Fugas - restaurantes e bares

  • Miriam Lago
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Um café abençoado pela Sé

Por Luís J. Santos ,

Para os lados da Sé, Lisboa está cada vez mais animada. Cantava-se já fado, ouvia-se o sibilar do jazz, dançavam-se chorinhos. Agora, com os olhos na Matriz alfacinha, até se murmura "cruzes credo", mas não há pecado à vista. Fomos passear ao Cruzes Credo Café, novo café-bar bem aprumado, aberto até de madrugada e com direito a esplanada estival.
Um café abençoado pela Sé

Assim que se avista a frente da Sé, avista-se logo a nova estrela das redondezas. Ali, mesmo à entrada da carismática Rua Cruzes da Sé, num edifício que estava mesmo a pedi-las mas que ainda assim há uma década que estava esquecido, está posicionado o novo baluarte da zona, o Cruzes Credo Café, que, acabadinho de chegar, impõe logo o convite para esplanar: ah! pois é, a Sé tem nova e arrumada esplanada e, já de si abençoada pela vizinhança, será decerto um dos pontos de passagem obrigatórios para turistas e para lisboetas em incursão alfamista. Até porque não lhe falta um certo espírito viajante e, portas adentro, ascendência dos clássicos cafés de estar, beber, comer, ler, ouvir musiquinhas e conversar dia fora (manhã, tarde ou noite, que uma das grandes mais-valias do novo poiso é também o horário alargado, quase da alvorada até à madrugada) .

Aberto nos finais de Junho, Cruzes Credo nasce graças a quatro amigos e sócios, já com experiência por outras andanças turísticas mas em estreia nesta coisa de cafés e bares: Tiago, Miguel, Gonçalo e Nana, cidadã japonesa que aqui se aplica nas artes culinárias (mas não se esperem delícias do Japão na ementa, que não as há). A localização privilegiada não passa despercebida e foi assim que Tiago, que vive perto, deu pela disponibilidade desta antiga loja de balanças, cujos interiores, entretanto, estavam muito descaracterizados do pombalino que se deseja. Neste cenário, vai-se desenrolando um ambiente cosmopolita, a que muito ajudam os turistas e passeantes de nacionalidades várias ou a equipa do Cruzes, também de proveniências diversas e muito dada a viajar. Embora naturalmente turístico, por aqui quer acolher-se bem a vizinhança: "Até já pensámos criar um cartão especial para os vizinhos", comenta.

Entre o café e o bar, Tiago até lhe acrescenta uns pozinhos das antigas leitarias". "É difícil definir o conceito", diz. "É uma espécie de leitaria de bairro que fica aberta até tarde" e à noite adquire "um toque de bar", sempre com música ambiente vinda de todo o mundo em tons chill out. Para fundarem o Cruzes Credo, congregaram "influências do Norte da Europa" ou "dos cafés e barzinhos da Argentina, aliás, já de si de influência europeia", tudo adaptado à tradição lusa: "É um bocadinho português e um bocadinho de outros sítios" mas "somos muito patriotas", sorri Tiago. Já o baptismo de Cruzes Credo, longe de expressar algum susto ou receios mais ou menos católicos, não passa apenas de jogo de palavras, que ganha o seu sentido picaresco graças à imponência da vizinha Matriz.

A casa, que foi encontrada descaracterizada com cimentos e afins, foi recuperada recorrendo à tradição e materiais nobres. Em geral, a entrada e o salão conjugam as arcadas com paredes descarnadas, de arcaboiço e pedra à vista sem sombra de rebocos, e paredes de tons roxos. A pedra dá o toque de solidez a toda a área, com o chão revestido a mosaicos clássicos mas em puzzle colorido. Logo à entrada, o balcão de servir, à antiga, e uma parede onde é escrito a giz todo o menu da casa (não há ementas a ir à mesa, portanto escolha logo daqui o que lhe apetece que é mais fácil). No salão principal destacam-se os janelões abertos que prolongam olhares e o espaço para a rua; saliente-se que, apesar de parecerem antigos, são novíssimos (até porque as janelas que havia eram de alumínio). Pelo salão, há mesas e cadeiras de madeira, de linhas escorreitas, feitos à medida para a casa. Entre as peças, também elas muito viajadas e recrutadas aqui e ali, há candeeiros de tecto vindos da Holanda ou uma velha televisão decorativa saída de uma loja de velharias. A atracção-mor são de facto as vistas que as janelas permitem, com a Sé logo ali, mas também há literatura e imprensa pronta a cultivar e a ajudar a passar o tempo. Já a esplanada é simples e mais não se pede: um conjunto de mesas e cadeiras e uma sombra arbórea.

