Fugas - Vinhos

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Vítor Claro escolheu a vinha mais romântica

Por Alexandra Prado Coelho

Fechou o seu restaurante Claro para se dedicar inteiramente aos vinhos. E, tal como fazia com os ingredientes nos seus pratos, Vítor Claro procura a pureza e a verdade nas vinhas velhas. É uma busca filosófica.

É uma daquelas histórias de amor à primeira vista. Assim que viu a vinha, na serra de São Mamede, junto a Portalegre, Vítor Claro soube que era aquela. Não era a vinha mais óbvia e, para quem quisesse fazer um bom negócio com a produção de vinho, estava longe de ser a vinha certa. Mas Vítor Claro não estava interessado em nenhuma outra.

Nesta altura do ano, sem cachos de uvas nem folhas, os troncos curtos, fortes e retorcidos erguem-se do solo estendendo braços dramáticos em direcção ao céu. São, percebe-se só de olhar para eles, antigos, sábios, exigentes e caprichosos. “Passei aqui por acaso, olhei e disse ‘É exactamente disto que ando à procura’ [por enquanto tem apenas a exploração mas o objectivo é comprar a vinha e a propriedade]”, conta Vítor, que acaba de fechar o seu restaurante Claro para se dedicar inteiramente, com a mulher, Rita, à produção dos seus vinhos – Dominó e Foxtrot, para já, e outros, para breve.

E porquê a certeza? “Tinha a ver com a quantidade de vinhas que eu tinha visitado, de vinhos que tinha provado, de pessoas que fui conhecendo.” A mais influente foi sem dúvida Dirk Niepoort, o produtor do Douro (e não só), com o qual foi conversando muito ao longo dos anos, conversas que o ajudaram a ir descobrindo qual o perfil de vinhos de que mais gostava. “Quis fazer aqui os vinhos que me agradam cada vez mais como consumidor, vinhos mais leves, finos, com mais expressividade”, explica Vítor. “Isso consegue-se com o trabalho na adega. O trabalho na vinha serve para garantir pureza nos vinhos, o da adega para garantir uma filosofia.”

Há-de falar várias vezes de filosofia nesta conversa, que começa na vinha, e continua, já depois de Rita se juntar a nós, na “garagem”, onde no último ano fizeram o vinho. “Os famosos vinhos de garagem. Levámos isso à letra”, dizem, rindo.

A vinha, que tem cerca de um hectare e meio, foi no passado uma das vinhas modelo da adega cooperativa. “Hoje já é raro encontrar uma vinha plantada com esta técnica. Parece que está toda desorganizada”, diz Vítor. “Mas, se virem bem, há aqui uma linha de vinha, ali outra, e se olharem ali para baixo vêem outra linha plantada nesta direcção. Eram as plantações em triângulo para se poder lavrar num sentido num ano, noutro dois anos depois, e noutro ainda dois anos mais tarde. E isto é a poda de gobelet, em que a vinha não é dirigida para arames. É uma maneira muito natural de fazer as coisas, em que a vinha cria o seu próprio ensombramento.”

Quem o ouve pensa que toda a vida andou à volta disto. Mas não. “Não percebia nada de vinhos”, confessa. “No primeiro ano fiz tudo ao telefone com o Dirk.” Anda nisto desde 2010, sempre a tentar conciliar com o restaurante que tinha em Paço de Arcos. Mas as coisas estavam difíceis para o restaurante e, apesar da remodelação que fez no Verão passado, tornou-se cada vez mais evidente que não era possível compatibilizar as duas actividades.

“2015 foi o primeiro ano em que decidimos vir nós, eu e a Rita, tratar disto”, conta. “Viemos com as roçadoras e as tesouras de poda, andámos a podar, a fazer a monda. Era preciso perceber o que queríamos para depois podermos pedir às pessoas que fizessem o trabalho. Foi muito importante para nos levarem a sério.”

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