A aridez dourada do Alentejo segue-nos à janela, mas a língua enrola-se ao ler indicações e nomes de estabelecimentos à beira-estrada. A fronteira ficou para trás e depressa Badajoz dançará no vidro traseiro do carro, embalada na transpiração do alcatrão ardente. Os termómetros sobem acima dos 40ºC e nem o ar-condicionado dá as tréguas devidas ao Verão estremenho. O destino guia-nos para Sudeste, em direcção à comarca de Zafra-Río Bodión. O calor segue connosco. É lá que se situam os dois hotéis da marca Vivedespacio, empresa local e familiar, que fomos conhecer entre oliveiras e azinheiras, foie-gras artesanal e presunto ibérico, monumentos e artesanato.
Convento de La Parra
Refúgio secular
Durante mais de 300 anos foi convento de clausura e esse ambiente de recolhimento ainda paira sobre as paredes robustas. O edifício caiado de branco ergue-se entre as ruas estreitas de La Parra para se dobrar sobre si mesmo, num abraço ao claustro arejado e luminoso. A povoação e os seus mil habitantes ganham existência somente à janela de alguns quartos ou para lá da antiga portaria em puzzle granítico, hoje recepção do hotel. Vela-se o mundo e o quadro é de azul-céu entre cal branca. A mudez do calor nos pátios ecoa pelo silêncio da penumbra nas alas interiores. E nós acabamos a sussurrar conversas para não interromper a paz que por aqui se vive.
O convento, erguido em 1673 para albergar as religiosas de Nossa Senhora das Dores (ordem de Santa Clara), foi transformado em hotel no ano 2000, quase vinte anos depois de a autarquia local ter adquirido o edifício. A ideia já era, então, reabilitá-lo, mantendo a traça da arquitectura e o ambiente do passado conventual. O conceito mantém-se agora sob alçada da Vivedespacio, que o adquiriu em 2010 (a marca nasceu no mesmo ano, integrando o Hotel Conde de la Corte e, um ano mais tarde, o Palacio Carvajal Girón, em Plasencia, entretanto vendido a uma cadeia hoteleira brasileira).
As celas, antigos aposentos das freiras clarissas, foram adaptadas para 21 quartos individuais, duplos e suítes. No antigo refeitório, as arcadas de pedra dão agora abrigo às refeições dos hóspedes, num restaurante de cozinha regional. E a horta foi substituída por um pátio com piscina e cubículo de massagens (realizadas sob marcação antecipada). Já a capela é agora um espaço para eventos e uma loja de produtos da região surge numa sala anexa.
A rusticidade da construção — paredes grossas caiadas de branco, chão em tijoleira de terracota, portas e janelas de madeira — é enaltecida por uma decoração despojada e em tons neutros, misturando elementos mais rurais e tradicionais com móveis contemporâneos e minimalistas. A aposta é no conforto e na tranquilidade. Não há televisores nem rádios — antes um salão com biblioteca e jogos de tabuleiro. Wi-fi praticamente só na zona do claustro e com fraca intensidade. Cada recanto é espaço de leitura, de fruição do nada.
No primeiro andar, uma varanda circunda o claustro com camas para espreguiçar, ora de olhos perdidos nas cegonhas que habitam o topo da torre sineira, ora mergulhados no pátio lá em baixo, feito esplanada entre laranjeiras e uma fonte centenária. Ao final da tarde, trocamos a sombra pela zona da piscina, dividindo-nos entre um dos colchões-cama e mergulhos no pequeno espelho de água. O calor vai esmorecendo, o lago turquesa perdendo intensidade entre o níveo das paredes. O altifalante de um carro de comício salta o muro alto do pátio, pouco depois ouve-se o baile das festas da terra. E sabemos que a vida segue o seu ritmo habitual fora deste refúgio secular.
Convento de La Parra. Calle Santa María, 16 – La Parra. Tel.: +34 924 682 692.
E-mail: laparra@vivedespacio.com. www.vivedespacio.com/laparra
Preços: duplos a partir de 122€ por noite
Conde de la Corte ?
Ode à tradição taurina
Se no Convento de La Parra a simplicidade era o mote, aqui tudo é luxo palaciano. Móveis maciços de porte clássico, pesados reposteiros nos quartos e nas casas de banho, muitas tapeçarias e brocados. E a tradição taurina estampada em molduras pelas paredes de quase todas as divisões.