao enorme labirinto de edifícios antigos situados mesmo junto a uma das margens do rio Ebro. Todos eles conservam o traço original, iniciado no último quartel do século XIX. Mas na entrada sobressai agora um novo corpo que contrasta de forma flagrante com tudo o resto. Para assinalar os 125 anos da casa, a família Lopez de Herédia decidiu recuperar um stand modernista de 1910 que herdara do fundador e, para lhe dar um novo uso, desafiou Zaha Hadid a criar uma cobertura.  E a famosa arquitecta iraquiana desenhou um novo espaço em aço e vidro de grande beleza que protege o stand de madeira e funciona hoje como sala de vendas e de provas.

Depois de cruzarmos este elemento moderno, o que nos espera nas Bodegas Lopez Herédia é um conjunto de edifícios e caves subterrâneas cheios de patine e vetustez, uma adega mergulhada nas trevas da tradição e na insistência num estilo de fazer vinho que se mantém praticamente igual há mais de 100 anos. O vinho continua a fermentar em grandes e antigos balseiros de madeira (não há inox) e nas diversas caves envelhecem cerca de 13 mil barricas de muito uso e milhares de garrafas cobertas de teias de aranha e bolor. Nenhuma colheita sai para o mercado com menos de 10 anos de estágio em cave.

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