Fugas - restaurantes e bares

Pedro Cunha

Vítor Sobral de volta aos petiscos

Por David Lopes Ramos ,

O chefe de cozinha Vítor Sobral inaugurou recentemente, em Campo de Ourique, a Tasca da Esquina. A casa, com a sua oferta larga de petiscos, faz jus ao nome, mas percebe-se que na cozinha há o paladar apurado e a experiência do cozinheiro competente e experiente que há em Vítor Sobral.

Temos Vítor Sobral de regresso aos petiscos nesta recém-aberta Tasca da Esquina, em Campo de Ourique, em Lisboa. O ex-chefe do Terreiro do Paço foi, com Miguel Castro e Silva, este no Porto, um dos pioneiros a servir petiscos em espaços de cozinha sofisticada. Lembro-me das suas entradas no restaurante do Hotel Sofitel, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, o primeiro restaurante de hotel, se não erro, a entrar pelos caminhos da cozinha criativa, mas, sobretudo, dos petiscos, uns frios, outros quentes, com que me deliciei nos primeiros tempos da cervejaria Lusitânia, em Carnaxide.

Há no chefe de cozinha Vítor Sobral uma memória muito viva da tradição culinária rural popular portuguesa, em particular da alentejana, à qual se encontra ligado por razões familiares. Ao provarmos os petiscos de Vítor Sobral, de tempero e sabor apurados, percebemos que foram cozinhados com alegria e gosto. O azeite, sempre o azeite do bom, como gordura; o vinagre a refrescar e a avivar aromas e sabores; o alho, a cebola, a salsa, os coentros frescos, a hortelã, entre outros cheiros; o tomate, a massa de pimentão, umas voltas de moinho de pimenta preta em grão, o sal marinho são condimentos essenciais da petisqueira de Sobral, a qual, por exemplo na "farinheira com favas" (4,40 euros), ao chegar à mesa com as sementes descamisadas, nos diz que a cozinha desta Tasca da Esquina se distanciou das suas origens populares. Uma vez que é sabido que as favas nas tabernas e na generalidade dos restaurantes são sempre servidas com a camisa. Isto dito, tem que se acrescentar que esta farinheira com favas de Sobral não perdeu carácter e ganhou requinte.

Esta linha de petisqueira sofisticada encontramo-la ainda nas "codornizes com cerejas" (6 euros), na verdade peitos da avezinha temperados com flor de sal, mergulhados num caldo de cerejas, agora que estamos no tempo delas. O "berbigão no tacho" (8 euros), com tomate, cebola, alho, vinho branco, azeite, muito fresco, sem areia, cheiinho, uma delícia. Fazer das moelas fritas, no caso com puré maçã (4,20 euros), um petisco obrigatório, é uma manifestação de grande competência culinária. As moelas são difíceis. A maior parte das vezes surgem duras, algumas vezes de textura aborrachada, raramente são agradáveis. Estas da Tasca da Esquina são fritas à superfície e macias e carnudas no interior, sendo o puré de maçã agridoce um complemento adequado. Mais radicais e rústicos são os "rabinhos de porco de coentrada" (3,20 euros), com a carne a desprender-se dos ossinhos, bem temperada com alho, coentros frescos e vinagre, um petisco que muitos rejeitarão por preconceito, mas nem sabem o que perdem.

O mesmo direi dos "túbaros com pimentão" (3,50 euros). Os ditos são de porco (os da minha meninice eram de carneiro e a minha mãe chamava-lhes "alegrias"), são marinados, imagino que em vinho branco, vinagre, alho e massa de pimentão, depois fritos e se os citadinos deles desconfiam, melhor seria que não desconfiassem. Há um livro, entre o ensaio e obra de divulgação, com o título "Testicules", de Blandine Vié, que ensina tudo sobre o tema, incluindo um receituário desafiador. Quem for curioso, leia-o e, depois, vá à Tasca da Esquina comer os granulosos túbaros de porco com pimentão, os quais, rezam as crónicas familiares, havia um tio meu, na sua fase de miúdo vivaço, a apresentá-los como sendo "melhores do que rabos de sardinha" - salgados e, às vezes, rançosos, eram comida de Inverno das famílias pobres.

A oferta permanente de petiscos da Tasca da Esquina ultrapassa as duas dezenas. No dia- a-dia, há uma entrada, a 2,50 euros, que pode ser um "caldo de galinha do campo com hortelã", e um prato, a 9 euros, podendo ser-nos proposta "vitela como a minha avó fazia". Depois, há uma meia dúzia de pratos e aparentados, cujos preços variam entre os 7,50 euros (prego no pão) aos 19,50 euros (bife do lombo da casa), rubrica onde encontramos cozinhados tão interessantes como "O nosso bacalhau à Gomes de Sá", a excelente "raia cozida em azeite (2001)", o "atum com batata doce" (16 euros) ou a "queixada no forno com pimentão da horta" (12,50 euros).

Há ainda uma dúzia e meia de pratos e pratinhos de "queijos, enchidos e fumados", com Serra, Serpa, Azeitão, Terrincho, Niza, Ilha, entre outros, bem como sobremesas, entre elas umas bem recuperadas farófias (4 euros), cremosas e a cheirar a canela, além de quatro degustações - "Fique nas mãos do chefe": Sopa + 3 porções (14,50 euros); 5 porções (19,50 euros); 6 porções mais sobremesa (26,50 euros); e sete porções+queijo+sobremesa (32,50 euros).

A petisqueira à portuguesa exige bom pão e a broa de milho e o pão de trigo de mistura são-no. As azeitonas são bem curadas e carnudas. Os vinhos, umas quatro dezenas, de todos os géneros, vendem-se, a preços sensatos, a copo e à garrafa e são servidos às temperaturas adequadas e em bons copos. As instalações são confortáveis, merecendo destaque particular as cadeiras, tipo cadeirão, bem almofadadas, do espaço mais parecido com um restaurante convencional, pois é a salinha de entrada, com o seu balcão e mesas altas, que lembra mais a taberna.

Na cozinha, Vítor Sobral, para já, está muito presente, sempre muito bem acompanhado por Hugo Nascimento e Luís Espadana; na sala, Sérgio encarrega-se das sugestões de vinhos, enquanto umas moças competentes e lindas tratam muito bem de nós enquanto dura a refeição. Vou voltar, pois também gostei dos preços.

(Julho 2007)

Nome
Tasca da Esquina
Local
Lisboa, Santo Condestável, Rua Domingos Sequeira, 41C (Campo de Ourique)
Telefone
210993939
Horarios
Segunda a Sábado das 12:30 às 15:30 e das 19:30 às 23:00
Website
http://www.tascadaesquina.com
Preço
25€
Cozinha
Portuguesa
Espaço para fumadores
Sim
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