Fugas - restaurantes e bares

Nuno Oliveira

Roterdão é o novo velho porto do Cais do Sodré

Por Luís J. Santos ,

Receita: agarra-se numa casa de luz vermelha do Cais do Sodré; junta-se um mosqueteiro com mais de uma década ao serviço de um club de referência, o Incógnito; aplica-se um senhor regressado às noites, que outrora geria um antigo e afamado bar do Bairro Alto, o Naif. Mistura-se tudo com saber fazer, simpatia e boa onda, DJ e muitos projectos. E está pronto a servir o novo Roterdão, mais um passo para a revolução "sodrezística".
Roterdão é o novo velho porto do Cais do Sodré

Subitamente, as luzes voltaram a brilhar. A palavrinha Discoteca voltou a faiscar no seu folião neón. A palavrinha Roterdão voltou a luzir como não acontecia há quase uma década. Foi nos princípios de Julho que, graças a dois experientes e nocturnos Ruis, o mapa-múndi do Cais do Sodré recuperou mais um ponto geográfico, mais um porto no seu caminho para a renovação.

Encostado ao arco da Rua Nova do Carvalho, com a sua característica fachada de linhas laranja e bolas metalizadas, entre o lendário painel de azulejos do Velho Oeste do encerrado Arkansas e paredes meias com o enérgico MusicBox, o Roterdão renasce agora como disco-bar, novo club para as novas noites do Sodré. Para as noites e, em breve, também para as tardes, com petiscos e aperitivos. E se quem agora aporta ao Roterdão encontra apenas um simpático espaço de bar, de futuro pode esperar-se mais: na cave, agora um armazém, vai nascer uma discoteca, um espaço mais íntimo para dançar pela noite dentro. "É um work in progress", sublinha Rui Correia, que nos fala com paixão deste seu projecto. Tal como o seu sócio nesta aventura, outro Rui, Rebelo da Silva. Mantiveram o nome do bar, a fachada, limparam e renovaram interiores. "Temos um respeito pela história, não é chegar aqui e inventar do nada", hão-de dizer-nos a dado ponto. E, de facto, não chegamos a Roterdão vindos do nada. Não só a casa tem a sua história própria, como os seus novos responsáveis já têm uma longa história noctívaga. É deste confluir de histórias que advém também a garantia que o Roterdão ainda vai dar muito que falar.

Rui Rebelo da Silva trabalhou 12 anos à porta do célebre Incógnito (a que deverá estar a dizer adeus por estes dias) e tornou-se, para muitos, a cara da casa, impondo um estilo mosqueteiro (o bigode ajuda) que até lhe conquistou um certo apodo de D'' Artagnan. Mas o seu currículo já incluía passagens pelo Califórnia (outra experiência, noutros tempos, no Cais do Sodré), pelo saudoso e musical Johnny Guitar (nem de propósito, um dos sócios deste clube é Alex, agora ao comando do vizinho MusicBox) ou por outro carismático poiso, o antigo Nova, no Bairro Alto. Ora este Nova tinha por vizinho outra casa de boa memória, o Naif, e aqui quem mais mandava era Rui Correia. Salto no tempo, 2010: os antigos vizinhos juntam vontades e, shazam!, chegamos ao Roterdão. "Já era altura de ter o meu próprio espaço", diz Rebelo da Silva. "Surgiu-me a oportunidade de pegar neste espaço e voltar às noites", comenta Correia. Cada porto é feito das navegações dos seus marinheiros, já se sabe.

Ao serviço, o Roterdão tem agora apenas uma sala-pista. Por estas alturas, já deve brilhar novo mobiliário ainda a cheirar a novo - quando por lá passámos, a sala era ainda, digamos, ofuscada, por cadeiras e mesas que não lhe diziam muito respeito - destinado a criar um pequeno espaço mais lounge à entrada. O espaço é marcado ao centro por um imponente pilar que sustenta parte do tecto semi-abobadado e que se mostra em toda a sua beleza descarnada ("tinha um palmo de cimento todo à volta", conta Rebelo da Silva. Nada que umas boas marretadas não resolvesse). A propósito, o sistema luminoso inclui uma superior bola robótica de cores que é todo um clássico 70s/80s: lança uma miríade cromática que é uma espécie de arco-íris Saturday Night Fever. O balcão de bar corrido mantém-se sólido e de tampo alaranjado, com a parede traseira coberta a madeira e os espelhos (um must Sodré, obviamente). A cabine DJ completa a sala de estar-e-dançar e por este canto promete-se uma programação ecléctica e com nomes sapientes, até porque, com a experiência dos dois Ruis, não lhes faltam contactos e DJ a voluntariarem-se para musicar o sítio. Em geral, para além das autorias, é de esperar uma banda sonora que inclua espólios dos anos 70, 80 e 90, ou, como salientam, "intemporal". Tudo sublinhado por videowall.

