Fugas - viagens

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Jaime, um seringueiro que não teve juventude

O Museu do Seringal tem ainda uma igreja, com um altar dedicado a Nossa Senhora da Conceição, a padroeira de Manaus. Nas paredes, há papelinhos com pedidos à santa. O guia Armando Dússan explica que a maioria dos coronéis eram católicos, assim como muitos trabalhadores, especialmente os vindos do Nordeste: “Os nordestinos trouxeram as suas roupas, as suas comidas, as suas festas e sua religião.”

Ao contrário da casa senhorial ou da área de banho, na igreja os seringueiros podiam entrar, explica Jaime. E é então que conta a curiosa história do seu baptismo. Afinal, Jaime chama-se na verdade Manuel Henrique de Sousa. “O padre só vinha no seringal de ano a ano para fazer a desobriga, baptismo e casamento”, conta, entre sorrisos. “Mas antes de o padre chegar, eu adoeci para morrer. Então existe um baptismo em casa, em que o pai da gente chama uma pessoa de idade para fazer o baptismo dentro de casa. Esse baptismo tem de ser [com o nome] de Manuel ou Maria, não pode ser Jaime, Pedro, José.”

Mais tarde, Jaime seria baptizado pelo padre, que insistiu que ele deveria ser Manuel. “Só os meus documentos têm Manuel. Há gente na minha família que não sabe que o meu nome oficial é Manuel”, conta o ex-seringueiro, cuja boa disposição supera o sofrimento que passou.

Jaime casou bem cedo, com uma menina de uma família que trabalhava num seringal próximo. “A primeira moça que namorei, eu casei. Ela era uma criança, tinha 13 anos. Ainda hoje estou com ela. Tem 62 anos e temos 11 filhos”, revela este homem de mãos calejadas, que só deixou o seringal aos 40 anos. Estava cansado, via a filha sem “sapato para calçar, nem roupa para vestir”: “Andava toda rasgadinha”, conta, lembrando que naquele tempo a roupa dos seringueiros era feita de sacos de açúcar.

Resolveu então mudar de vida. Ouvia dizer que Manaus era bom para ganhar dinheiro e arriscou. No início correu mal. “Não me dei bem, porque quando cheguei sofri muito. Vim com pouco dinheiro, acabou-se o dinheiro e tinha pouco conhecimento na cidade. Sofri um ano e tal. Depois, em 1983, comecei a trabalhar e não parei mais.” É assim a vida de Manuel Henrique de Sousa, que foi, é e será sempre conhecido como Jaime.

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