Fugas - restaurantes e bares

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Esqueça o Michelin, as tascas de Lisboa merecem o Palito d’Ouro

Por Alexandra Prado Coelho

Tiago Pais, jornalista e apaixonado por tascas, escolheu as 50 melhores da capital e fez um guia que é uma homenagem a estes locais onde se come muito bem por 10 euros ou menos.

Tiago Pais é jornalista gastronómico e passa algum do seu tempo a experimentar pratos de alta cozinha. E no entanto tem um fraco por tascas – daquelas a sério, com grandes tachos ao lume cheios de feijoada ou dobrada, grelhas de quem sabe o que fazer para não estragar um peixe, cachecóis de clubes de futebol na parede e um ambiente de casa de família. Escrever um livro sobre elas era um pretexto (ou, está-se mesmo a ver, uma boa desculpa) para passar um ano a conhecê-las melhor. E o resultado já está à venda: As 50 Melhores Tascas de Lisboa (edição Zest), que vem com um mapa para não nos perdermos nos bairros da capital. 

“O meu pai adorava almoçar ou jantar fora e era capaz de fazer desvios de 50 ou 60 quilómetros para encontrar aquele restaurante que tinha a melhor relação qualidade-preço e onde serviam comida tradicional portuguesa”, conta Tiago Pais para explicar de onde lhe vem o gosto pelas tascas. Já do tempo em que trabalhava na Time Out (hoje está noObservador) que pensava que, se há guias de restaurantes de vários tipos, valia a pena fazer um só dedicado a estes espaços “mais honestos, mais tradicionais”, onde, na sua definição, se consegue fazer uma refeição simples por menos de 10 euros por pessoa. 

Pôs-se a caminho, com o fotógrafo Gonçalo F. Santos e, juntos, criaram uma estética particular (semelhante à que usavam na Time Out quando falavam de algumas destas tascas) em que toalhas de papel com marcas do copo de vinho, azulejos floridos nas paredes, tachadas de comida e bandejas de inox ganham uma graça que às vezes não veríamos a olho nu. 

Isso deve-se muito ao trabalho de Gonçalo e do designer gráfico Luís Lima (também ex-Time Out), diz Tiago. “Não é fácil este mundo das tascas, as pessoas são fechadas, são desconfiadas, mas ninguém melhor que o Gonçalo para ir à cozinha fazer charme às cozinheiras ou aos cozinheiros e conseguir que eles preparassem pratos e os pusessem no sítio ideal para fotografar.” 

As melhores tascas – neste livro são sete, porque “de tops 5, 10, 15 e 20 está o mundo farto” – ganharam uma distinção que, espera-se, há-de fazer escola: o Palito d’Ouro. E para quem achar que este é a estrela Michelin das tascas de Lisboa, o autor esclarece: “Não, a estrela Michelin é que é o Palito d’Ouro da alta cozinha.” 

As sete eleitas distinguem-se porque “têm um prato que é uma especialidade incrível que vale mesmo a pena provar”, como o “bacalhau incrível do Zé da Mouraria” (que escolheram para o lançamento do livro) ou porque “o sítio é mesmo muito castiço”. Mas, tal como dizem os inspectores Michelin, o critério essencial é mesmo o da qualidade do que se come. 

É um tipo de restaurantes que “está em risco”, não só porque os donos são pessoas com alguma idade e “muitas vezes os filhos não querem pegar no negócio”, mas também por causa da lei das rendas, que em certos casos torna incomportável manter um restaurante deste aberto. “Tenho consciência que é um tipo de restaurante que pode vir a desaparecer e essa foi também uma das razões que nos levou a fazer o livro.” 

Não é que lhes falte clientela. Têm geralmente clientes fiéis e em alguns casos Tiago avisa mesmo que é difícil arranjar lugar à hora do almoço. “São restaurantes de bairro, onde as pessoas são tratadas pelo nome, já sabem qual é o prato do dia.” E isso leva-nos a outra característica interessante: o prato do dia, que é uma verdadeira instituição. 

“Não sei se existe esta cultura do prato do dia noutros países, mas acho que torna a nossa oferta especial”, diz. “Há três ou quatro pratos fundamentais, o cozido à portuguesa quarta ou quinta-feira, geralmente sexta é dia de feijoada porque à tarde já ninguém é muito produtivo, à segunda há bacalhau porque não existe peixe fresco. É engraçado ver como estes pratos estão relacionados com os hábitos das pessoas. Revelam a criatividade da nossa cozinha porque consegue-se ter o mesmo produto aplicado de oito formas diferentes no mesmo restaurante, há uma capacidade de aproveitamento que também mostra a capacidade portuguesa de se reinventar. Alia-se a racionalidade à criatividade.”

Por isso, para homenagear esta instituição do prato do dia da tasca, o livro inclui no final uma lista dos locais e dos dias em que se pode comer bacalhau assado, cozido à portuguesa e feijoada. E, para terminar, um conselho dos autores: se não puder ir às 50 tascas, vá às sete com Palito d’Ouro. Aí vai encontrar “comida tradicional de grande qualidade, serviço eficaz, castiço, generoso até, e preços que não só não ofendem como chegam a comover.”

As 50 Melhores Tascas de Lisboa
Editora Zest
Preço de capa: 11€

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