Fugas - restaurantes e bares

  • René Redzepi, aqui fotografado no seu restaurante Noma, é o fundador do MAD, que acontece em Copenhaga
    René Redzepi, aqui fotografado no seu restaurante Noma, é o fundador do MAD, que acontece em Copenhaga JOACHIM LADEFOGED/VII/CORBIS
  • “Pretendo ensinar-vos a ter medo. Nunca somos velhos para o ter”, disse Albert Adrià
    “Pretendo ensinar-vos a ter medo. Nunca somos velhos para o ter”, disse Albert Adrià MIKKEL HERRIBA
  • Futa Feia, projecto português inspirador
    Futa Feia, projecto português inspirador MIKKEL HERRIBA

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O “Cirque du Soleil” da gastronomia regressou a Copenhaga

Humildade e medo

A cozinha de um restaurante também é um lugar que testa ao máximo a personalidade de uma pessoa, seja em Lisboa, Chicago ou Copenhaga. Por isso, para se ser cozinheiro é preciso uma receita que envolve muita coragem, empenho e determinação. Mas, acima de tudo, é necessário perseverança e humildade, até mesmo quando se chega ao topo. Modéstia essa que teve Olivier Roellinger. O chef bretão cujo estilo de cozinha foi fortemente influenciado pelo comércio das especiarias devolveu as três estrelas do restaurante Maisons de Bricourt, aberto em 1982, e conquistou a plateia com as suas frases-chave sobre o que é para ele o papel da figura do chef. “Os chefs devem comprar produtos respeitando a diversidade das espécies animais e a biodiversidade e diferenças culturais no planeta.” Palmas. “Os chefs devem apoiar o comércio justo e lutar contra o desperdício alimentar.” Palmas. “Os chefs devem proteger e promover a diversidade de cozinhas e hospitalidade em todos os locais.” Ovação de pé.

Mais jovem do que o chef Olivier, mas não menos determinada, Tatiana Levha desmistificou ainda a ideia de que, hoje, qualquer pessoa pode abrir um restaurante com toda a facilidade. Quatro meses após ter aberto o seu próprio espaço, o Le Servan, em Paris, e depois de ter trabalhado com nomes como os chefs Pascal Barbot e Alain Passard, Tatiana falou sobre o que apelida de “dor gratificante” que isso acarreta. A jovem chef falou sobre o “medo de receber uma enorme atenção dos media desde o início” — apesar de ser bom, tudo está a começar e os pratos estão a evoluir —, tocou também na mudança do staff e na necessidade de aprender a reagir a mudanças repentinas na ementa. Tatiana terminou a sua palestra com um “é assustador saber que vamos ficar com medo nos próximos dez anos”. Redzepi retorquiu: “Aprendemos a viver com isso.”

Bem o pode dizer Albert Adrià. A apresentação do chef catalão foi inteiramente dedicada a demonstrar a importância do medo como engenho criativo. “Pretendo ensinar-vos a ter medo. Nunca somos velhos para o ter”, disse, explicando que quando, ultrapassamos os sustos, alcançamos os sonhos. Para ilustrar o seu ponto de vista, Albert percorreu a sua carreira pós elBulli, considerado pela revista inglesa Restaurant como o melhor restaurante do mundo em 2002 e de 2006 a 2009, e os medos que tem tido com cada novo projecto pessoal. Quando abriu o 41º, o primeiro de vários espaços em Barcelona, tinha receio de não se conseguir separar do nome do seu irmão, Ferran Adrià, e copiar o conceito do elBulli. Seguiram-se o Tickets (restaurante a que o chef José Avillez foi buscar inspiração para o seu Mini Bar, em Lisboa), o Pakta e o Bodega 1900, e aqui o problema era os clientes não perceberem o conceito.

Nos novos dois espaços, o Nino Viejo e o Hoja Santa, a abrir já em Setembro, a apreensão é que os mexicanos não gostem ou pensem que não é cozinha autêntica. Contudo, por agora, Albert aprendeu a lidar com os seus medos. “O receio, controlado positivamente, é o meu engenho criativo. Torna-me humilde, ponderado, respeitoso, honesto e ousado”, concluiu, sob um forte aplauso da plateia. Lições de chefs que são ensinamentos de vida.

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