A ementa de propostas é feita à base de itens leves, composta de saladas e sumos naturais mas também com alguns elementos mais substanciais. "Depois de comer um dos nossos hambúrgueres, duvido que alguém consiga comer uma fatia do nosso bolo de chocolate", garante Tiago; "mas há quem consiga", apressa-se logo a desafiar. Embora seja a Nana, japonesa, quem tem mais dotes para a cozinha, a ementa é mesmo de índole europeia e mediterrânea.

Mas nem só de ambiente e ementas se fará o Cruzes Credo - há também planos para albergar eventos vários, incluindo exposições, concertos ou noite animadas por DJ, mas tudo dependendo do "andamento". Realce-se a mais-valia do horário, até pela segurança local, com a garantia de haver refúgio até às duas da manhã.

Entretanto, a velha Sé há-de continuar a receber sangue novo. Aliás, o Cruzes Credo já espera um "irmão" para a Primavera/Verão: um café-restaurante, mesmo ao lado, mais focado numa "comida elaborada", com chefe e carta baseada na cozinha portuguesa mas "bem trabalhada". O conceito será similar, dentro do espírito de abertura café-restaurante: "Se a pessoa quiser comer come, se quiser sentar-se só para uma bebida também pode". Sem sombra de pecado nem obrigações à vista.

Sé-Alfama em alta

Passo a passo, os labirintos Sé-Alfama andam a ganhar vida nova, criando um bloco alternativo ao extenuado Bairro Alto, ao mesmo tempo que mantém clássicos de gabarito. Só pela aprazível e dinâmica rua do Cruzes Credo e sua continuação (Rua São João da Praça), pode ir-se saltitando entre locais tão aconselháveis como o Pois Café (salão de bem-estar cosmopolita e de ascendência austríaca), o respeitável Clube do Fado ou o centenário Lusitano Clube (associação que à terça tem bailes de culto com a Roda de Choro), a amigável cervejaria & restaurante Amigo António ou as fusões do restaurante Viagem de Sabores. Num cotovelo, o sushi, vinhos e DJing do Sushi LLOut/Ultima Sé Bar (Tv. Almargem, 1). Do outro lado da Sé, o espaço café-loja & costura Le Jardin (R. do Barão, 31). Um pouco mais para a frente, a rua serpenteia até ao Kuta Bar (Travessa do Chafariz d''El-Rei, 8). E ainda pelas redondezas a amigável taberna cultural Tejo Bar (Beco do Vigário, 1) ou, já resvés Baixa, o renovado e animado Aguarela (Beco do Arco do Escuro, n.º1) - quase em frente ao colectivo cultural Bacalhoeiro. Alfama dentro, sugere-se a recente "taberna atípica", que serve de bar, taberna e restaurante SuperCaliFragilistic (Remédios, 98, na foto). Já à beira do Panteão/Feira da Ladra, o pequeno mas dinâmico Arcaz Velho (Calçada do Forte, 56). E, entre tudo isto, claro, toda a Alfama fadista. Em termos de grandes espaços, destaque-se que fica por aqui perto o Clube Ferroviário (R. Santa Apolónia, 59), nova estrela das noites alfacinhas.

(Agosto 2010)

Nome
Cruzes Credo Café
Local
Lisboa, Pena, Rua Cruzes da Sé, 29
Telefone
218822296
Horarios
Todos os dias das 08:00 às 02:00
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