Fugas - Vinhos

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Sogrape: a empresa que se dá bem com as amizades e as crises

Por Pedro Garcias

Nasceu em plena Segunda Guerra Mundial, com 16 sócios e um capital de 625 contos. Setenta e cinco anos depois, a Sogrape está presente em 120 países, possui cerca de mil funcionários e factura mais de 200 milhões de euros. Uma história de sucesso que tem a uni-la três gerações da família Guedes.

Menos de cinco anos depois de ter comprado, por cerca de 50 milhões de euros, as Bodegas Lan, na Rioja, a Sogrape começa o ano de 2017 quase sem dívidas (ver PÚBLICO de dia 27 de Janeiro), com uma nova imagem corporativa (uma tocha transportando “um legado de vinhos originais”) e mais um investimento estratégico: a compra de uma quota da Liberty Wines, uma das mais importantes distribuidoras do Reino Unido. Setenta e cinco anos depois de ter sido criada, a empresa atravessa um momento especial.

Especial não só por estar mais sólida do que nunca, após ter atingido em 2016 a maior facturação de sempre (cerca de 215 milhões de euros), mas porque estes resultados acontecem na mesma altura em que a família Guedes — que detém a maioria do capital da Sogrape — se debate com a doença de Salvador Guedes (sofre de Esclerose Lateral Amiotrófica, enfermidade degenerativa que, em 2015, o obrigou a abandonar o cargo de presidente da companhia, agora ocupado pelo irmão, Fernando Guedes).

Antes de deixar a presidência, Salvador preparou a transição e, mesmo só comunicando com os olhos e já sem qualquer tipo de mobilidade, continua a ir todos os dias à empresa, mostrando com o seu emocionante exemplo a força do legado que o pai, Fernando Guedes, e, antes deste, o avô, Fernando van Zeller Guedes, foram passando às gerações seguintes. No passado dia 27 de Janeiro, Salvador Guedes também se associou à celebração dos 75 anos da Sogrape, que, longe dos holofotes televisivos, juntou no solar Honra de Azevedo (Vila Verde) o actual Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, dois ex-presidentes (Cavaco Silva e Jorge Sampaio), vários ministros, políticos de todos os quadrantes, banqueiros, gestores, empresários e muita gente ligada ao sector do vinho.

Ao todo, foram cerca de 500 convidados, num jantar com direito a um miniconcerto de Mariza e a algumas surpresas: sem aviso prévio, o ministro da Agricultura, Capoulas Santos, agraciou a Sogrape com a medalha de honra do Ministério da Agricultura e o Presidente da República atribuiu a Fernando Guedes, o patriarca da família (CEO da empresa entre 1987 e 2000, ano em que cedeu o lugar ao filho Salvador) a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique. Duas condecorações que, como sublinharam Capoulas Santos e Marcelo Rebelo de Sousa, distinguem um percurso empresarial notável e também uma forma distinta de estar na vida e nos negócios. Se a Sogrape chegou até onde chegou, se hoje é a maior empresa de vinhos portuguesa e uma das maiores do mundo, foi porque soube olhar para cada momento histórico com uma visão de longo prazo e aproveitar as oportunidades que as crises geram, respeitando sempre a máxima imposta pelo fundador: “Primeiro fazemos amigos, depois fazemos negócios”.

 

O factor Mateus

A Sogrape nasceu no auge da Segunda Guerra Mundial, quando o negócio do vinho estava praticamente paralisado. A exportação de vinho do Porto baixara de cerca de 80 mil pipas para pouco mais de 10 mil e o envolvimento na guerra da Inglaterra e da França, os dois principais mercados, ainda piorava mais o cenário. Visionário, Fernando van Zeller Guedes terá, no entanto, vislumbrado na crise do vinho do Porto uma oportunidade para o vinho de mesa e, no Verão de 1942, juntamente com o irmão Roberto, convenceu vários empresários portugueses, franceses, suíços e belgas radicados no Porto a criarem uma empresa de vinhos. E foi assim que, em 22 de Julho desse ano, com 16 sócios e um capital de 625 contos, surgiu a SOGRAPE- Sociedade Comercial dos Vinhos de Mesa de Portugal.

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