Os enchidos e queijos portugueses, as ameijoas à Bulhão Pato, as delicadas gambas da costa, os majestosos carabineiros grelhados e o robalo no sal que apareceram nas mesas da esplanada do Altis Belém, em Lisboa, ao almoço de sábado, dia 16, quase derrotaram os chefs convidados por João Rodrigues para mais uma etapa da Rota das Estrelas no Feitoria, o restaurante do hotel.
O chef português era o anfitrião destes dez convidados vindos do Brasil, Bolívia, Holanda, Espanha e, claro, Portugal, e quis mostrar-lhes o melhor peixe e marisco que se podia encontrar por aqui. Deliciados, com os sucos vermelhos das cabeças dos carabineiros a escorrer-lhes pelas mãos, alguns dos chefs pediam clemência e perguntavam, entre gargalhadas, se tinham mesmo de ir trabalhar a seguir.
Mas sim, tinham. Porque nesse dia realizou-se o segundo dos três jantares desta etapa da Rota, e o Feitoria tinha sala cheia para conhecer o trabalho destes profissionais. E, de facto, algumas horas depois da festa de marisco e peixe, lá estavam eles, impecáveis, na cozinha, a preparar uma sucessão de pratos do mais alto nível.
O jantar abriu com o chef basco Josean Alija, do restaurante Nerua de Bilbao. Ao almoço, sentado à nossa frente, Josean explicara como o seu trabalho se centra muito nos vegetais e, para os ter em grande variedade e muita qualidade, trabalha com um produtor próximo de Bilbao. Só de tomate, por exemplo, testaram perto de 150 variedades, para depois decidirem produzir nove. E foi de tomate o primeiro prato que serviu nessa noite.
Trata-se de um dos pratos emblemáticos do Nerua e, na aparência, é de uma enorme simplicidade: são cinco tomates cherry, de tons ligeiramente diferentes, num pouco de caldo. Na realidade é um mundo de sabores. O caldo é de ervas e alcaparras e cada tomate é injectado com um caldo de diferente sabor – menta, cebolinho, citronela, alecrim e cerefólio – servidos tépidos, rebentam docemente na boca, espalhando os sabores e aromas. Seguiu-se outro prato também de Josean, umas línguas de bacalhau com molho pil-pil, que foi acompanhado por um vinho de Julia Kemper, do Dão, o Curiosity Reserva 2014.
Uma descoberta para muitos dos presentes foi a dinamarquesa Kamilla Seidler, que veio do restaurante Gustu em La Paz, na Bolívia, de onde trouxe uma extraordinária cañihua (uma espécie de quinoa) cremosa com legumes frescos e ervas e um queijo tipo parmesão feito naquele país – um prato acompanhado por um Terras do Grifo Grande Reserva 2011, do Douro.
O chef seguinte a entrar em cena foi Paolo Casagrande, vindo do Lasarte, em Barcelona, que serviu um prato de “mar e montanha” no qual juntou finas fatias de presa de porco ibérico com foie-gras, salada marinha e gelado de mostardas. No vinho, para este prato regressou-se ao Dão com o Druida Reserva Encruzado 2012.
João Rodrigues, o anfitrião, serviu um prato a que chamou Sargo e a Baixa Mar, em que o peixe vinha rodeado dos sabores do mar, algas, percebes, lagostim, salicórnia, e que era acompanhado na perfeição por um Casal de St. Maria 2010, de Colares, um vinho que, também ele, sabe a mar.
Veio depois a carne com um daqueles pratos de lamber os beiços e os dedos: pá de cordeiro de leite com falso ovo (a “clara” era um creme de cará, uma espécie de inhame) e roti, criação do brasileiro Felipe Rameh, dos restaurantes Trindade e Alma Chef, vindo de Belo Horizonte, Brasil. Foi servido com um tinto alentejano, o Quinta do Mouro 2008. O jantar encerrou com uma sobremesa fresca e leve de João Rodrigues, com morangos, hibiscos e leitelho de ovelha.
No dia anterior e no seguinte, passaram pelo Feitoria outros convidados: vindo da Holanda Michel Van Der Kroft (do ‘t nonnetje), e de Portugal Joachim Koerper (Eleven, Lisboa), Leonardo Pereira (Areias do Seixo, Torres Vedras), Oscar Gonçalves (G Restaurante, Bragança), Ricardo Komori (Bonsai, Lisboa), e o chef pasteleiro Joaquim Sousa (The Oitavos, Cascais), que apresentou a sua célebre Floresta Negra, em que uma flor de chocolate se vai abrindo, pétala por pétala, revelando o gelado escondido no interior.