Esta é uma região com grande tradição de produção de vinho, mas sobretudo para consumo local. “Na altura, o vinho não viajava como hoje. Havia aqui muitas mini-adegas com ânforas de barro e havia excursões de malta que vinha de bicicleta para provar o vinho ainda antes de ele estar totalmente fermentado.”
Não lhe perguntem por uvas. Isso não lhe interessa. “Para mim não há uvas boas nem más. Há fenótipos, terroirs, climas.” E, acima de tudo, há diversidade. Indigna-o o “afunilamento das uvas” que se fez nos anos 80 e acredita que das vinhas velhas se faz “um vinho bem mais diverso, autêntico, especial.”
Divide os seus vinhos em “marcas dos astros”, com o Solstício (tinto, vinha velha) e o Equinócio (branco, vinha velha) e “marcas da vida”, com o Respiro, que é feito com uva comprada de diversas proveniências, sendo que o espumante é da Beira. “No Respiro faço o que me apetece, com as uvas que quero”, resume. Com uvas do Alentejo faz “um tinto de Verão, com pouco álcool, mas agora prepara-se para fazer exactamente o oposto: um branco com estrutura de tinto e com taninos. “Inverto os conceitos”.
Mas o mais importante, para João Afonso, é mesmo a “recuperação de memórias, de patrimónios”. “São muito importantes para a cultura do gosto”, diz. “É preciso mostrar os valores clássicos”.
Susana Esteban
Chamou “Procura” ao seu vinho da serra de Portalegre porque foi preciso procurá-lo. Susana, espanhola nascida em Tui, mas com experiência de fazer vinhos no Douro e no Alentejo, queria criar vinhos mais frescos. A procura acabou em 2011, quando chegou à serra de Portalegre e viu as vinhas situadas a 700 metros de altitude. Tal como tinha acontecido anos antes com Rui Reguinga, também foi esta a região que a enóloga escolheu para lançar o seu projecto em nome próprio.
“São vinhas velhas, que pertencem a pessoas com uma certa idade, que as usavam para fazer vinho próprio”, conta. Agora, Susana compra as uvas a estes proprietários e faz o Procura tinto a partir de duas parcelas completamente diferentes: a das uvas da vinha velha da serra, uma mistura de variedades, que lhe dá “uma frescura e complexidade pouco habitual”, e o Alicante Bouschet, que vai buscar perto de Évora, a uma zona de solos xistosos, e que “é muito importante para dar estrutura ao vinho”.
Dois anos depois, encontrou também em Portalegre a vinha velha, “única e excepcional”, a partir da qual faz o “Procura” branco. O lagar é em Mora, mas para Susana o que importa realmente é que as uvas sejam da serra e transportem esse terroir nelas.
“Há uma tendência, que é mundial, para fazer vinhos mais frescos”, explica. “No Alentejo muitos produtores grandes estão a plantar na zona da serra ou então perto do mar.” Portalegre é, nesse aspecto, “excepcional”. “Provados às cegas, ninguém diria que estes são vinhos do Alentejo”.
Vítor Claro
Foi também a paixão por uma vinha velha em Portalegre que levou Vítor Claro a tomar uma decisão difícil no final de 2016: fechar o seu restaurante Claro, deixar a cozinha (pelo menos por uns tempos) e dedicar-se inteiramente ao vinho, num projecto com a mulher, Rita.
É, para já, apenas um hectare e meio de vinha alugada, que, tanto quanto o casal apurou, foi no passado uma das vinhas modelo da Adega Cooperativa. Há muito que Vítor Claro se interessa por vinhos (notava-se isso, aliás, no entusiasmo com que formou a garrafeira no seu restaurante) mas continua a considerar-se um principiante, que vai ouvindo os conselhos de um amigo experiente, neste caso um dos mais experientes do país, Dirk Niepoort.