Fugas - restaurantes e bares

  • Adriano Miranda
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António Carvalho, um verdadeiro senhor dos fogões

Por José Augusto Moreira ,

A costela de boi fica oito horas no bafo do calor, o cabritinho sai suculento do forno, carnes e peixes têm trato exemplar. Tudo pela arte de um cozinheiro que faz da profissão um sacerdócio de sabores.

Nas terras de Felgueiras destacam-se a antiguidade e riqueza arquitectónica do mosteiro de Pombeiro, os exímios bordados ou rendas de filé, o pão-de-ló de Margaride e, na história mais recente, a indústria do calçado. Domina a cidade o monte de Santa Quitéria, onde entre romagens, romarias e folguedos se destacou o restaurante com o mesmo nome, em boa parte pelos seus deliciosos e substanciosos assados de cabrito.

Local de romagem gastronómica foi também durante muito tempo a Pensão Albano, cuja excelência acabou por não resistir à mudança geracional, mas não muito longe do centro da cidade está o Restaurante Brasão, que bem honra a história e pergaminhos da boa cozinha local. 

E se nestas coisas se costuma dizer que não há coincidências, diga-se que o Brasão é obra e arte do mesmo homem que deu vida e fez crescer o restaurante de Santa Quitéria: António Carvalho, um verdadeiro senhor dos fogões. E nem é preciso esperar pelo tal cabritinho, que o ritmo, variedade, critério e qualidade daquilo que vai colocando sobre a mesa depressa deixam ver que por ali não respira a banalidade.

Não é coisa complicada chegar até Refontoura, mas é avisado que não nos fiemos por completo nos instrumentos de orientação digital. Há versões que parecem levar mesmo à letra as tendências modernas da pós-verdade, encaminhando-nos para bem longe e na direcção oposta. Siga-se, então, em direcção à Lixa, e numa das rotundas da via rápida que fazem a ligação à A11 logo se destaca a igreja matriz de Várzea. É seguir por aí e andar uns dois quilómetros até encontrar, à esquerda, o placard que sinaliza a moradia onde está o Brasão.

Por estes dias a sala beneficia de obras, funcionando o restaurante num espaço mais pequeno mas mesmo assim habilitado a receber cómoda e desafogadamente 40 a 50 comensais. Toalhas e guardanapos em algodão branco, baixela adequada e serviço atento e despachado a cargo de duas jovens com evidente sentido da função. 

Com a carta, logo chega uma tábua com dois nacos de queijo, de vaca e serra curado. Depois, prato com fatias laminadas de “presunto de lavrador” (um tanto tomado do sal) e cestinho de pão com três variedades: milho, mistura e saborosas fatias do raro pão-de-quatro, tipo Favaios. Por aqui logo fica claro que o critério e qualidade na escolha daquilo que se põe sobre a mesa são mesmo levados a sério.

O desfile prossegue com umas mini-pizzas, ainda a cheirar a forno e coroadas com cogumelos, orégão e chouriço de pimentão. Uma gulodice! Ao mesmo ritmo vão pousar ainda na mesa estaladiços folhados de alheira e uma espécie de rolo de pão recheado com salada de legumes e juliana e maionese. Aquele aroma e calor de pão saído do forno com o frescor dos legumes em sequência. Uma delícia! 

Apetecia deixar andar nesta onda petisqueira — sempre do forno, note-se — mas o cozinheiro tinha já pronta a “sopa de garoupa” (12,50€) que se convocara para início de refeição. Caldo com refogado puxado, pimentos, cebola, coentros, postas inteiras do peixe, ovo escalfado e massinha de cotovelo. Mais que um caldo, uma saborosa e competente massada que é verdadeiro prato de substância. 

Avançamos para o “bacalhau à Brasão” (10/16€, consoante meia ou dose inteira), receita que os quadros expostos indicam ter sido premiada com ouro no concurso “Revolta do Bacalhau”. Posta completa confitada em azeite, que vai ao forno com puré e um refogado de cebola e pimento vermelho. Bacalhau de cura amarela, demolha e confecção rigorosa na linha da melhor tradição dos bacalhaus de forno. Percebe-se a justiça do prémio.

Reincidimos no pescado curado para provar o “bacalhau no pão tradicional” (10/18€). Apenas as lascas do lombo, limpas e douradas, cebola e pimentos confitados, grelos salteados e uma boa dose de coentros frescos a fazer o recheio do pão, que vai ao forno e volta crocante, engordurado e saboroso. Texturas e sabores definidos, aroma fresco do coentro, gordura e crocância. Belo prato! 

No “cabrito assado no forno” (12,50/20€), o bichinho de leite é disposto em travessa,louro e tostado. Só há ao sábado à noite e domingo, sendo necessária encomenda nos outros dias. É trinchado transversalmente, de forma a manter a estrutura esquelética, enquadrado por dois ramos de alecrim e regado com molho do assado. Imaculada a assadura, carnes húmidas e crocantes a descolar completamente do osso. Acompanha com arroz do forno (em alguidar de barro que vem à mesa), legumes e grelos salteados. Um irresistível hino à cozinha tradicional.

Para abreviar, diga-se que é também uma delícia a “carne e vitela na brasa” (20€, duas pessoas), rosada, cheirosa e aveludada, e que ficamos com água na boca pela descrição da “costela de boi no bafo”, que há à quarta-feira e necessita de encomenda de véspera nos outros dias. É que precisa de assar em brasas mornas (no bafo do calor) durante oito horas, como carinhosamente explicou o mestre António Carvalho.

A proposta de peixes e carnes é alargada, há polvo e bacalhaus vários onde dominam as preparações no forno. Sobremesas igualmente irresistíveis com base na doçaria tradicional.

Destaque também para a carta de vinhos. Várias vezes premiada como “a melhor dos vinhos verdes”, tem também oferta substanciosa para o Douro, Alentejo e outras regiões. Com base em bons vinhos e preços sensatos e fugindo à tentação dos caros e famosos. 

O Brasão é uma fortaleza da boa cozinha tradicional e a sua essência está no proprietário/cozinheiro. Mais que verdadeiro mestre dos fogões, António Carvalho faz da profissão um sacerdócio dedicado aos sabores. E é, acima de tudo, um adorável anfitrião. 

Nome
Restaurante Brasão
Local
Felgueiras, Refontoura, Rua da Liberdade, 4082
Telefone
255 336 118
Horarios
Todos os dias
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