A ideia era “começar algo que não havia” em Lisboa: una casa de ron. “Somos venezuelanos. O rum é a nossa bebida, como o vinho é para os portugueses”, conta Oscar Martínez, o responsável pela união de quatro venezuelanos em torno de um projecto em terras lusas, aberto no início de Maio numa rua paralela à Avenida da Liberdade. “Faz parte da nossa cultura na zona das Caraíbas e queremos que as pessoas daqui o conheçam.”
É que o rum, garantem, “é muito mais do que mojitos, piñas coladas e daiquiris”. Também os há — e no início eram até os únicos cocktails da carta, entretanto alargada — mas o destaque vai para uma selecção de runs das quatro origens principais, divididas pelas influências deixadas pelos três países que colonizaram a região das Caraíbas.
O rum francês (produzido sobretudo em Martinica), que “é o único feito directamente do sumo da cana de açúcar [os restantes são criados a partir da fermentação de melaço] e, por isso, tem mais percentagem de álcool, é mais caro e artesanal”; o inglês, que “é mais escuro e normalmente tem especiarias”; e o hispânico, “um bocadinho mais doce”. A quarta categoria é inteiramente dedicada ao rum venezuelano, “o único que tem denominação de origem controlada”, explica Gustavo Pereira, outro dos gerentes.
Atrás do balcão, sobre um pedaço de parede negra, velhas tábuas de madeira vão, por isso, emoldurando garrafas de diferentes tamanhos, feitios e cores. Cada rótulo, um destino. Venezuela é o país mais bem representado, como seria de esperar, mas há rum de Trinidad e Tobago, Jamaica, Colômbia, Guatemala, Inglaterra, Cuba, Porto Rico, Estados Unidos, Martinica, Nicarágua, República Dominicana... até um português, produzido na Madeira. Alguns possuem ainda um travo a flores, outros a café ou a chocolate.
No início tinham “uns 20 runs diferentes, agora já são cerca de 30”, calcula Gustavo, contando por alto os frascos nas prateleiras. “Ainda falta muita coisa”, remata. “Há cerca de 500 marcas no mundo inteiro, cada uma com seis ou sete tipos de rum. É muito. Precisávamos de uma loja do tamanho do Continente para ter tudo”, ri-se Oscar. A Ronería, se fosse medida na escala das superfícies comerciais, estaria, no entanto, mais para uma mercearia de bairro.
É um“espaço pequenino”, com assentos para umas dez pessoas, cabem pouco mais que outras tantas em pé. As paredes, forradas a placas de madeira, lembram as barricas onde a bebida envelhece, etapa fulcral da produção e que divide os diferentes tipos de rum. Até aos cinco anos de estágio em pipas de carvalho é considerado añejo (velho), entre cinco e oito anos entra na categoria de oro (ouro) e a partir daí integra a secção premium, que “originalmente não se aplicava ao rum, mas que agora começa a surgir”, indica Gustavo.
O “mais velho” que existe na Ronería é o Zacapa, produzido na Guatemala e com 23 anos em barrica. Como a lógica é mais ou menos a do whisky — “quanto mais velho melhor e mais puro se deve beber” —, “este rum tem de se beber sozinho”. “Não vou deixar de outra maneira”, sentencia Gustavo. Os de ouro “ainda dão com gelo ou água [também é possível adicionar água gaseificada ou Coca-Cola], mas já começas a estragar”, defende, relembrando que a forma típica de tomar ron é puro. A excepção é feita para os licores com menos anos de envelhecimento, geralmente mais claros, que são utilizados nos cocktails.
Esta variedade e adaptabilidade da bebida dá-lhes “o melhor dos dois mundos”, defendem. Tanto que na Ronería “não é preciso ter outra coisa”. Não há whisky, gin ou vodka e cedências só mesmo para vinho e cerveja, “porque em Lisboa tem de ser”, e para a cachaça, “porque também é feita com cana de açúcar”. Até a ginjinha — que os próprios responsáveis produziram, guardada num largo frasco de vidro — é feita com o licor caribenho. A receita “é segredo”. “Só posso dizer que esta tem oito tipos de rum e mais de dez meses”, revela Gustavo.
O cocktail da casa, Cuyagua, também é uma adaptação da típica venezuelana guarapita, feita com maracujá e rum (em vez de aguardente de cana). No entanto, na Ronería pretendem “ser um bocadinho rigorosos”, com receitas o mais aproximadas possível ao original. “Por exemplo, em Portugal o mojito faz-se com açúcar amarelo e hortelã, mas originalmente utiliza-se açúcar branco e hierbabuena, por isso sempre que possível vamos usar estes ingredientes”, diz Gustavo. “Não queremos que se torne a bebida da moda. Queremos educar e promover o rum como deve ser feito para que se torne bem visto e apreciado em Portugal.”
Para já, parece é que não há como dissociá-lo de piratas e marinheiros, a História longamente exaltada em romances e filmes (quem se esquece da Ilha do Tesouro ou das aventuras de Jack Sparrow?). Alguns móveis de ar antigo e gasto até fazem embarcar memórias neste universo — “parece que os portugueses gostam desta ligação, por isso há que pôr alguma coisa de piratas”, avança Gustavo. Até lá, sobressaem duas máscaras coloridas das festas religiosas dos diablos danzantes de Yare (cidade venezuelana) e a música, sempre latina e caribenha.
“Queremos que venham beber um rum, ouvir salsa, bailar un poquito si quiera”, diz Oscar. “A ideia é que quando entrem aqui sintam que não estão em Lisboa, mas numa parte do Caribe”. Portanto, há que mergulhar no mundo tropical do rum e, como se lê nos pequenos copos de barro venezuelanos, echate un palito: “Bebe [mais] um copito”.
- Nome
- Ronería
- Local
- Lisboa, São José, Rua de São José, 43
- Telefone
- 960014904
- Horarios
- Segunda-feira, Terça-feira, Quarta-feira e Quinta-feira das 17:00 às 00:00
Sexta-feira e Sábado das 17:00 às 02:00
- Website
- https://www.facebook.com/ronerialx?_rdr