Fugas - restaurantes e bares

Fernando Veludo/Nfactos

A vida é uma festa no More Club

Por Andreia Marques Pereira ,

É exuberante, extravagante, ostensivo - e não se cansa de se ver ao espelho. Vimos o motoqueiro dos Village People e há dança no varão. Também é lounge, mas é ao fim-de-semana que o More Club sai do armário e assume a sua vocação: veste o traje de luzes e embarca numa viagem, para uma terra sem outra preocupação que não seja a animação.
Se não podemos ir a Ibiza, vamos trazer Ibiza até nós. E quem diz Ibiza diz Miami, por exemplo. E o que têm em comum estes locais? Dizem que as festas mais loucas do mundo, a decadência como forma de arte - não como modo de vida, avisa quem conhece, porque há diferença. E agora estamos aqui, na Baixa portuense, a falar de Ibiza, de festas, de loucura - "controlada", sublinha Ricardo Rios. Estamos aqui, no More Club, e, por momentos, parece que há uma espécie de "Ibiza blues" no ar. É uma tarde de semana, o clube abre daqui a umas horas, e quase não reconhecemos o sítio que víramos no fim-de-semana anterior. Agora vemos o espaço, antes tínhamos visto pessoas, muitas, e nem demos pelos sofás alinhados com vista para a rua - e é a Rua das Galerias de Paris, o "olho do furacão" noctívago portuense. "Estão sempre aqui", diz-nos Pedro Rios, gerente do clube e irmão de Ricardo, um dos proprietários. No primeiro andar, no lounge. Sim, hoje parece um lounge, nessa noite, uma pista de dança - onde Lady Gaga passaria (quase) despercebida, quase apostamos: mais uma na multidão de animadores. Voltaremos a eles (e a Ibiza), mas agora vamos ao início.

O início é uma história que ouvimos muitas vezes. Um grupo de amigos e uma ideia. Por que não abrir uma discoteca? "Procurámos espaço, mas não se concretizou", recorda Ricardo. Foi "há seis, sete anos", antes do descobrimento da baixa, portanto, mas já era aqui. "Sempre imaginámos que isto ia acontecer. Devia ser a única cidade europeia de costas voltadas para o centro". Fast-forward. Há um ano, os amigos passeavam pela Baixa e voltou a ideia. Desta vez, encontraram o espaço.

Quem frequenta as "Galerias de Paris" à noite já terá notado. É quase impossível não o fazer. Não há multidões à porta - uma porta dupla, sólida, trabalhada - mas a fachada está iluminada por luzes - tons fortes em brilhos suaves que emanam do edifício como uma aura (são Led - e deles também falaremos depois). Não há multidões, dizíamos, porque o More está aberto à rua mas não está na rua, tudo se passa por detrás das portas do edifício do início de novecentos. De 1907, precisa Ricardo, porque essa não é uma questão de somenos - é uma questão premente. Aqui funcionaram os armazéns Tito Cunha, depois a Galeria Nasoni que há um ano fechava (estas) portas, que abriram novamente no início de Julho para mais um capítulo.

Quatro amigos tornaram-se sócios e proprietários do More Club. Quatro amigos ligados à arquitectura e decoração que aceitaram o desafio de abrir uma discoteca num edifício classificado e em estado de degradação. O resultado pode ser visto em três pisos - entramos e deparamo-nos com as escadas íngremes que levam ao lounge do primeiro andar, mas no rés-do-chão há a "discoteca", que desce ainda até à cave ("o quarto escuro", brinca Ricardo). Por enquanto, porque a escadaria não pára no primeiro andar: vemo-la subir ainda alguns andares sob uma enorme clarabóia - um dia, o More Club há-de subir por aí acima, diz Ricardo, onde as divisões escondem tectos estucados ainda à espera de serem recuperados.

O estuque no lounge está numa das paredes. Não é original, claro, nem existia sequer - foi apenas uma maneira de trazer um pouco da atmosfera da casa para ali. E mostrar ao que vêm estes sócios - querem conservar ao máximo os elementos da casa e por isso veremos rodapés recuperados, colunas preservadas, janelas e portadas restauradas. E por ter esta história, esta decoração que hoje vemos, "uma mistura do clássico com o moderno", sintetiza Pedro. Está em todo o espaço, em diferentes graus e combinações.

Falámos de Miami no início e agora voltamos lá - porque ainda estamos no lounge, que Pedro considera "o espaço mais sofisticado", e há algo de ostensivo, in your face, na decoração (e no próprio símbolo: uma pequeno primata cravejado a diamantes, Swarovski, sublinha Pedro, com um rubi na boca). É branco, espelhado - já falámos dos espelhos? São omnipresentes, é impossível escapar-se-lhes: na escadaria são uma parede; no lounge, outra parede em losangos e outra parede por detrás do DJ, são a cabina do DJ e as mesas; em baixo, são os balcões, novamente a cabina do DJ e uma faixa por detrás desta; mais em baixo são também uma coluna e uma lista no tecto... -, negro e dourado, um pouco roxo e vermelho.

