Fugas - Vinhos

  • Manuel Roberto
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Entre o Pico e São Jorge com vinho, queijo e conservas

O núcleo principal de vinha situa-se na zona da Criação Velha, mesmo de frente para a ilha do Faial e onde o comendador Manuel Serpa, ex-padre, político reformado e verdadeira enciclopédia viva, deu uma verdadeira lição de história ao grupo. É um imenso e reticulado lajido de cujas curraletas saem os vinhos mais maduros da ilha, em especial da casta Verdelho, a base dos tradicionais licorosos, vinhos com 16 a 19 graus de álcool, normalmente não aguardentados, envelhecidos em pipas de muito uso e com um aroma e um sabor desconcertantes. Quem está habituado a Porto Tawny e a Madeira, pode estranhar. Mas, aos poucos, é difícil ficar indiferente e não gostar destes vinhos secos ou meios secos de grande salinidade e frescura.

Os licorosos mais surpreendentes encontram-se muitas vezes em casa de pequenos viticultores, em especial da zona da Criação Velha. Viticultores como António Tavares, que todos os anos faz umas poucas centenas de litros de Verdelho. Espreitando a pequena adega, ninguém daria um cêntimo pelo seu vinho. Mas o seu Verdelho, seco, salino e com uma acidez pungente, foi um dos melhores que se provaram. 

Não há nada que rivalize com a zona da Criação Velha. As suas vinhas de lajido são as mais cobiçadas da ilha. Mas há um outro lugar que começa a ser falado: São Mateus. É aqui que a Azores Wine Company, de António Maçanita, Paulo Machado e Filipe Rocha, está a erguer a maior vinha contínua do Pico. São cerca de 40 hectares de curraletas, até há bem pouco tempo povoadas de faias e incensos. A mesma empresa – envolvida em projectos de recuperação das castas Verdelho, Arinto dos Açores e Terrantez do Pico e que tem vindo a produzir alguns dos mais entusiasmantes brancos dos Açores, todos monocastas - está também a recuperar vinhas na zona das Bandeiras, na costa norte, e vai participar ainda num projecto de enoturismo em São Roque. Ao todo, a Azores Wine Company irá ficar com uma área de cerca de 100 hectares de vinha, mais ou menos 10 por cento do total da área de vinha da ilha.

Nessa altura, será o maior operador privado. Hoje, disputa esse estatuto com a Curral Atlantis, a primeira empresa a engarrafar vinhos estremes no Pico e cujo consultor enológico é Paulo Laureano. Os seus Arinto e Verdelho-Arinto são brancos com uma tensão e uma frescura fabulosas. O  grosso da produção da ilha continua a ser assegurado pela Cooperativa Agrícola do Pico (produz entre 200 mil e 400 mil litros por ano), que tem vindo a renovar o seu portefólio, com a aposta em vinhos naturais, espumantes (muito bom o Gouveio, ainda por engarrafar) e em brancos com fermentação e estágio em barrica.

Um deles é o novo e interessante Espalamaca, ainda por engarrafar mas que pudemos provar pela primeira vez em São Jorge, no final de uma rápida incursão de um dia a esta ilha, iniciada com uma visita à queijaria Canada, que só utiliza leite cru de produção própria. A procura é tanta que os queijos são vendidos com um tempo máximo de cura de apenas quatro meses. Os queijos mais velhos, com 12 ou 24 meses de cura, os melhores, só são produzidos pela União das Cooperativas Agrícolas de lacticínios de S. Jorge, também a partir de leite cru. São queijos crocantes que pedem mesmo vinho, em especial licorosos do Pico, mas também brancos como o referido Espalamaca. Bebêmo-lo a acompanhar umas deliciosas conservas de atum aromatizadas Santa Catarina, produzidas também em São Jorge, e uma tenra e suculenta carne de vitela grelhada do Pico, cortesia da Associação de Agricultores desta ilha. 

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