Fugas - Vinhos

Enric Vives-Rubio

Preços baixos, o maior erro do vinho

Por Rui Falcão

Por muito que isso doa aos mais apegados aos valores do patriotismo, não é nada fácil vender vinho de um país que oferece uma imagem tão fraca e apagada como Portugal.

Não será certamente necessário recordar a severa crise económica que assola a Europa e o mundo ocidental de forma mais ou menos generalizada. Crise que em Portugal ganhou uma intensidade atroz e um fervor ainda menos recomendável que as crises anteriores cíclicas a que infelizmente já nos tínhamos habituado. Há quase uma década que a palavra crise e as suas consequências nos acompanham no dia-a-dia, há quase uma década que a palavra teima em permanecer na memória e em fazer sentir os efeitos corrosivos de uma crise económica e financeira que se prolonga no tempo, mantendo uma virulência que nos era desconhecida.

Apesar das muitas tentativas para afastar a palavra do pensamento, a crise é uma palavra malfadada que nos tem acompanhado ao longo dos últimos anos e que parece não querer dar sinais de apaziguamento. De tanto ouvir falar na crise e de tanto sentir os seus efeitos perversos, já quase aceitamos a sua existência como um facto consumado, uma fatalidade que se colou à pele do país e com que teremos de conviver durante um número indeterminado de anos ou décadas.

As consequências da crise afectam a larguíssima maioria da população e tardam em aligeirar os seus efeitos imediatos, materiais e emocionais. A crise expõe não só as fragilidades directas, visíveis de forma enfática nas taxas de desemprego e no fraco rendimento disponível das famílias, como as fraquezas indirectas visíveis no sentimento de depressão colectiva e de aparente prostração face ao futuro imediato. Talvez ainda pior que a sensação de crise seja a falta de vislumbre de um futuro mais esperançoso, a ausência de perspectivas de uma melhoria palpável a curto ou a médio prazo.

A crise passou a formar parte das nossas vidas, do quotidiano, ao mesmo tempo que o conceito se entranhou de tal forma que já nos habituámos a lidar com muitos dos dramas que ela estimula no orçamento e na saúde financeira das famílias. Se o dinheiro já escasseia para os bens essenciais, para aqueles que todas as famílias não podem dispensar, os bens considerados não essenciais sofrem ainda um agravo extraordinário que, apesar de compreensível, é dramático para quem produz esses bens prescindíveis como o vinho.

A somar ao efeito da crise no rendimento disponível dos portugueses junta-se o transtorno e a escassez de financiamento, bem como os prazos dilatados de pagamento e a enorme dificuldade na cobrança. Como se esta perspectiva não fosse aterradora só por si, para os produtores nacionais soma-se ainda uma diminuição de consumo de vinho motivada pelas circunstâncias da vida moderna que, entre outros contratempos, diabolizam o álcool e o consumo de vinho. São sobretudo os países do Sul da Europa que diminuíram o consumo de vinho, bebendo muito menos vinho hoje que num passado recente, o que implica que, desejando-o ou não, não resta outro caminho aos produtores nacionais que não passe pelo aumento ou pela aposta decidida na exportação.

Exportar transformou-se numa necessidade imperial de sobrevivência para os milhares de produtores nacionais. Num período de afirmação europeia e integração numa comunidade política e económica, os produtores nacionais definiram intuitivamente os mercados europeus como alvos principais da investida portuguesa. Com maior ou menor taxa de sucesso consoante as regiões e os produtores, mas sempre com esforço e algumas privações, os produtores portugueses tentaram penetrar em mercados tão diferentes entre si e com realidades tão distintas como a Alemanha, Polónia, Noruega, Suécia, Dinamarca, Inglaterra, Holanda, França ou Irlanda, infelizmente quase sempre escondidos sob o anonimato das prateleiras do fundo das garrafeiras e supermercados.

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