Branco nas paredes, no balcão translúcido que é também tela para os Led, negro na alcatifa, nos sofás de design contemporâneo, num candeeiro de mesa (de ferro), nas pernas lacadas das mesas baixas com tampo de espelhos, dourado nos candeeiros de parede (as lâmpadas imitam chama), nas molduras dos quadros, nos encaixes das cadeiras roxas, vermelho no sofá do canto. Do tecto, de uma estrela espelhada, pende um lustre comprido de cristal. Entre as peças de decoração e mobiliário (algumas originais), vários estilos se combinam, sobretudo dos anos 20 para cá - o resultado é sumptuoso, uma fogueira de excessos.

Na discoteca, o cenário é mais underground, uma espécie de industrial-chic - e falamos em industrial apenas pela cor: negro maculado apenas por prateado. O pé direito impressiona - 5,40 metros "seguros" por colunas esguias que terminam em capitéis trabalhados - e dá espaço para um simulacro de fachada numa das paredes: no rés-do-chão três bares em cada "porta", no "primeiro andar", varandas, onde os animadores fazem o seu trabalho (e têm ainda outro "palco", um mini-mezanino por cima da porta com direito a bola de espelhos que mais parece um globo). Neste espaço amplo, a cabina do DJ é quase um altar e por detrás o santo é um fauno, gigantesca fotografia impressa, quebrada em duas pela intromissão de lista espelhada - é a única cor na decoração do espaço onde não falta cor quando a festa chega e as luzes se acendem.

O preto e o prateado seguem para a cave, que é onde a discoteca vai descansar - a música é a mesma, os decibéis menos. É mais intimista: o espaço é mais pequeno, os tectos mais baixos e tem um sofá quase interminável que faz um U num dos cantos. Há um bar e duas mesas altas.

Claro que já fomos passando por Ibiza. Mas ainda não nos detivemos. Rewind. Sábado à noite, entre a uma e as duas da manhã: o porteiro e recepcionista na entrada, discoteca ainda vazia, escadas acima e duas raparigas em trajes exuberantes (e diminutos) à entrada do lounge - a rebentar pelas costuras. Não é, sabemo-lo agora, pista de dança, mas parecia, e as luzes nas paredes e no balcão (cores que parecem de cocktails atravessadas por faixas verdes e vermelhas) pintam o espaço em ritmo algo frenético. Vemos o motoqueiro dos Village People no meio da pista - confirma-se era "ele", ele e elas e muitos mais que fazem a animação do More. E aqui entra em força Ibiza, "é o mesmo conceito", explica Ricardo, "animação exuberante".

Ainda não tinha aberto e já se falava no More Club. "Vai abrir uma discoteca gay na Rua Galerias de Paris", corria pela noite portuense. "É verdade", ri Ricardo, "primeiro diziam isso, depois abriu e chegaram a dizer o contrário". Que gays não entravam. "Não estamos enquadrados", clarifica Ricardo, "estamos abertos a todos". A extravagância na animação que pode remeter para um universo gay é o motor para o que verdadeiramente interessa - envolver as pessoas num ambiente de festa. Constante e descomplexada. "Uma viagem", diz Pedro - e não é à toa que a pista de dança abre com as boas-vindas e o aviso, "vai iniciar uma viagem".

Festa, sim; clubbing, não. "Não queremos ter DJ diferentes todas as semanas e ter determinado público de acordo com cada um deles", explica Ricardo. Há DJ residentes - Mário Roque na discoteca, Diana Oliveira no lounge - e vontade que as pessoas "venham pela casa, também pela música, mas não exclusivamente atrás deste ou daquele nome". O que importa saber é que aqui a festa acontece todos os fins-de-semana - quando a discoteca abre, o lounge tem um funcionamento mais alargado. "O que está em festa é sempre o More Club".

Referências

Cocktails à medida
No More Club há cocktails tradicionais e há cocktails individuais, talhados à medida dos gostos de cada um - os More cocktails. "O barman fala com as pessoas, percebe o que elas gostam e cria os cocktails". Doces ou ácidos (os preferidos, com vodka, rum, limão...), mais ou menos alcoólicos. São a aposta da casa, mas a oferta é variada e passa por vinho a copo e champanhe - há flutes e há garrafas, entre os 90 e os 800 euros (já foram vendidas várias).

Danças de varão
A animação é um factor distintivo aqui. Os animadores misturam-se entre o público - e não há que enganar, distinguem-se - e têm também os seus palcos, na discoteca. Onde também se fazem danças de varão - no feminino e no masculino. Tudo ao som de música house - na discoteca é santo-e-senha, no lounge permite variações pelo deep house e por sons mais comerciais. Os DJ residentes têm, por vezes, companhia de convidados - não é regra, é a excepção.

(9 Outubro 2010)

Nome
More Club
Local
Porto, Porto, R. das Galerias de Paris, 80
Telefone
222022389
Horarios
Quarta-feira e Quinta-feira das 22:00 às 02:00
Sexta e Sábado das 22:00 às 04:00
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