Fugas - restaurantes e bares

  • Joe Barza é um dos chefs mais mediáticos do Médio Oriente e colocou a gastronomia libanesa ao nível daquilo que de melhor se faz em todo o mundo
    Joe Barza é um dos chefs mais mediáticos do Médio Oriente e colocou a gastronomia libanesa ao nível daquilo que de melhor se faz em todo o mundo Henrique Seruca

Rota das Estrelas: A festa da cozinha tomou conta da Madeira

Por José Augusto Moreira

Depois da sofisticação e elegância, o festival gourmet do restaurante Il Gallo d’Oro rompe fronteiras. Uma festa onde o público, os cozinheiros, os vinhos e outros produtos de excelência se envolvem em ambiente de pura celebração gastronómica.

Joe Barza é um personagem. Além da jaleca de cozinheiro, com uma colecção de emblemas que atestam o currículo internacional, não prescinde também do chapéu preto de aba larga, do brinco com faca e garfo que usa na orelha esquerda e da vistosa barbicha de estilo caprino que lhe ornamenta o queixo.

É assim que cozinha e é assim se apresenta também aquele que é uma das mais conhecidas personalidade televisivas de todo o Médio Oriente, onde é a figura central nos mediáticos concursos Master Chef. É também consultor dos mais famosos restaurantes e cadeias hoteleiras da região e, acima de tudo, um talentoso e criativo cozinheiro que colocou a gastronomia libanesa ao nível daquilo que de melhor se faz em todo o mundo. E com produtos locais e os pratos da tradição.

A aura pública advém-lhe também do facto de, antes da cozinha, ter sido guarda-costas de algumas das mais importantes personalidades no período de guerra no Líbano, conferindo-lhe a pose corpulenta que mantém na meia-idade e que claramente o destaca entre a trupe de cozinheiros.

Barza esteve na Madeira e foi uma das figuras que marcaram a edição deste ano do festival gastronómico Rota das Estrelas. Pelo seu estilo, mediatismo e qualidade do trabalho culinário, bem poderá simbolizar a nova tendência para um evento que vai ainda na quinta edição mas que tem já um lugar muito especial no panorama da alta cozinha internacional.

Uma evolução que fica bem expressa na atenção dos media internacionais e nas cerca de seis dezenas de chefs cozinheiros participantes, muitos deles provenientes de cozinhas fora de Portugal e ostentando as cobiçadas estrelas do guia Michelin. Significativa também a presença de boa parte dos produtores de prestígio de vinhos nacionais, a que se juntaram distribuidores ou representantes de outros produtos gastronómicos de excelência, como caviar, chocolate, queijos e patés.

Depois de três anos praticamente acomodado nas paredes da unidade hoteleira que o suporta — o hotel The Cliff Bay e o seu restaurante gastronómico Il Gallo d’Oro —, o festival tinha saído à rua já no ano passado, mas converteu-se agora numa iniciativa muito mais abrangente e diversificada. Uma autêntica festa onde o público, os cozinheiros, os vinhos e outros produtos de topo se envolvem em ambiente de celebração gastronómica.

É que para lá dos habituais jantares formais com a assinatura de vários chefs estrelados servidos no Il Gallo d’Oro, o festival evoluiu agora para espaços e conceitos de mais ampla participação e em ambiente de animação, partilha e convívio.

Especial mesmo foi a noite wine for food (vinho para comida, em tradução literal), que teve lugar nas adegas de vinho Madeira da companhia Blandy’s, no centro do Funchal. Cozinha ao vivo pelas equipas de mais de uma dezena de chefs, em ambiente de mil e uma noites. Por entre pipas, garrafas, salas de envelhecimento e espaços ao ar livre, não faltaram acordes de saxofone ou guitarra portuguesa e até a percussão com tachos e panelas em que se envolveram cozinheiros e público.

Muita gente elegante e descontraída de prato na mão petiscando e bebericando pratos sofisticados e especialmente concebidos para os vinhos da noite dedicada às “Portuguese Wine Ladies”. Uma dúzia de mulheres, jovens, dinâmicas (e glamorosas também, é verdade!) ligadas à produção, que aproveitaram uma brincadeira jornalística para se associar na promoção conjunta dos seus vinhos.

Convívio e partilha

O desafio passava por provar os pratos com o vinho que lhe estava associado. Particularmente feliz a ligação entre o “paté croute”com pistácios e trufa preparado pelo chef anfitrião, Benoît Sinthon, com o Grainha Branco 2012, de Luísa Amorim/Quinta Nova (Douro), tal como a envolvência entre o crostini de borrego de Joe Barza e o tinto Pape, de Maria Castro/Quinta da Pellada (Dão). Estimulante também a ligação do Arinto, de Sandra Tavares da Silva/Chocapalha (Lisboa) com sushi e sashimi de Paulo Morais, assim como a caldeirada apresentada por Migrel Laffan com o branco de Maria Manuel Poças Maia/Casa Poças (Douro).