Nos próximos meses, a freguesia poderá contar com novidades: por um lado, uma abertura mais vespertina, já, provavelmente, a partir de Setembro, com um ambiente de degustações, tapas e petiscos e o desenvolvimento do conceito bar de cocktails; uma tarefa árdua, já que a zona está habituada a receber os seus clientes madrugada adentro e não tarde fora. Mas com o Sodré a revolucionar-se e com novas casas a abrirem, é muito natural que a transformação também passe pelos horários da clientela. Por outro, há a expectativa por uma abertura nas profundezas, a da discoteca.

É que a cave do Roterdão também guarda as suas surpresas; se agora é uma espécie de armazém de tralha e achados quase arqueológicos (incluindo etílicos), com decorações inesperadas, como uma parede preta com uma bela e naif pintura da Acrópole ateniense - nada quesurpreenda desde que se saiba que noutros tempos o espaço era um restaurante... grego (chamava-se Bouzoki, nome que ainda sobrevive na porta ao lado do Roterdão).

É "um espaço simples, mas com conceito", resume Rebelo da Silva. A casa há-de ir ganhando a sua personalidade "com pés e cabeça",para que quem cá vem saiba que não vai ter más surpresas, há-de manter sempre o mesmo ambiente familiar, até porque a fidelização é toda uma filosofia. Marinheiros, é altura de voltar a Roterdão, que o vento de está de feição.

Há novidades no Cais
Cada vez que agora se regressa ao Cais do Sodré parece que há uma nova luzinha a brilhar - e não falamos de luzes vermelhas; pelo menos, literalmente: alguns novos espaços gostam de preservar o vermelhinho em honra da tradição, mas a questão passou a ser mais do domínio da estética que da "séxica". Cais do Sodré, update 2.0: além do novel Roterdão Club, a Rua Nova do Carvalho conta com mais algumas novidades recentes, caso do Bar do Cais (no nº 47, antigo ShangriLa), bar-disco-lounge minimal com festas várias, elenco de estrelas DJ e after-hours dominicais. E, para algo completamente diferente, acaba de chegar a Sol & Pesca, loja-bar gourmet com decoração à Conserveira Nacional, com prova e venda de conservas e bebidas - é a recuperação de uma velha loja, agora revista de alto a baixo segundo a modernidade mas mantendo o melhor da tradição, com ambiente confortável e abertura vespertina (às 18h00 -fecha às 22h00 à 3.ª e 4.ª; às 3h00 de 5.ª a sábado). Outra novidade: Gloria Live Music Club (Rua do Ferragial, 36), um clube dedicado de alma e coração à música ao vivo que pretende oferecer concertos todas as noites com grandes músicos e grandes vozes. Para descobrir, num ambiente requintado, numa antiga cave de antiquário artilhada agora com criatividade, conforto e toda a maquinaria e instrumentos necessários para a música. Já entre as estrelas firmadas do Sodré não vermelho: MusicBox, palco estrela de concertos e eventos de todo o tipo, Europa para festas, DJ e after hours, o lendário Jamaica e o clássico Tóquio, ou o Copenhagen, que começou a abrir as suas portas e ambiente espelhado a noites temáticas, after-hours e festas trash ou rockabilly. Até o rouge Liverpool já pisca o olho a outros públicos.

(Julho 2010)

Nome
Roterdão
Local
Lisboa, Santos-o-Velho, R. Nova Carvalho, 28/30 - Cais do Sodré
Telefone
963665669
Horarios
Terça a Sábado das 22:00 às 04:00
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