Fugas - restaurantes e bares

A Confraria comida apurada, ambiente encantador

Por David Lopes Ramos ,

O nosso crítico gastronómico sentou-se à mesa do restaurante da York House, em Lisboa, agora com Nuno Diniz como chefe de cozinha. David Lopes Ramos comeu, bebeu e de tal modo gostou que decidiu filiar-se como irmão dest"A Confraria.

A Confraria é o restaurante da York House, a mais encantadora casa de hóspedes de Lisboa. Chamar-lhe-ia hotel de charme se a expressão não estivesse degradada por uma utilização abusiva e sem critério. Tem uma longa história o edifício da York House, cujas origens remontam a 1606. Começou como convento. Com a dissolução das ordens religiosas (1759), foi fechado, bem como a igreja. Em 1879, foi comprado pela Sociedade Irlandesa da Igreja Evangélica. Em 1880, duas senhoras inglesas adquiriram o edifício, adaptaram-no a pensão e baptizam-no York House.

Entre 1900 e 1910, a casa foi trespassada a outras duas senhoras inglesas, às quais as Chiron, duas senhoras francesas, a adquiriram; em 1931, nova mudança de proprietários, neste caso um casal francês, os Goldstein. Nas décadas seguintes, até aos anos 70, a York House foi alargando a sua capacidade hoteleira. Houve então um período de crise, mas a casa voltou ao bom caminho nos anos 80. Simultaneamente, o restaurante A Confraria, graças ao trabalho competente da chefe Eugénia Cerqueira, ganhou prestígio e uma clientela fiel. Depois da reforma desta mulher de paladar apurado, chegou a vez do chefe de cozinha Nuno Diniz que é adepto de uma culinária valorizadora dos produtos de qualidade e da respectiva sazonalidade. A renovação que iniciou da cozinha de A Confraria é prudente e respeitadora do passado e do estilo da casa. Os antigos clientes têm todas as razões para continuar a sentir-se em casa; os novos descobrirão um lugar de discreto bom gosto e conforto e uma cozinha contemporânea avessa a tentações circenses.

Nuno Diniz é um apaixonado pela cozinha, a tal ponto que, um dia, deixou a sua antiga profissão ligada às novas tecnologias para se dedicar por inteiro à arte coquinária. Trabalhou uma temporada na Quinta do Monte d"Oiro, de José Bento dos Santos. Aí tomou contacto com as matérias-primas mais desejadas pelos "gourmets" - "foie gras", caviar, trufas brancas e do Périgord, carne de Kobe, azeites italianos, os melhores vinhos de Bordéus e da Borgonha --, mas também os nossos melhores produtos, entre eles os peixes e mariscos. Entretanto, José Tomáz Mello Breyner, que dirige a York House, desafiou-o para assumir a direcção da cozinha de A Confraria. E Nuno Diniz lá está, pareceu-me que em grande forma, cozinheiro e cavalheiro, passando para os clientes a ideia de que a sua única preocupação é fazê-los sentir felizes durante o tempo que dura a refeição.

A ementa muda de acordo com as estações do ano e é sensatamente pequena: duas sopas, quatro entradas, cinco pratos de peixes e quatro de carnes; as sobremesas são cinco, da responsabilidade de Sofia Abecassis, mais uma salada de frutas e dois queijos (Serra e Serpa). Há ainda algumas propostas fora deste cardápio fixo, com destaque, nesta época do ano, para alguns pratos de caça, uma tradição da York House.

Num almoço solitário e num jantar a dois, provaram-se um "carpaccio" de amanitas (9 euros), fora da ementa, cogumelos carnudos fatiados, com ligeiro tempero de azeite e vinagre, um nadinha de pimenta e flor de sal, uma delícia requintada. Nesse almoço, o mimo do chefe foi uma excelente salada de favinhas cozidas, com o clássico tempero de azeite, vinagre e coentros. Seguiram-se as "iscas de pato com molho de balsâmico, palmier de presunto" (7 euros), uma entrada evocativa das iscas de fígado de vaca e de porco das tabernas de Lisboa, com o molho igualmente encorpado, mas agridoce, devido ao uso de vinagre balsâmico e vinho do Porto, as pequenas iscas grossas de fígado de pato, de interior rosado, com o palmier a dar o contributo estaladiço ao conjunto de grande nível culinário. Como prato principal escolheu-se o "bife de atum com míni funcho marinado em azeite, mel e casca de limão, profiterole de alheira" (19 euros). Atum grelhado no ponto, ou seja, quase cru para guardar a suculência, e a surpresa do profiterole recheado com alheira a acrescentar textura e sabor e a umbelífera a perfumar o cozinhado de confecção apurada. A sobremesa foi queijo da Serra, untuoso, com umas fatias de marmelo confitado (7 euros), uma memória de infância do chefe. Bebeu-se o Bons Ares branco 2007 (16,50 euros), fresco, mineral, conúbio bem sucedido dos aromas da casta Sauvignon Blanc com a acidez da Viosinho, da autoria de João Nicolau de Almeida.

No jantar, o mimo do chefe foi um folhado recheado com "tapenade" de azeitonas e tomate, seguindo-se o "creme de espargos verdes e "shot" de espargos brancos com pata negra e tosta de alho e azeite de Trás-os-Montes" (6,50 euros), simples e saboroso, com o cremoso e delicadeza dos caldos a serem desafiados pela rusticidade da tosta alhada e azeitada, feita cama do presunto; e um belíssimo "raviolli" de massa fresca recheado com lavagante (7 euros), fora da ementa fixa. Como pratos principais elegeram-se as "lascas de lombo de bacalhau em massa folhada com a sua canja" (17 euros); e o "carré de borrego selado no forno, em crosta de azeitonas e noz com couscous" (23 euros). O folhado, estaladiço de uma cozedura competente, recheado com bacalhau do melhor e a canja do gadídeo saborosíssima; excelente o carré de borrego, carne em sangue, de uma macieza e sabor imaculados, couscous deliciosos pelo acrescento, na mesa, do molho desengordurado da assadura. Grande prato.

Adoçaram-se as bocas com duas sobremesas muito boas: "trouxas de ovos com "shot" de lima, gengibre e hortelã" (6,50 euros); e um original "creme queimado de maracujá, suspiro de cacau" (6 euros). Acompanhou toda a refeição o Meandro tinto 2006 (24 euros), que me surgiu com um final algo doce, provocando desarmonia no conjunto. A carta de vinhos está muito bem, com 10 propostas de vinhos a copo, e uma escolha equilibrada e actualizada sobretudo de vinhos portugueses, havendo abertura para que as pessoas levem vinhos para acompanhar as refeições, contra o pagamento de uma taxa de serviço. Os copos são dos bons e o serviço é capaz e simpático.

No Verão, o pátio arborizado da York House é encantador para se refeiçoar. No Inverno, no aconchego da sala de jantar, o encanto repete-se. Que bem que se está e que bem que se come e bebe neste A Confraria.

Nome
A Confraria - York House
Local
Lisboa, Santos-o-Velho, Rua das Janelas Verdes, 32
Telefone
213962435
Horarios
Todos os dias das 12:30 às 15:30 e das 19:30 às 22:30
Website
http://www.yorkhouselisboa.com
Preço
38€
Cozinha
Autor
Espaço para fumadores
Não
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