Destaque ainda para as preparações de Ricardo Costa, com delicados creme de ouriço-do-mar, mandioca com camarões bebé e variações de caviar (Sturia, da Aquitânia) com os champanhes, bruto e rosé, da casa Pomery.

Nas restantes combinações, os vinhos de Rita Fino Magalhães/Monte da Penha, Rita Nabeiro/Adega Mayor, Mafalda Guedes/Herdade do Peso, Catarina Voeira/Herdade do Rocim, Francisca van Zeller/Quinta Vale D. Maria, Rita Cardoso Pinto/Quinta do Pinto e Teresa Barbosa/João M. Barbosa Vinhos, alinharam com preparações de Vítor Matos, Olivier Barbarin, Sébastian Broda, Vincent Farges, Henrique Sá Pessoa e Pascal Picasse.

O mesmo modelo de festa, convívio e partilha mudou-se no dia seguinte para os jardins e salões do Cliff Bay, num autêntico arraial gastronómico em versão elegante e sofisticada. A jogar em casa, Benoît Sinthon não deixou os seus créditos por mãos alheias com uma feijoada (terra e mar, com camarões) servida no interior da cozinha e onde um DJ impunha batida de discoteca. As emoções dos sabores, numa cozinha em versão show e apelativa, também com um peixe congelado num grande bloco de gelo (como se estivesse no mar) na banca de sushi e sashimi de Paulo Morais, o salmão macio e aveludado de Vítor Matos, as vieiras de Miguel Laffan ou as ostras que Ricardo Costa complementava com o respectivo consomé, creme de champanhe e alga crocante. Uma grande e divertida festa pode rimar também com a alta gastronomia.

Henrique Sá Pessoa cozinhou para o Alvarinho Curtimenta, de Anselmo Mendes, numa noite onde brilharam igualmente os vinhos da Quinta do Vesúvio, Quinta do Pessegueiro, Alves De Sousa, Campolargo, Esporão, o Antão Vaz de Paulo Laureano, o madeirense Vinha do Avô (Verdelho), o azeite e os vinhos da Quinta de Lemos e o exclusivo rosé Principal (Pinot Noir) que ajudou a brilhar o foie gras preparado por Sebastian Broda e Pascal Picasse.

Presença marcante, de novo, para Joe Barza, que preparou um delicioso pargo com cuscus, cebola, azeitonas e um creme de sésamo. “Out of the box” (fora da caixa), dizia, vaidoso, perante adesão à combinação com o opulento tinto Lupucinos, da Quinta de Lubazim (Douro). O mesmo acerto na combinação entre o bodião com caldo de ostras preparado por Albano Lourenço e vo inho proposto: o branco da Quinta das Cerejeiras, fresco e gordo ao mesmo tempo, que era apresentado por Ana Fonseca Reis, outra jovem e dinâmica produtora que bem poderia ter marcado presença no grupo das ladies da noite anterior.

Novas e velhas estrelas

Os jantares formais ficaram, desta vez, reservados para os últimos dias de uma semana de festival que atraiu ao Funchal as atenções do mundo gastronómico. Duas espécies de sinfonias em versão gourmet, cuja primeira partitura juntou maestros de casas de Portugal (Vincent Farges e Miguel Laffan), França (Sébastian Broda, Pascal Picasse e Olivier Barbarin) e Reino Unido (Adam Simmonds), todos com estrelas Michelin. Para o segundo andamento Benoît Sinthon convocou o duas estrelas Dieter Koschina (Vila Joya) e os espanhóis Fernando Agazar, José António Campoviejo e José António González, igualmente estrelados. A ideia, ao que consta, é que a Rota das Estrelas se estenda também a Espanha num futuro próximo, assumindo-se como um festival de características ibéricas.

Às degustações, jantares, apresentações e show coocking, o festival madeirense procurou juntar este ano uma envolvente popular, com o lançamento de um concurso para a detecção de talentos que possam ser novas estrelas da cozinha. O processo de candidatura decorreu em paralelo entre os alunos da Escola de Hotelaria da Madeira e espontâneos locais, entre os 18 e 35 anos, de entre os quais foram apurados três finalistas de cada origem.

Depois de um estágio de aperfeiçoamento nas cozinhas do grupo Porto Bay, os seis finalistas integraram não só as equipas que puseram o festival em andamento como protagonizaram também a grande final, que se converteu num grande espectáculo ao estilo televisivo e que teve como palco o Mercado dos Lavradores do Funchal.

Coube ao júri final, composto por Joe Barza, Henrique Sá Pessoa, Ricardo Costa, Benoît Sinthon e Jorge Espírito Santo, encontrar o vencedor. Além da qualidade e segurança demonstrada pelos finalistas, o que se pode dizer é que os espontâneos estiveram perfeitamente ao nível dos alunos de hotelaria, a provar que, além de uma festa, a cozinha é também já uma paixão para muitos jovens madeirenses.

A Fugas viajou a convite do grupo Porto Bay

--%>