Fugas - Vinhos

PAULO PIMENTA

Muralhas de Monção

Por Rui Falcão

O movimento cooperativo passa por momentos difíceis, condição que a realidade se encarrega de confirmar de forma nua e crua.

 As falências técnicas sucedem-se, mesmo se muitas delas encapotadas por razões políticas e sociais, os pagamentos a cooperantes e fornecedores atrasam-se enquanto as adegas vão desbaratando o prestígio que tinham conquistado aumentando stocks que em muitos casos são invendáveis. Ao mesmo tempo, os associados vão desesperando com a falta de capital e a ausência de alternativas válidas, sentindo na pele o temor da ruína.

Imagem ecléctica de uma época histórica, representante de um modelo económico senhor de múltiplas virtudes teóricas e utópicas, o movimento associativista passa hoje por uma fase de delicadeza estratégica e financeira sofrendo de recorrentes ameaças de falência. O prenúncio de um fim que assinala uma crise de consequências sociais imprevisíveis. Diga-se em abono da verdade que os graves problemas do movimento associativista nacional pouco ou nada têm a ver com a propalada crise económica presente, decorrendo mais de equívocos sucessivos de concepção, erros atribuíveis ao passado e ao presente. Sofreu e sofre de falta de diligência e expediente, ausência de investimento, carência de uma gestão profissional ou, em termos mais abstractos, do abandono geral a que a paisagem rural foi sujeita.

Mas, apesar de todas as sombras e de o panorama se mostrar tendencialmente sombrio, para o movimento associativo ainda é possível encontrar casos de sucesso no mundo cooperativista, adegas que florescem e que mantém uma estabilidade e conforto financeiros notáveis. Adegas cooperativas que conseguem colocar vinhos bons, agradáveis e em regra a preços muito competitivos, adegas que apostam na qualidade e que ajudaram e continuam a ajudar a impulsionar a imagem das regiões onde estão inseridas.

Como sempre, não há milagres. Para o sucesso do associativismo foi fundamental recorrer a uma gestão profissional, financeira e enológica, que determine uma estratégia pensada e controlada que aposte em vinhos de qualidade que possam ser vendidos a preços sensatos. O extremo noroeste de Portugal sintetiza todos estes predicados numa das adegas cooperativas de maior prestígio e sucesso em Portugal, a Adega Cooperativa de Monção. Os brancos desta adega personificam a opção sólida de tantos portugueses, o refúgio seguro na restauração traduzida em vinhos frescos, jovens e vibrantes. Podemos quase considerar que são vinhos que expressam a imagem da frescura da região.

Apesar de a adega também produzir vinho tinto, o Danaíde tinto e o Tinto de Monção, duas marcas célebres na região, são os vinhos brancos da casa que a tornaram famosa fora das fronteiras um pouco mais étnicas da versão tinta do Vinho Verde. Na realidade, são os dois porta-estandartes da adega, o Muralhas e o Alvarinho Deu-la-Deu, que fazem as delícias nacionais apresentando-se como responsáveis pelo forjar de uma imagem. Os elogios não são excessivos para quem domina a resolução da difícil equação que agrega no mesmo binómio as variáveis quantidade e qualidade.

A constância de qualidade e a consistência de colheitas tornaram estes dois vinhos em casos excepcionais de sucesso. A ampla distribuição na restauração e nas grandes superfícies aliada a preços comedidos encarregaram-se de criar e perpetuar o êxito das duas marcas. A fidelização à marca, a confiança no rótulo, é quase incomparável no panorama português. Quantos perdem tempo a mirar com atenção para a data de colheita do Muralhas? Seguramente muito poucos por saberem que a rotação será alta e por terem a qualidade do vinho como um dado adquirido. Não será preciso pedir mais para determinar a felicidade de um produtor.

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