Fugas - restaurantes e bares

  • Nelson Garrido
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Uma tasca sem regras, mas com personalidade

Por Alexandra Couto ,

O restaurante e wine bar Tasqueiros sem Lei fica na rua principal do centro histórico de Santa Maria da Feira. De fachada estreita, quase não de lá por ele, mas o cheirinho a comida boa convida a entrar.

Ao caminhar pela rua, quase não se dá por ela. A casa é de fachada estreita, tem uma janela cuja vista para o interior é algo obstruída por adereços rústicos e, mesmo espreitando da porta da rua para dentro, o mais provável é que a quantidade de clientes em pé, a aguardar mesa, iniba os forasteiros menos pacientes e os faça dar meia volta.

Mas, tal como no faroeste, dos fracos não reza a história: saquem-se as carteiras e os casacos, apontem-se-nos aos cabides distribuídos por paredes e balcões, explique-se ao dono do saloon aquilo a que se vai e espere-se com calma, fazendo mira à mesa que não tardará em vagar.

Enquanto isso, impõe-se fazer o reconhecimento do terreno: o restaurante e wine bar Tasqueiros sem Lei, na principal rua do centro histórico da Feira, apresenta-se em paredes de pedra, banquinhos de madeira, louceiros antigos, jarros de latão, louças de barro vermelho, radiofonias vintage, quadros de ardósia, xailes de fado. É gerido por cavalheiros e donzelas de trato refinado e traje aprumado — usam suspensórios discretos, laços no colarinho e chapéus de chef em tom vinácea — e tem um ambiente que pode parecer confinado, mas é meramente aconchegado. O que mais convence, ainda assim, é algo que não se detecta no horizonte visual: o cheirinho a comida boa, o apurado aroma a sabor.

Uma vez à mesa, é então na ementa da casa que melhor se percebe por que é que o espaço se designa “sem lei”: isso deve-se não só a uma farta oferta de vinhos, no que a gerência se opõe a qualquer Lei Seca instigadora da abstinência báquica, mas também ao facto de a sua ementa culinária não ter regra fixa, alterando-se diariamente, consoante a inspiração da cozinheira-mor. Moelas, pataniscas, bochechas de porco e fígado de vitela em cebolada há todos os dias, por exemplo, mas papas de sarrabulho bem puxadas de pimenta servem-se só à sexta; migas de bacalhau e chanfana de borrego estão reservadas para o sábado; petinga é quando o mar a traz à rede e a cozinheira está perto para a apanhar; arroz de cabidela quando a chef o entender ou um grupo de clientes o encomendar. E se é verdade que a página dos Tasqueiros no Facebook vai informando dos diferentes petiscos diários, garantido mesmo é o paladar, que chega à mesa em pratos desirmanados, pequeninos, mas de sustento. Seja na sopa de couve-flor e penca, nos filetes de polvo, na morcela cozida ou na mão-de-vaca com grão, o sabor nota-se experiente — intenso, mas justo.

“A cozinheira é dotada”, diz um cliente de Gaia, que aparece pelos Tasqueiros sempre que lhe apetece uma refeição consolada. “A moça tem jeito e nota-se que faz uma coisa diferente”, acrescenta sem largar o prato, para embaraço de Catarina Oliveira, cuja lida entre as panelas se faz a poucos centímetros dos clientes que optam pelo balcão do fundo. Dessa proximidade resulta uma inevitável atenção à forma como cada freguês reage aos seus cozinhados e daí a confissão: “Isto não é ser dotada; é ser obcecada. Quero tanto que as pessoas gostem do que eu cozinho que, se um prato não me sai bem à primeira, tento segunda vez, experimento uma terceira, arranjo outra maneira ainda — é as vezes que for preciso até ficar no ponto!”.

O outro sócio da casa, Alexandre Mota, diz que a estratégia tem funcionado e aplica-se também às sobremesas mais procuradas: crumble de pêra, leite-creme queimado ou com canela, pêra bêbeda, fogaça com compota de abóbora, frutos secos e queijo amanteigado. “A Catarina empenha-se particularmente, é um facto”, afirma. A esse esmero acresce depois “uma grande aposta em produtos nacionais e regionais”, o que, no caso dos vinhos, envolve muitas vezes sessões de prova entre os clientes, para que esses possam emitir opinião antes de a gerência decidir que novas referências comprar. Se à mistura houver fado ou jazz ao vivo, tanto melhor. “É tudo uma forma de assegurarmos à casa um ambiente genuíno e autêntico”, defende Alexandre.

Entre duas de letra, uma garfada e outra, sobrepõe-se então ao burburinho das conversas e ao tilintar dos talheres o badalar metálico de um sino. Sim, de um sino mesmo, no sentido literal do termo. Pergunta-se ao Jonas Oliveira, irmão de Catarina, a que se deve o som de alarme e, muito composto nos seus suspensórios e laço, ele responde: “Fazemos soar o sino sempre que alguém deixa gorjeta.” Ok. Esclarecidos. Faça-se pois troar a campânula à nossa régia e satisfeita passagem — que o silêncio não fique a falar por nós.

Nome
Tasqueiros Sem Lei
Local
Santa Maria da Feira, Santa Maria da Feira, Rua Doutor Roberto Alves, 33
Telefone
256 025 112
Horarios
e
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