Fugas - restaurantes e bares

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As bombas que vêm do Peru

A conversa decorre enquanto prepara as bolachas — espalha a massa com a ponta dos dedos, depois estica-a com o rolo e mostra como se parte facilmente, porque não se pode abusar da farinha. As empanadas também já estão terminadas e a repousar no congelador, dentro de caixas (vende-as congeladas ou já prontas). Cada gesto é preciso e já executado milhares de vezes. “Agrada-me esta ideia de ser tudo muito artesanal.” Para além de três bolas de massa envolvidas em película, na bancada de mármore há uma balança, um liquidificador, uma batedeira e um jarro com água.

Continua: “Não gosto nada de falar em público. Mas um dia, quando estava a trabalhar com o Rafael, tive de ir à sala explicar o meu prato. Estava uma mesa cheia de portugueses.” Um deles viria a ser seu marido. E é por isso que há cinco anos vive em Portugal.

Trazer a gastronomia peruana para Lisboa não é simples. “É muito difícil fazer uma cozinha viajar de um país para o outro. Mas a nossa gastronomia é uma fusão, não é 100% pura — tem influências chinesas, japonesas, espanholas…” Além disso, “temos costa, serra e selva, cada um com os seus produtos”; e uma batata não é igual no Peru ou em Portugal. Portanto, o melhor é assumir a distância e fazer aqui também uma certa mistura. A gastronomia peruana “avançou imenso”, exclama. “Estamos entre os melhores do mundo, não me perguntem porquê. Talvez por essa fusão, estamos sempre a recriar.” “Antes Peru era igual a perigo, terrorismo, pobreza. Agora, Peru é Machu Picchu, Peru é gastronomia.”

Ainda antes de se instalar de vez em Portugal quis conhecer o país e foi estagiar para restaurantes, como o Vila Joya – “com uma disciplina que não vi em lado nenhum; e depois da disciplina havia festa. O [chef Dieter] Koschina, quando me chamava dizia ‘Ó Peru’”. Depois, andou de Norte a Sul a comer em casas particulares para aprender aquilo que os restaurantes não ensinam.

Ainda tentou pôr a pastelaria de lado, “mas estavam sempre” a chamá-la “de Madrid para ajudar a fazer as ementas”. “Pensava ‘estou condenada aos doces’.” E foi sobretudo através dos doces que Las Cholas nasceu.

Até há dois anos, “não tinha marca, não tinha nome, não tinha nada.” “Só fazia para os amigos.” Um deles era o futebolista peruano André Carrillo, que lhe encomendava as bolachas para levar para os treinos do Sporting, em Alcochete, “e eram um êxito total”. “Ele deu-me muita força.” Outro, proprietário da loja Gardénia, abriu o Gardenia Café Chiado e convidou-a a vender ali as suas empanadas. São dois produtos que para si “representam a América do Sul”.

O alfajor terá sido introduzido pelos árabes em Espanha, onde ainda hoje é preparado, sobretudo no Natal. Mas a sua versão espanhola, com mel, especiarias e frutos secos, é bem diferente daquela que actualmente se faz na América Latina, onde terá chegado no século XV.

Não há uma receita de alfajores, “há 1001 receitas”, e Valeria Oliveri foi testando várias até ficar totalmente satisfeita. “Já estamos no caminho, agora é avançar”, diz sobre o seu projecto. A cada três meses, o carrinho/stand que neste momento está a um canto da sala “estaciona” no El Corte Inglès. A cada ida, a visibilidade de Las Cholas aumenta. “Os alfajores são uma droga, são a cocaína do Peru! Não se consegue parar. Fico admirada por ver que uma bolacha com a qual cresci, e que havia sempre em casa, agrada tanto às pessoas. É uma coisa que me emociona muito.”

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