Seria um exagero dizer-se que há chocolate por todo lado mas a evocação é permanente, da decoração às peças de mobiliário que imitam as tabletes. Sim, a temática do chocolate domina o ambiente e isso é uma vantagem uma vez que se trata de um conceito bem concebido e executado, de forma a manter viva a memória histórica do espaço.
No coração de Viana do Castelo, a antiga Fábrica de Chocolates A Vianense deu lugar há quase três anos a um hotel moderno e aconchegado, cujo restaurante pratica uma cozinha a condizer. Ou seja, é moderna e bem apresentada, mas com base em receitas locais e produtos de temporada e de mercado, preparadas com competência e alguns pontos de criatividade.
Neste aspecto, destaca-se a introdução do cacau como ingrediente na maioria dos pratos, que mesmo que pouco ou nada acrescente, tem a vantagem de não os desvirtuar e manter a temática chocolateira em todas as dimensões do funcionamento da unidade.
O restaurante, mesmo assim, tem funcionamento autónomo, com porta voltada à rua e ambiente acolhedor. Mobiliário e decoração de recorte moderno e depurado, linhas e estética simples, sobressaindo o longo banco e luminosidade que entra pelo janelão que o acompanha a todo o comprimento da sala.
Toalhetes de linho de tons escuros atravessados nas mesas, como é agora de moda, baixela elegante e serviço simpático e eficiente a cargo de jovens que evidenciam formação especifica. A marcar a diferença na cidade e nem só pelo chocolate.
Não sendo extensa, a lista oferece variedade de opções, com oito entradas e dois cremes de vegetais, seis propostas para peixes e outras tantas para carnes onde se inclui uma “cabidela de frango com chocolate”, que, pelos vistos, vai fazendo sucesso. Nas sobremesas domina, claro, o chocolate em dez combinações, e há também saladas várias e menu infantil com hambúrgueres e esparguete.
Carta de vinhos de vocação igualmente contida, com evidente preocupação de preços sensatos e de cobertura, mesmo que mínima, das regiões mais procuradas. Mesmo assim, a permitir opções adequadas, como ficou evidente com o Alvarinho Deu-La-Deu, de Monção e Melgaço, e o Dão tinto Álvaro de Castro, 12€, cada em excelente relação qualidade/preço.
Antes dos pedidos chega à mesa uma tacinha com azeite e manteiga das Marinhas em pequenas porções, uma delicadeza saborosa, e é servido pão branco e de cereais. Um couvert que não veio reflectido na conta final, uma raridade que se regista.
Para entrantes, pediram-se “ovas de peixe com vinagrete e grué em crumble de broa com bacalhau macerado” (6,30€), o “escabeche de orelheira e pernil, feijão branco e molho de tomate” (6,50€), e as “vieiras braseadas com favas estufadas, grué, ovo escalfado e cogumelos” (9,30€). Saboroso efeito de sabores rústicos com a broa e o granulado das ovas, e bem interessantes também os pedacinhos crocantes de orelheira servidos em doses bem generosas. O mesmo em relação à porção de vieiras, com três exemplares de tamanho médio e correcto trato culinário.Há também “migas esturricadas com puré de cacau e ovo escalfado”, “sardinhas de escabeche em tostas, com verde e mostarda, requeijão e cacau”, e “pataniscas de bacalhau com puré de grão-de-bico e grué”. Ou seja, produtos e receitas típicas da região com toque criativo e enriquecedor.
Nos peixes, a carta inclui “peixe do dia com beterraba e nabo em cama de puré de batata-doce” que, numa segunda-feira ao jantar, não estava disponível. Em boa hora se convocou o “salmonete com açorda de marisco” (17,25€), filetado, suculento e cozedura uniforme e saborosa açorda onde se identificavam camarões e mexilhões.
Evidente competência culinária também no “lombinho de bacalhau e migas” (17,50€), que eram de grelos e estavam de maravilha na sua envolvência com a broa e cubinhos de azeitona fritos. Destoou claramente o polvo (16,75€), rijo e encortiçado, se bem que nada se possa dizer em desabono do seu complemento com “aveludado de espinafres com tapenade de azeitonas e crosta de pimentos”. A oferta inclui também “salmão com ratatouille de legumes” e “naco de atum com ceviche de camarão e feijão-frade”, que não soa nada mal.
Nas carnes, competente o “naco do lombo com batata loura, legumes e molho de cacau” (19,95€), que inclui tirinhas de couve-galega (tipo caldo verde) salteadas e dão um belo e saboroso efeito crocante. O cacau nota-se somente pelo molho escuro, sobressaindo apenas a harmonia das pimentas.
Final grande com aprimorada confecção do “Magret de pato com puré de pêra rocha e batata” (16,50€). Carne rosada, macia e suculenta, com o complemento de pimentos e espargos grelhados a reforçar a boa execução culinária do conjunto.
Em noite que era de folga do chef e o ajudante ficou sozinho, alguns momentos de espera serviram até para deixar claro que esta é uma cozinha afinada e de critério apurado, que nem a ausência do maestro e a falta de apoio conseguem perturbar. Mesmo limitado às suas duas mãos, o cozinheiro de serviço demonstrou estar à altura das exigências e saber dar conta do recado.
Fica claro que para lá da memória e evocação chocolateira há outros motivos para visitar a Fábrica do Chocolate. A par da carta, durante a semana ao almoço é facultado também um menu executivo que inclui entrada, prato de peixe ou carne, sobremesa, bebida e café, por 9,50€.
Para lá do restaurante e alojamento, o recuperado edifício de A Vianense acolhe também o Museu Interactivo do Chocolate. Pode servir para abrir o apetite, mas permite também conhecer as origens do cacau e as técnicas como é transformado até ao fabrico do chocolate. O visitante pode também meter a mão e até levar para casa o produto final.
- Nome
- Fábrica do Chocolate
- Local
- Viana do Castelo, Santa Maria Maior, Rua do Gontim, 70-76
- Telefone
- 258 244 003
- Horarios
- Todos os dias
- Website
- www.fabricadochocolate.com
