Fugas - Vinhos

  • Nelson Garrido
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Nuno Magalhães: A revolução nas vinhas depois do PREC

A Comissão era constituída também por três elementos, sendo um nomeado pelo Governo e dois de campos políticos diametralmente opostos, atendendo à conjuntura política que então se vivia. Pese embora o facto de ter sido um período “divertido” e até pacífico, não era propriamente a actividade que eu queria e para a qual tinha tido preparação académica. Surgiram então dois telefonemas, dos colegas Bianchi de Aguiar e Arnaldo Dias da Silva, a “aliciarem-me” para ir para Vila Real, a fim de dar aulas de viticultura no então Instituto Politécnico. Com a minha mulher lá fomos ver o que se passava. Decidimos mudar de rumo e de terra. Custou um pedaço deixar a nossa casa de Miramar mas, estava decidido. De armas e bagagens num velho 4L, com os nossos três Filhos, lá abalámos pelas curvas do Marão. Nessa altura eram umas três horas de viagem, e de enjoo de alguns dos ocupantes mais pequenos.

Dar aulas era coisa que nunca me tinha passado pela cabeça, mas a vida às vezes prega destas partidas. Tive de passar uns tempos de estudo para actualizar os meus conhecimentos, aprofundar matérias, preparar as aulas. O que é facto é que a minha vida profissional só então se iniciou verdadeiramente, quer sob o ponto de vista académico, quer sob o de Agrónomo orientado para a viticultura. O estatuto da nossa actividade incluía naturalmente não só a docência mas também, obrigatoriamente, a investigação a diferentes níveis de objectivos e de aplicação. Nesse sentido a componente experimental era fundamental, neste caso para o desenvolvimento da vitivinicultura da Região do Douro, que muito se encontrava carente, sobretudo face aos novos modelos vitícolas decorrentes sobretudo da necessidade de mecanização para obstar à escassez crescente de mão-de-obra, a que o PDRITM (um plano de modernização da agricultura financiado pelo Banco Mundial nos anos de 1980) teve particular atenção.

Por outro lado, o conhecimento mais aprofundado de cada casta era ainda bastante empírico e difícil de interpretar, já que as castas se encontravam misturadas em cada parcela e não de forma individualizada. Ora, em finais da década de 70 recebi um desafio por parte do meu colega e amigo Antero Martins, para iniciarmos a selecção clonal de castas, o que na altura não existia ainda em Portugal. Por sugestão do Eng. Gastão Taborda, do CEVD (Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro), demos prioridade à Touriga Nacional, que ele considerava ser a melhor casta para vinho do Porto, mas que estava em vias de extinção devido à sua baixíssima produtividade e à sua sensibilidade ao “desavinho”, o que aliás foi confirmado durante a fase de prospecção, durante quatro anos, em vinhas ao longo das regiões do Douro e do Dão.

Outras castas se seguiram, envolvendo várias dezenas de técnicos e de auxiliares, em apoio a campos experimentais, não só no Douro como em todas as regiões vitícolas do País. A selecção da videira e trabalhos de índole vária sobre aquela casta, foram aliás como que um fio condutor da minha carreira de investigação/experimentação, incluindo a Tese de Doutoramento. Para a preparação da tese obtive contributo valioso por um estágio frequentado na Universidade de Davis, na Califórnia. Para além daquela actividade, exerci na UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro) outras funções, tais como a Coordenação do curso de Enologia, durante meia dúzia de anos, e a Coordenação pela UTAD, do International Master of Enology and Viticulture (Master Vintage), que envolveu oito universidades europeias, uma da África do Sul e outra do Chile, desde 2000 a 2016, o qual me deu a oportunidade de leccionar na Universidade Pontifícia de Santiago do Chile e de conhecer a sua viticultura de vários países e regiões da América do Sul e da Europa.

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