As castas francesas Cabernet Sauvignon e Pinot Noir chegaram ao Ribatejo em meados do século passado, pela mão do conde, que as plantou, juntamente com a Trincadeira Preta, em parcelas separadas e identificadas, o que permitiu mais tarde fazer a vinificação separadamente.
Vinho, faisões e flamingos
O enólogo David Ferreira mostra-nos essas vinhas mais velhas da propriedade. “Estes solos arenosos desgastam mais as plantas” mas permitem também fazer vinhos mais concentrados, explica. “É raro no Ribatejo, nas areias, haver vinhas tão velhas.” Temos aqui, por exemplo, a Trincadeira, que vem dos anos 1950 e que “não precisa de rega porque era plantada manualmente e a grande profundidade, por isso chega à água natural do solo”. E sorrindo conclui: “Os antigos sabiam o que faziam.”
Foi por essa altura que “se formou aqui uma identidade”, mas eram ainda os tempos da venda de vinho a granel, porque só nos anos 1990 é que a herdade começa a engarrafar, surgindo então as marcas que ainda hoje são a imagem da casa como o Padre Pedro, que em 2007 foi considerado pelo The New York Times o melhor vinho do mundo abaixo dos dez dólares (Padre Pedro Tinto de 2002).
Inicialmente, todas as garrafas aqui produzidas eram exportadas para a Alemanha, até por causa das ligações da família a este país; hoje os maiores mercados são os Estados Unidos e a Ásia. A partir de 2000, já com o enólogo Rui Reguinga (com o qual David Ferreira começou a trabalhar), a área de vinha começou a ser gradualmente reconvertida, apesar de não aumentar em número de hectares.
Seguimos de jipe pela herdade fora enquanto David Ferreira, que hoje está a fazer de nosso guia, conta que é dentro da herdade que se encontram os concheiros de Muge, um importante sítio arqueológico mesolítico, que, segundo o enólogo, continua sempre a atrair muitos interessados.
Passamos por local de produção de faisões para caça (projecto de um dos membros da família), por eucaliptos (“que dão ao Cabernet Sauvignon um perfil muito particular”), vemos as garças ao pé dos puro-sangue lusitanos, e, por dificuldades técnicas, só não conseguimos chegar ao pé dos flamingos que, garantem-nos, também por aqui se passeiam.
Vemos ao longe a aldeia de Granho, que nasceu e cresceu no meio da herdade, composta sobretudo por pessoas que vieram de outras regiões para trabalhar nas terras da Casa Cadaval, e cujo território foi depois cedido à população. Aliás, a família orgulha-se de sempre ter mantido óptimas relações com os seus trabalhadores, o que terá explicado que na altura do 25 de Abril, e ao contrário do que aconteceu com muitas outras propriedades que foram ocupadas, esta casa agrícola manteve-se intacta nas mãos da família.
Terminada a volta de jipe, é hora do almoço e tempo de conhecer a família, na casa histórica que foi da rainha D. Leonor, entrou no dote de D. Nuno Álvares Pereira de Melo, primeiro duque de Cadaval, pelo seu casamento com Maria de Faro, filha dos condes de Odemira, e pertence aos Cadaval desde 1648. Já não é exactamente a mesma casa, porque o terramoto de 1755 deixou-a praticamente destruída, mas preserva muitas histórias desta região — incluindo uma biblioteca importantíssima que no passado foi estudada pelo padre Carlos da Silva Tarouca, que também vivia na casa.