Fugas - restaurantes e bares

  • Nelson Garrido
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Café-bar literário numa casa da cultura

Por Andreia Marques Pereira ,

ACASADABOAVISTA, no Porto, é muita coisa, mas não é fácil de definir. O Chiado Café Literário é parte integrante do projecto, onde se desenvolvem actividades que vão desde workshops para crianças a jantares temáticos, exposições, concertos e, claro, apresentações de livros — da Chiado e não só.

Entra-se como se se entrasse numa casa, mas não numa casa qualquer. Uma casa da alta burguesia, erudita, boémia, lúdica, até. ACASADABOAVISTA é muita coisa, mas não é fácil de definir. Talvez possamos começar a simplificar, dizendo que uma das coisas que é, é o Chiado Café Literário, a sua grande âncora. Mas tem muitos mais fôlegos. Só a própria casa vale uma visita quase museológica, valendo-se da arquitectura quase intocada de inícios do século XX (1901), com estuques e pinturas murais e de tecto, a que os novos locatários acrescentaram mobiliário a condizer. Por isso, siga-se Fernando Pessoa, cuja estátua a emergir de livros está à porta (e já foi confundida com uma de Joyce), entre-se, visite-se, sente-se. A casa é para todos e aqui vive cultura, no seu sentido mais lato.

Depois de anos fechada, a casa de fachada revestida a granito no rés-de-chão (elevado) e janelas com voltas mouriscas foi o local perfeito para Luís Pires e Sofia Pinto concretizarem o “desejo de ter uma livraria que associasse café, bar e, eventualmente, gatos”, explica Luís. O único gato que vemos é de pano e está numa cadeira de crianças antiga, madeira escura, porque a legislação é exigente e não foi possível concretizar essa vontade.

E, entretanto, a ideia inicial mudou quando a Chiado Editora abriu o Chiado Clube Literário & Bar em Lisboa. Luís Pires, que é representante da editora no Porto, decidiu lançar o desafio aos responsáveis para se abrir algo semelhante no Porto. E como não queriam ficar “amarrados”, digamos, a uma marca e às actividades que ela desenvolve decidiram criar o “chapéu” de ACASADABOAVISTA: o Chiado Café Literário é parte integrante da casa onde se desenvolvem actividades que vão desde workshops para crianças a jantares temáticos, exposições, concertos e, claro, apresentações de livros — da Chiado e não só.

Os concertos mais intimistas acontecem na sala do café literário. Um ou dois músicos apenas, porque o espaço não dá para mais. É acolhedor, um quadrado flanqueado por janela alta e duas portas-janelas — acesso à varanda e à esplanada traseiras —, com lambril alto a toda a volta e a parede pintada de verde tão verde que há confusão com o pano das mesas de bilhar. O topo do lambril forma prateleiras que, claro, se enchem de livros (os que estão em pé são novos, os deitados são usados mas podem ser vendidos), que, aliás, parecem preencher todas as reentrâncias da sala, que se enche de mesa redondas de madeira e sofás — o balcão fica noutra sala, umbilicalmente ligada a esta por uma porta larga de vidro, sempre aberta, no mais puro estilo Art Déco, a imagem gráfica da casa.

Todo o mobiliário foi resultado do afã de busca por todo o país pelas peças certas — e aqui foi Sofia que liderou, já que o mobiliário antigo e a roupa vintage são as suas paixões, que encontram mais espaço aqui na casa — e de transformações: o balcão do bar, por exemplo, era um antigo livreiro. 

De dentro do balcão não saem só bebidas (lista bem nutrida), saem também petiscos, dos quais se destacam os hambúrgueres, cinco (incluindo um sem pão e carne). Fazem parte da carta do Chiado Café Literário com algumas adições locais, como a francesinha, e surpresas como o vinho da casa, o Chiado Editora, vinho alentejano com Fernando Pessoa na imagem e nas palavras: no rótulo “Boa é a vida, mas melhor é o vinho”, em cada uma um poema diferente.

E se fomos ao café-bar logo de início foi porque avançamos a casa partida, que é o balcão da livraria — feito de livros como é usual na Chiado Editora —, mal passamos a porta principal, depois do vestíbulo onde se destaca pintura de 1911. O balcão é, digamos, o hub da casa, porque ACASADABOAVISTA não deixa compartimento por ocupar.

Aqui no rés-do-chão, além do café, temos a sala da livraria, voltada à rua: estantes de pinho claro, para interferir pouco com a arquitectura, carregadas de livros, mas decoradas com objectos vintage, como máquinas de escrever, de slides, de filmar, por exemplo — e uma banheira antiga feita sofá; e logo ao lado a sala infantil, com livros, legos, bonecas, que é também uma espécie de sala de jogos retro, já que a televisão está ligada a um Atari, um Nintendo antigo — em exposição está um Spectrum, por exemplo: pais e filhos, miúdos e graúdos aqui se entretêm a jogar neste regresso aos anos 1980. Outra sala preenche ainda o rés-do-chão, onde se encontram peças de vários artistas, merchandising da Chiado Editora e da própria casa, legos, camisas de senhora de uma estilista portuense e até tapeçarias orientais — tudo para venda.

Subimos ao primeiro andar novamente seguidos por obras de arte para venda e com as palavras de Pessoa que resumem o processo de nascimento deste projecto (“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”), para mais uma série de salas que se percorrem quase em circuito. A sala Pessoa é o antigo salão nobre e é o local de apresentações de livros (e de workshops infantis), abre para a sala de exposições temporárias, com um sofá que é um recanto já procurado para leituras, estudos e até reuniões, que abre para a sala “rosa”, por agora a das tapeçarias — no futuro será um “nails bar” e o canto da roupa vintage (o armário já lá está).

De regresso ao corredor para entrar na sala Florbela Espanca, um quadro da pintora está num canto, uma mesa no centro — esta é a sala de autógrafos — que abre para uma sala de apoio, com um pequeno bar “ondulado” e saída para um terraço com vista para o pátio-esplanada.

Aberta em Julho – o fim-de-semana de abertura culminou com o visionamento da final do Europeu de Futebol – ACASADABOAVISTA já viu por aqui passarem os Tindersticks, antes e depois do concerto que deram na Casa da Música. Eles limitaram-se a tomar cervejas e assistir ao concerto na esplanada, outros entram e querem conhecer os recantos à casa e, então, Luís e Sofia vêem-se no inesperado papel de guias turísticos. Quem quer, anda livre por aqui e encontra o seu recanto tranquilo (ou não).

A partir de agora há é uma maior sistematização de eventos. Assim, além da hora do conto todos os domingos às 12h, dos fins-de-semana literários (apresentações e lançamentos) e da música ao vivo ao sábado (hoje acústica, tributo aos músicos que morreram em 2016), a primeira sexta-feira do mês vai trazer jantares temáticos e a primeira quinta-feira tertúlias poéticas. Claro que a ordem pode ser subvertida e até pode voltar a acontecer uma noite como aquela que começou com jantar poético, passou por concertos rock na cave e terminou com DJ no café transformado em pista de dança. Basta estar atento, e ACASADABOAVISTA pode surpreender. 

Nome
ACASADABOAVISTA
Local
Porto, Aldoar, Av. da Boavista, 919
Telefone
966 828 916
Horarios
Terça-feira, Quarta-feira, Quinta-feira e Sexta-feira das 12:00 às 00:00
e Sábado das 11:00 às 00:00
e Domingo das 11:00 às 22:00
Website
www.facebook.com/acasadaboavista
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