Assim que se avista a frente da Sé, avista-se logo a nova estrela das redondezas. Ali, mesmo à entrada da carismática Rua Cruzes da Sé, num edifício que estava mesmo a pedi-las mas que ainda assim há uma década que estava esquecido, está posicionado o novo baluarte da zona, o Cruzes Credo Café, que, acabadinho de chegar, impõe logo o convite para esplanar: ah! pois é, a Sé tem nova e arrumada esplanada e, já de si abençoada pela vizinhança, será decerto um dos pontos de passagem obrigatórios para turistas e para lisboetas em incursão alfamista. Até porque não lhe falta um certo espírito viajante e, portas adentro, ascendência dos clássicos cafés de estar, beber, comer, ler, ouvir musiquinhas e conversar dia fora (manhã, tarde ou noite, que uma das grandes mais-valias do novo poiso é também o horário alargado, quase da alvorada até à madrugada) .
Aberto nos finais de Junho, Cruzes Credo nasce graças a quatro amigos e sócios, já com experiência por outras andanças turísticas mas em estreia nesta coisa de cafés e bares: Tiago, Miguel, Gonçalo e Nana, cidadã japonesa que aqui se aplica nas artes culinárias (mas não se esperem delícias do Japão na ementa, que não as há). A localização privilegiada não passa despercebida e foi assim que Tiago, que vive perto, deu pela disponibilidade desta antiga loja de balanças, cujos interiores, entretanto, estavam muito descaracterizados do pombalino que se deseja. Neste cenário, vai-se desenrolando um ambiente cosmopolita, a que muito ajudam os turistas e passeantes de nacionalidades várias ou a equipa do Cruzes, também de proveniências diversas e muito dada a viajar. Embora naturalmente turístico, por aqui quer acolher-se bem a vizinhança: "Até já pensámos criar um cartão especial para os vizinhos", comenta.
Entre o café e o bar, Tiago até lhe acrescenta uns pozinhos das antigas leitarias". "É difícil definir o conceito", diz. "É uma espécie de leitaria de bairro que fica aberta até tarde" e à noite adquire "um toque de bar", sempre com música ambiente vinda de todo o mundo em tons chill out. Para fundarem o Cruzes Credo, congregaram "influências do Norte da Europa" ou "dos cafés e barzinhos da Argentina, aliás, já de si de influência europeia", tudo adaptado à tradição lusa: "É um bocadinho português e um bocadinho de outros sítios" mas "somos muito patriotas", sorri Tiago. Já o baptismo de Cruzes Credo, longe de expressar algum susto ou receios mais ou menos católicos, não passa apenas de jogo de palavras, que ganha o seu sentido picaresco graças à imponência da vizinha Matriz.
A casa, que foi encontrada descaracterizada com cimentos e afins, foi recuperada recorrendo à tradição e materiais nobres. Em geral, a entrada e o salão conjugam as arcadas com paredes descarnadas, de arcaboiço e pedra à vista sem sombra de rebocos, e paredes de tons roxos. A pedra dá o toque de solidez a toda a área, com o chão revestido a mosaicos clássicos mas em puzzle colorido. Logo à entrada, o balcão de servir, à antiga, e uma parede onde é escrito a giz todo o menu da casa (não há ementas a ir à mesa, portanto escolha logo daqui o que lhe apetece que é mais fácil). No salão principal destacam-se os janelões abertos que prolongam olhares e o espaço para a rua; saliente-se que, apesar de parecerem antigos, são novíssimos (até porque as janelas que havia eram de alumínio). Pelo salão, há mesas e cadeiras de madeira, de linhas escorreitas, feitos à medida para a casa. Entre as peças, também elas muito viajadas e recrutadas aqui e ali, há candeeiros de tecto vindos da Holanda ou uma velha televisão decorativa saída de uma loja de velharias. A atracção-mor são de facto as vistas que as janelas permitem, com a Sé logo ali, mas também há literatura e imprensa pronta a cultivar e a ajudar a passar o tempo. Já a esplanada é simples e mais não se pede: um conjunto de mesas e cadeiras e uma sombra arbórea.
A ementa de propostas é feita à base de itens leves, composta de saladas e sumos naturais mas também com alguns elementos mais substanciais. "Depois de comer um dos nossos hambúrgueres, duvido que alguém consiga comer uma fatia do nosso bolo de chocolate", garante Tiago; "mas há quem consiga", apressa-se logo a desafiar. Embora seja a Nana, japonesa, quem tem mais dotes para a cozinha, a ementa é mesmo de índole europeia e mediterrânea.
Mas nem só de ambiente e ementas se fará o Cruzes Credo - há também planos para albergar eventos vários, incluindo exposições, concertos ou noite animadas por DJ, mas tudo dependendo do "andamento". Realce-se a mais-valia do horário, até pela segurança local, com a garantia de haver refúgio até às duas da manhã.
Entretanto, a velha Sé há-de continuar a receber sangue novo. Aliás, o Cruzes Credo já espera um "irmão" para a Primavera/Verão: um café-restaurante, mesmo ao lado, mais focado numa "comida elaborada", com chefe e carta baseada na cozinha portuguesa mas "bem trabalhada". O conceito será similar, dentro do espírito de abertura café-restaurante: "Se a pessoa quiser comer come, se quiser sentar-se só para uma bebida também pode". Sem sombra de pecado nem obrigações à vista.
Sé-Alfama em alta
Passo a passo, os labirintos Sé-Alfama andam a ganhar vida nova, criando um bloco alternativo ao extenuado Bairro Alto, ao mesmo tempo que mantém clássicos de gabarito. Só pela aprazível e dinâmica rua do Cruzes Credo e sua continuação (Rua São João da Praça), pode ir-se saltitando entre locais tão aconselháveis como o Pois Café (salão de bem-estar cosmopolita e de ascendência austríaca), o respeitável Clube do Fado ou o centenário Lusitano Clube (associação que à terça tem bailes de culto com a Roda de Choro), a amigável cervejaria & restaurante Amigo António ou as fusões do restaurante Viagem de Sabores. Num cotovelo, o sushi, vinhos e DJing do Sushi LLOut/Ultima Sé Bar (Tv. Almargem, 1). Do outro lado da Sé, o espaço café-loja & costura Le Jardin (R. do Barão, 31). Um pouco mais para a frente, a rua serpenteia até ao Kuta Bar (Travessa do Chafariz d''El-Rei, 8). E ainda pelas redondezas a amigável taberna cultural Tejo Bar (Beco do Vigário, 1) ou, já resvés Baixa, o renovado e animado Aguarela (Beco do Arco do Escuro, n.º1) - quase em frente ao colectivo cultural Bacalhoeiro. Alfama dentro, sugere-se a recente "taberna atípica", que serve de bar, taberna e restaurante SuperCaliFragilistic (Remédios, 98, na foto). Já à beira do Panteão/Feira da Ladra, o pequeno mas dinâmico Arcaz Velho (Calçada do Forte, 56). E, entre tudo isto, claro, toda a Alfama fadista. Em termos de grandes espaços, destaque-se que fica por aqui perto o Clube Ferroviário (R. Santa Apolónia, 59), nova estrela das noites alfacinhas.
(Agosto 2010)
- Nome
- Cruzes Credo Café
- Local
- Lisboa, Pena, Rua Cruzes da Sé, 29
- Telefone
- 218822296
- Horarios
- Todos os dias das 08:00 às 02:00