Embora o título seja claramente usurpado, já que a hierarquia nobiliárquica nunca se aplicou senão às gentes da fidalguia, o grau de conde para este restaurante não deixa de mostrar uma atitude de certa modéstia, o que nestas coisas acaba por constituir sempre um bom augúrio. No Conde do Castelo pratica-se uma cozinha que está mesmo nos antípodas do passado monárquico e senhorial, exibindo um grau de apuro e modernidade, que sempre a elevaria a um patamar superior na passada hierarquia senhorial.
A associação à fortaleza medieval que domina Vila da Feira ajuda, no entanto, à sua localização, uma vez que o restaurante se situa na zona onde se inicia a subida em direcção ao monumento. Entrando na artéria pedonal que conduz à área central da cidade temos, então, logo nos primeiros prédios, à esquerda, este conde vestido de elegante contemporaneidade.
Espaço bem decorado onde predominam os tons de castanho e bege e se destacam os candeeiros com design que pendem sobre as mesas. Sala de dimensões reduzidas, acolhendo à volta de uma dezena de mesas, a ajudar ao ambiente de tendência intimista mas ao mesmo tempo informal, dinâmico e descontraído. Está-se bem!
O aperitivo de boas-vindas, com gin, Porto branco e rodela de pepino, como que nos prepara para a lógica de fusão que domina o conceito gastronómico. A base são os produtos e a gastronomia tradicional, mas a experiência e andanças do chef cozinheiro por outros mundos conferem-lhe a vertente de elegância e sofisticação. Foi exactamente isso que logo revelou umas pequeninas "pataniscas de salmão". O conceito e a técnica das popularíssimas pataniscas de bacalhau aplicadas ao salmão. Finas, fofas e saborosas, na companhia de salmão fumado e frescas folhas de agrião, num conjunto visualmente muito apelativo resultante do cuidadoso e criativo empratamento.
Provou-se também o "carpaccio de novilho com sorbet de vinagre balsâmico", e uma "tempura de camembert com chutney de ameixa", de entre o conjunto de propostas de entradas que incluía ainda "as amêijoas do Conde", "caldo verde", "mozzarella de búfala com pesto e manjericão", "pimentos de Padrão" e "salada de rúcula com parmesão", todas com preços entre a variar entre os 3,5 e os 6,5 euros.
No capítulo dos peixes a opção inicial foi para o "lombo de atum com vinagreta", muito bem preparado e a mostrar o grau de qualidade, critério e técnica culinária. Atum fresco apenas levemente marcado para não lhe alterar as qualidades, arroz basmati a cheirar à origem, pimenta rosa, um leve toque de gengibre, molho de soja e orégãos frescos. O mundo e toda a natureza num prato só, uma vez mais valorizado pelo critério de empratamento.
Centrado nas nossas tradições culinárias, mas igualmente sofisticado na apresentação, é o "bacalhau com migas de broa". Lombo do gramíneo a decompor-se em lascas, com crosta de broa e picado de azeitona, pimento e alho, na companhia de delicadas tiras de feijão verde cozido ao vapor. Bom e bem executado.
Quanto aos pescados, a lista oferecia ainda propostas de como "caril de Madras com gambas", "filete de peixe-galo com arroz negro" ou "filete de robalo com carpaccio de batata e ovas e peixe", variando os preços desta secção entre os oito e os 16 euros.
Quanto às carnes, a carta propõe "magret de pato com laranja e mel", "eisbein (joelho de porco peto com canela)", "vazia de novilho com mostarda velha" ou "coxa de pato com polenta", oscilando os preços entre os mesmos oito e 16 euros. Optou-se pela proposta do dia de "lombo de novilho com foie gras" (16 euros), que acompanhou com delicado tagliateli e couve chinesa. Nota alta, mais uma vez, para o criterioso uso dos produtos, a evidenciar a qualidade e segurança com que se trabalha nesta cozinha e uma feliz tendência para a arte de empratar.
Neste particular, chamou a atenção o vistoso "carpaccio de ananás com calda de coentros", com que se passou à fase de sobremesa. Por curiosidade provaram-se ainda uma "pannacotta de pistácios com mel de acácia" e o "creme brulée de maracujá", todos deixando claro aquilo que era já por demais evidente. Uma cozinha segura e diversificada. Qualidade, critério e respeito pelos ingredientes e mestria no empratamento.
O responsável pela casa, o chef Joaquim Sá, exibe aqui toda a experiência e conhecimento técnico que certamente recolheu nas suas andanças por vários pontos da Europa, anunciando uma cozinha vocacionada para "os saudáveis ingredientes da dieta mediterrânica, em composições modernas da gastronomia tradicional portuguesa". Acrescentaríamos apenas que é a técnica e sabedoria oriental, japonesa muito provavelmente, que confere o plus de equilíbrio que fica evidente naquilo que faz.
Sem ser exaustiva, a carta de vinhos oferece propostas equilibradas abrangendo todas a regiões, notando-se louvável preocupação com a moderação nos preços e a oferta a copo.
Além de solícito e esmerado, o serviço tem também um lado de certa irreverência que faz com que a refeição tenha também uma componente experimental. Rompe com formalismos que só incomodam e cria também a vontade de voltar para novas experiências.
A visita a este Conde do Castelo é, como se vê, uma experiência claramente recomendável, ainda com a vantagem dos preços absolutamente sensatos. Para além da lista, há sempre um conjunto de propostas do dia e, ao jantar das quartas e quintas-feiras, um menu de degustação que é um claro piscar de olho para aqueles que dizem olhar de lado para estas coisas da modernidade culinária. Custa apenas 20,00 euros (sem bebidas) e inclui a refeição completa (couvert, entrada, peixe, carne, sobremesa e café). Deixe-se tentar e vai ver que vale mesmo a pena.
- Nome
- Conde do Castelo
- Local
- Santa Maria da Feira, Feira, Rua Dr. Roberto Alves, 15
- Telefone
- 256388586
- Website
- http://www.condedocastelo.com
- Cozinha
- Portuguesa Contemporânea