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O gelato italiano chega ao Porto com sabor a Norte

Por Cristiana Faria Moreira e Margarida David Cardoso ,

Duas arquitectas trocaram os esboços pela alquimia do gelado italiano. Agora no Porto há um autêntico laboratório de sabores onde toda a arte é criada sob o olhar do público.

No início da Rua do Bonjardim, a dois passos do Rivoli, há uma casa nova para os amantes de gelado — longe de ser um gelado qualquer. Aos sabores e produtos portugueses, duas amigas juntaram a técnica dos gelatieris italianos. É esta a proposta da Gelataria Portuense, que abriu as portas há quase duas semanas.

A ideia partiu de duas arquitectas. Ana Ferreira e Ana Gonçalves faziam um percurso profissional que dizem “normal”: o curso, trabalharam na área e seguiram por ali fora, a tentar evoluir na carreira. “Só que eu tenho 40, a Ana tem 45 e parece que de repente decidimos mudar de vida”, diz Ana Ferreira. Uma “certa altura” tornou-se na “altura certa” para partirem para Itália à procura do segredo de verdadeiro gelado italiano: dizem que o descobriram em Bolonha, naquela que foi a cidade-casa de Ana Ferreira quando esteve num programa de mobilidade Erasmus.

Hoje, para além de diplomadas em arquitectura, carregam o canudo e a arte de serem chefs gelatieris.

“Eu andava todos os dias a pensar que tinha de fazer alguma coisa diferente, alguma coisa que gostasse e que fosse para o resto dos meus dias.” Um dia — até lhe dizem que teve uma epifania — lembrou-se de que “não havia gelados italianos no Porto.” Apesar de a ideia não ser verdadeira — há de facto algumas gelatarias italianas na cidade —, Ana não desistiu e chamou a colega de profissão, Ana Gonçalves, para uma demanda pelo mundo dos chefs e da verdadeira culinária por detrás da gelataria italiana. 

Estudaram o mercado português e italiano, bebendo das influências do que viam e provavam. Acabaram por descobrir a peça essencial que faz os gelados que hoje servem aos portuenses: a máquina Effe da Cattabriga, inventada em 1927 pelo manufactureiro de gelados, o italiano Otello Cattabriga. 

Na verdade, apesar de ser uma máquina, é ela que faz com que estes sejam dos gelados mais artesanais da cidade. E que permite que o gelado produzido seja “muito suave e muito macio” e “claramente mais denso”, como é comum na gelataria italiana.

Um gelado que carrega o selo de ter “muita, muita qualidade”, querendo contrastar com aqueles “gelados em que só se mistura o pó com água ou leite”. Esta é, pelo contrário, uma receita com muita química envolvida: “Estudamos a arte da química, a ligação das moléculas, a hidratação da proteína e toda essa parte da química do gelado que permite que ele seja diferente e que tenha outro sabor e outra textura na boca.”

Foi assim que conseguiram juntar o vinho do Porto a um puré de pêra e nozes caramelizadas e transformar um chá verde Matcha com chocolate branco e framboesa. A alquimia chega mesmo aos sabores clássicos do figo com requeijão de ovelha e mel.

Um processo complexo a que qualquer pessoa pode assistir, pois é por trás do balcão que está outro dos segredos deste espaço: os clientes podem assistir à alquimia da transformação de fruta, chocolate, chá ou vinho num denso e cremoso gelado, retirado com uma “pá como se fosse o padeiro”, brinca Ana Ferreira. 

Gelataria laboratório

O grande desafio que se colocava às duas arquitectas era o de fazer diferenciar o seu produto perante as dezenas de gelatarias que foram aparecendo na cidade nos últimos anos. Para isso, foi preciso “trazer o chef de culinária ao gelado”. E, para Ana Ferreira, o jogo de proporções entre sabores e a utilização de “ingredientes verdadeiros”, sem serem pré-preparados, são os elementos diferenciadores dos gelados servidos neste espaço.

A aposta das duas arquitectas passa também por desmistificar a ideia de que o gelado é uma guloseima e de que é muito calórico. “O gelado italiano não é bem assim”, nota Ana. “Um gelado industrial tem 20 ou 30% de gordura. Um gelado italiano tem, no máximo, 10%. Não é um produto assim tão mau quanto isso. Aliás, em Itália, até é considerado um produto extremamente nutricional”, explica.

A produção é adaptada consoante os produtos e as frutas da época, para que o gelado seja sempre produzido a partir de ingredientes naturais. “Queremos ter sabores que sejam de cá, frutas portuguesas, de preferência o mais perto possível, de produtores locais para ir directamente à origem. O nosso mirtilo é biológico do Douro”, explica a arquitecta.

A Gelataria Portuense oferece 22 sabores. Seis deles são “de colecção”, por serem criados pela casa e variarem consoante os produtos que certa estação do ano dá. A cozinha é uma autêntica sala de experiências de sabores que valem a este espaço o título de “gelataria laboratório.”

Para os indecisos que se deparam com a difícil tarefa de escolher um só sabor de gelado, a gelataria criou um menu de degustação, em doses mais pequenas para que se possam experimentar vários sabores.

As duas arquitectas apostaram também em produtos aptos para veganos e para celíacos. O gelado será servido acompanhado com a informação nutricional e com a descrição dos ingredientes. “Queremos dizer às pessoas aquilo que elas estão a comer”, refere Ana Ferreira.

Para além de recorrerem aos produtos portugueses, as arquitectas admitem que têm recorrido a produtos italianos “porque o mercado do gelado ainda não está muito desenvolvido, por isso não há concorrência”. Os cones, por exemplo, chegam de Itália.

Como os gelados são feitos com produtos naturais, a durabilidade é mais reduzida. Para escoar a produção do dia, a gelataria tem, entre as 18h e as 21h, a happy hour, período durante o qual é oferecido um desconto de 25% a quem for buscar gelado para levar para casa. 

E se o gelado é também um produto muito associado ao Verão, o objectivo das duas arquitectas é que o produto comece a ser mais consumido durante o Inverno e que as pessoas ganhem o hábito de ir à gelataria comprá-lo para levar para casa, o que acontece muito com os gelados que se vendem nos supermercados.

Apesar da “invasão” de turistas que a cidade sofre nesta altura, Ana Ferreira quer ter “a gelataria para as pessoas de cá”, um local onde os portuenses possam voltar sempre que quiserem um gelado.

Texto editado por Sandra Silva Costa

Nome
Gelataria Portuense
Local
Porto, Santo Ildefonso, Rua do Bonjardim,136
Telefone
222 423 223
Horarios
Domingo, Segunda-feira, Terça-feira e Quarta-feira das 11:00 às 21:00
Quinta-feira, Sexta-feira e Sábado das 11:00 às 00:00
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