Não fossem as portas escancaradas, a primeira impressão seria a de que nos enganamos no andar e, em vez do restaurante, metemo-nos por uma casa de família sem sermos convidados. É assim o novo restaurante do chefe Luís Américo. Um espaço amplo, num quarto andar, onde tudo nos parece acolhedor e familiar, da decoração ao serviço, mas muito principalmente por um tipo de cozinha que nos remete para as mais agradáveis memórias de família, ou seja as tradicionais receitas da cozinha portuguesa.
Para lá do espaço de entrada e acolhimento, duas salas, uma à esquerda e outra à direita, tudo com fachadas de vidro viradas a poente que oferecem toda a luminosidade e amplas vistas sobre o típico casario da Foz portuense e com o mar como pano de fundo. Uma prazenteira dádiva do céu, sobretudo em dias ensolarados de Inverno, como aconteceu com a recente visita da Fugas.
É no salão à direita que funciona o espaço restaurativo, já que o outro - que está destinado a zona de degustação/petisqueira e área para fumadores nas horas de refeição - funciona, por enquanto, como uma espécie descontraído lobby. Há ainda um terraço, que a seu tempo há-de igualmente acolher mesas para a refeição.
Decoração sóbria e contida, cadeiras confortáveis e espaços bem generosos entre as mesas. Baixela cuidada e elegante e toalhas e guardanapos de linho cru, a reforçar uma atmosfera que nos aproxima sempre mais da sala de jantar da casa de família que do ambiente de restaurante. Está-se bem e a conversa flui, mas vamos à cozinha que é o que para aqui mais importa.
Embora A Mesa conte apenas cerca de três meses de vida, Luís Américo não é novato nestas andanças. Eleito chefe cozinheiro do ano em 2004 e com vasta experiência e currículo de participações em eventos internacionais, tem também sólida formação (prática e académica) no que à técnica dos fogões diz respeito. Dirigiu antes o restaurante Degusto, em Matosinhos, que, neste espaço, David Lopes Ramos caracterizou como "uma cozinha de alto nível, prazenteira, que não nos conduz por e para labirintos gustativos, antes convoca memórias de sabores que nos são familiares e ligados às nossas melhores tradições culinárias". Um estilo que agora parece refinar.
Perspectiva de negócio
A par do serviço à carta, com sólidas propostas de cozinha contemporânea e a preços bem sensatos (entre os 13 e os 15 euros), incluindo um menu de degustação com oito variedades (38 euros), há o chamado menu executivo a permitir interessantes experiências gastronómicas e a preços contidos. São quatro propostas para entrada, prato principal e sobremesa, que, incluindo copo de vinho e café, se queda pelos 18 euros. Foi por aí que fomos e a opção não poderia ter sido mais acertada.
Creme de grão com espinafres, aveludado e a evidenciar os mais autênticos sabores dos produtos; queijo de cabra crocante, envolto em massa brique e sobre cama de alface, de grande delicadeza; brás de presunto, deliciosamente guloso, como entradas. Diversidade de texturas, técnicas e aromas, a evidenciar o grau de sofisticação de uma cozinha moderna e criativa, mas sempre apoiada na mais genuína tradição da culinária nacional. Com a batatinha palha e o refogadinho de cebola no ponto perfeito e tirinhas de presunto no lugar do bacalhau, o brás é disso mostra bastante.
As opções seguintes orientaram-se para uns filetes de tamboril, que acompanharam com arroz malandrinho de tomate e amêijoa; frango com alheira e polenta de sarrabulho; e rigatonne de queijos, como opção vegetariana. Peixe irrepreensível, o frango envolto em capa de toucinho e a envolver o conteúdo da alheira em perfeita harmonia de sabores, e saboroso conjunto de cremosa pasta de queijos a agarrar-se às massas salpicadas com pedacinhos de cebolinho. Tudo muito bem cozinhado e empratado de forma elegante, mas há que realçar dois aspectos de clara excelência culinária: o arroz malandro num ponto de cozedura (seguramente muito lenta) que permite revelar a inigualável goma e sabor do nosso carolino, por um lado, e, por outro, a polenta que se mistura com carnes do frango esfiadas e sarrabulho do sangue da ave. Qualquer coisa entre os milhos de Trás-os-Montes e os típicos sarrabulhos do Minho e que logo nos transporta para sabores da mais profunda e criativa tradição culinária.
Para acompanhar, um branco, da casta Viognier, produzido na Argentina, já que o objectivo passava também por reforçar a ideia de que a alta cozinha não tem que ligar necessariamente com altos preços. Escolheu-se o Dos Ochos 2007 (13 euros), um vinho com força aromática e boa aptidão gastronómica e que deu muito boa conta de si, só cedendo perante a força e complexidade dos sabores da alheira e o sarrabulho da polenta.
Nas sobremesas, uma saborosa torta de abóbora com doce de chila, brownie de chocolate, sofrível, e fruta laminada para manter uma escolha vegetariana.
O serviço é cuidado e num estilo despretensioso que contribui também para o ambiente de cordial familiaridade, mas o ritmo acaba por mostrar que será necessária mais alguma gente para equilibrar as coisas.
Luís Américo, já se sabia, é uma das mais interessantes personalidades da cozinha alta cozinha contemporânea, procurando, como ele diz, "sabores confortáveis e indiferentes a modas e tendências". À solidez e segurança culinária junta ainda uma perspectiva de negócio, que o conduzem para propostas com preços sensatos e de forte atractividade, sem que isso signifique o alinhamento pela moda low cost, já que não se trata de poupar nos ingredientes ou nas quantidades. É sensato e isso basta.
- Nome
- Mesa - Restaurante e Sala de Estar
- Local
- Porto, Porto, Rua D. Domingos de Pinho Brandão, 75 - 4º
- Telefone
- 226169255
- Horarios
- Terça a Sábado das 12:30 às 15:00 e das 20:00 às 23:00
Domingo das 12:30 às 15:00
- Website
- http://www.amesa.pt
- Preço
- 20€
- Cozinha
- Contemporânea
- Espaço para fumadores
- Sim