É rodeado de Virtudes que está o restaurante Árvore. Não só as da toponímica, que vão da alameda ao passeio e jardim, mas também as relativas ao enquadramento que fazem do lugar um dos recantos mais atractivos e encantadores da zona histórica do Porto. Por dentro, há também as muitas virtudes que destacam uma boa cozinha associada a produtos e sabores transmontanos, a par de alguns pequenos pecados.
É nas instalações da Cooperativa Árvore que se acolhe o restaurante. Ocupa parte dos antigos armazéns do piso inferior do edifício, ao qual foi acoplada uma sala envidraçada com amplas e virtuosas vistas sobre o rio Douro, Gaia e o edifício da Alfândega. Um dos atractivos é o jardim envolvente que recebe o bar e esplanada que se abrigam sob o arvoredo centenário e aproveitam também os românticos bancos de namorados do muro de granito.
Para lá da vista ímpar e da carga histórica e patrimonial, o cenário torna-se quase idílico com a panorâmica do Jardim das Virtudes que se desenvolve encosta abaixo e em sucessivos socalcos. Com o afluxo de turistas, há muito que deixou de ser um dos segredos mais preservados da cidade, mas mantém, mesmo assim, a original envolvência natural e contemplativa.
A par da criação e divulgação artística, o projecto da Árvore procura a implicação social, as dinâmicas culturais e criação de públicos cada vez mais alargados. É neste contexto que surge a abertura do restaurante, uma velha aspiração concretizada há um ano. A exploração do espaço está ligada ao restaurante Boa Cêpa, de Valpaços, que aqui procura replicar a boa cozinha com produtos e receitas de raiz transmontana com apontamentos de elegância e modernidade.
Há a posta de vitela, o cabrito no forno e, até, em circunstâncias especiais, os tradicionais milhos transmontanos. Aos sábados é dia de cabrito e bacalhaus, mas a carta propõe a vitela assada na púcara, o polvo confitado em azeite ou o bacalhau no forno com presunto e crosta de broa. A par da carta existe também de segunda a sexta o “menu executivo”, propondo refeição completa por 8,50€.
Instalados na esplanada e a olhar o Douro avançamos pelas “entradas” com a salada Árvore (12€) e outra de bacalhau incluída no menu económico do dia. Muito completa a primeira, com rolinhos de presunto (salgadote), bolinhas de queijo mozzarela, nozes, alfaces e cebola, que se temperou com o excelente azeite premium da Cooperativa de Valpaços. Um petisco à moda da aldeia a segunda, com o bacalhau esfiado, cebola picada e bom azeite.
Na secção de “peixes” — que, em boa verdade, pelo menos frescos, não constam — oferece-se bacalhau, polvo, gambas em espetada, e uns pouco canónicos “linguini com frutos do mar” e “paella marinheira”, com preços por dose que variam entre os 16 e 20 euros. Em boa hora se convocaram os filetes de bacalhau com açorda do mesmo (16€), de primorosa e apurada confecção. Caldo gelatinoso e o aroma fresco dos coentros a envolver o pão rústico, tudo saboroso, apetitoso e em equilíbrio. Filetes escorridos com a capa de ovo e farinha a envolver o bacalhau limpo de pele e espinhas e a decompor-se em saborosas lascas. Muito bem demolhado, temperado e cozinhado.
Provou-se depois o polvo à lagareiro (outros dos pratos do menu executivo do dia), em dose generosa, com saborosa batata a murro, pimentos e cebola. Sabores afinados, produto de boa qualidade e servido em recipiente elegante.
Nas “carnes”, a opção foi para o “naco de vitela laminado” (17€), que igualmente deixou prazer e satisfação. Carne macia, rosada e suculenta a denunciar a boa origem, que acompanhou com legumes salteados e apetitosas batatas (aos gomos) salteadas em azeite e nacos de bacon. Acompanha também com três molhos (mostarda, queijo serra e três pimentas), que se dispensaram. Há quem goste, mas se a carne é boa e saborosa para quê esconder-lhe o gosto?
As propostas cárnicas estendem-se à posta de vitela grelhada com azeite, rosbife (com batata palha e esparregado), vitela assada na púcara, espetada terra e mar (lombinhos de porco e gambas), coxa de frango de caril com arroz e ervilhas. Os preços variam entre 14 e 22€.
É alargada a lista de sobremesas, se bem que com as doces trivialidades e a quase ausência de confecção própria. Além do agradável bolo de bolacha (3,80€) de confecção industrial, houve a felicidade de provar o brownie de chocolate (4€) com frutos secos e molho de frutos vermelhos, a mostrar que bem se justificaria a aposta na confecção caseira, mesmo reduzindo à oferta.
Nos vinhos parece haver uma aposta na origem transmontana (texto ao lado), mas a diversidade parece não conseguir ultrapassar o Douro. Além das duas regiões, há apenas uma referência do Alentejo e quatro dos Vinhos Verdes. O lugar, o contexto e a cozinha pediam claramente mais.
Outro dos pecados deste alargado contexto de virtudes é o que respeita ao serviço. E isto não é um pormenor, principalmente quando estamos num espaço que vale também pelo lugar, a envolvência e o espírito (e propósito) da instituição onde se insere. Há uma boa cozinha, mas a boa restauração não se esgota na culinária e todo o potencial para um momento de prazer e satisfação pode facilmente virar pesadelo.
Nascido da vontade de artistas e intelectuais para a produção e difusão artística, o espaço Árvore é galeria, loja e sala de exposições, tudo implicando que o restaurante contribua também para esse ambiente de fruição e prazer. Pequenos pecados não ofuscam as muitas virtudes.
- Nome
- Restaurante Árvore
- Local
- Porto, Miragaia, Rua Azevedo Albuquerque, 1 (Cooperativa Árvore)
- Telefone
- 919544881
- Horarios
- Segunda-feira, Terça-feira, Quarta-feira, Quinta-feira, Sexta-feira e Sábado das 12:00 às 15:00
Segunda-feira, Terça-feira, Quarta-feira, Quinta-feira, Sexta-feira e Sábado das 19:00 às 23:00
- Website
- https://www.facebook.com/restaurantearvore
- Cozinha
- Portuguesa