Fugas - restaurantes e bares

  • "Vitela com Queijo Serra da Estrela, raiz de cerefolio, alcachofras, foie gras e cogumelos", o prato do chef André Silva DR
  • Petit four, Luca Arguelles
    Petit four, Luca Arguelles DR
  • André Silva a preparar o seu prato
    André Silva a preparar o seu prato DR
  • André Silva a preparar o seu prato
    André Silva a preparar o seu prato DR
  • "Finger de alperce, Queijo Serra da Estrela", em cama de feno e folhas de cardo, de Luca Arguelles DR

Eles são chefs mas a estrela é o queijo

Por Luísa Pinto

Almoço de celebração do Queijo Serra da Estrela juntou no mesmo evento seis chefs para criarem propostas que ajudem a sublinhar a importância da certificação do Queijo Serra da Estrela.

O desafio não foi com um queijo qualquer. Foi com o Queijo Serra da Estrela (não confundir com queijo da Serra, por favor, é que não é nada a mesma coisa) e isso quer dizer muita coisa.

O Serra da Estrela é um produto Denominação de Origem Protegida (DOP), feito exclusivamente com leite de ovelhas da raça Serra da Estrela e obedece a muitos critérios de certificação. Pelo terceiro ano consecutivo, mas pela primeira vez para os chefs André Silva (Casa da Calçada), Vitor Matos (Antiqvvm), Fernando Agrasar (As Garzas), Rui Silvestre (Bon Bon), Marlene Vieira (Mercado da Ribeira) e Luca Arguelles (Padaria Arguelles). A jogar em casa, e anfitrião desta constelação de talentos (alguns deles verdadeiros coleccionadores de estrelas do famoso guia Michelin), estava Paulo Cardoso, o chef residente no Parador Casa da Ínsua, onde no sábado se juntaram todos à volta do queijo.

“Eu fico responsável pelo couvert, para dar as boas-vindas e abrir a sessão aos convidados”, diz Paulo Cardoso, 28 anos de idade e seis como chef da Casa da Ínsua. Foi com o seu amuse-bouche que as centenas de participantes que encheram a sala “Príncipe das Beiras”, na Casa da Ínsua, abriram as hostilidades numa refeição que lhes haveria de tomar a tarde toda. Um “Dueto de maçã e presunto em esfera, areia de azeitona e queijo Serra da Estrela Casa da Ínsua”. Sérgio Pereira, o sommelier convidado para ajudar os convivas a fazer as harmonizações, ia dando as dicas, sem precisar de falar de marcas nem de produtores. Tinha a mesa do centro da sala cheia de propostas de vinhos do Dão. Está tudo a postos para deixar o queijo brilhar à mercê do talento e da criatividade e dos convidados.

Vítor Matos é o chef que se segue. Trouxe a homenagem ao queijo, ao reinterpretar o prato com que o chef holandês seu amigo, Michel van der Kroft, laureado com duas estrelas na última edição do guia Michelin, quis fazer um tributo à serra da Estrela. Foi com uma receita de raviolis que tudo começou, com Ver Kroft a pretender agradecer à serra as origens onde veio encontrar uma esposa. E, começando por um prato que aparenta ser simples, acabou por se criar um prato que Vítor Matos tem presentemente na carta do seu Antiqvvm - o restaurante onde ganhou uma estrela na última edição do guia vermelho.

Quando subiu ao centro da sala - este evento promovido pela Comunidade Intermunicipal Viseu Dão Lafões (CIM Viseu Dão Lafões), em parceria com a Câmara Municipal de Penalva do Castelo e o Grupo Visabeira, passa também pelo showcooking, com os chefs a explicar ao vivo como prepararam o prato, enquanto o empratam - Vítor Matos adiantou, até, que pretendia que ele continuasse na carta por mais tempo: “Ravioli Queijo Serra da Estrela com manteiga das marinhas e salva, trombetas da morte, folhas de capinha e flores”. O ravioli é feito de trigo duro italiano (“infelizmente, ainda não há em Portugal massa de trigo em condições”, diz o chef, para explicar a sua opção depois de ter afirmado que procura sempre privilegiar “o que é nosso, o que é português" ), tem recheio de queijo da serra da Estrela, pasta mole, elaborado com manteiga das marinhas e é mergulhado em água a ferver durante dois minutos. Leva por cima trombetas da morte, colhidas em Alfândega da Fé, salteadas com manteiga noisette, e as folhas de capinha e as flores são um “apontamento de bosque”, o terroir que Vítor Matos sempre gosta de emprestar aos seus pratos.

Fernando Agrasar, o senhor que se lhe seguiu, também trouxe a Galiza até à estrela. “Tinha que trazer um caldo de peixe!”, admitiu aos jornalistas, quando contava o deleite que lhe trouxe este desafio. “Não conhecia o queijo Serra da Estrela. Pedi para ver os tipos de queijo, escolhi o mais duro - porque temos na Galiza um parecido com este - e usei-o para fazer nhoquis." No meio da sala, a todos os presentes, contou como procurou desconstruir o queijo e transformar o queijo mais duro novamente num soro. Foi esse soro que usou para rechear o nhoquis e transformá-los na estrela principal de um caldo de peixe de robalo assado que deslumbrou os presentes.

Agora Rui Silvestre que, aos jornalistas, admitiu ter “sido obrigado” a trazer o Algarve até Penalva do Castelo. Enquanto as ovelhas do rebanho da Casa da Ínsua pastavam por entre o pomar das macieiras Bravo Esmolfe ali à vista de toda a gente, o chef do restaurante Bon Bon, que voltou a merecer uma estrela Michelin na edição 2017 do guia, falou de ostras e da ria Formosa. “Não é óbvio conseguir fazer uma ligação entre um queijo serra da Estrela e o marisco”, avisou. Mas o prato que ali trouxe, “Ostra do Moinho dos Ilhéus, agrião e Queijo Serra da Estrela”, desmentia-o. No prato, uma ostra suculenta no meio de dois molhos distintos: um, muito escuro, de caldo de peixe; outro, de um verde exuberante, um creme de agrião e Queijo Serra da Estrela. “É uma readaptação de um prato que eu tenho no Bon Bon, em que apresento a ostra com creme de agrião e caviar”, explica. Um prato, frio, que supreendeu.

Marlene Vieira, a única mulher entre os homens, “mas sempre mimada por todos”, trouxe a sua reinvenção do Bacalhau à Moda de Minho, o prato que toda a gente conhece, e que vem acompanhado de cebolada e batata frita às rodelas. Marlene criou um “Bacalhau frito, consommé de cebola, couves de Bruxelas e Queijo Serra da Estrela”. O queijo entra no abrandado de bacalhau feito com Serra da Estrela e ervas aromáticas; as couves de Bruxelas, cujas pétalas foram salteadas, são “o doce e amargo” que pensou para contrastar o sabor intenso do queijo”, explicou.

André Silva, chef na Casa da Calçada, que conquistou, de novo, uma estrela Michelin - “Uma estrela não se mantém, conquista-se todos os anos” -, preparou o prato mais complexo da tarde, que já se transformava em noite. “ Vitela com Queijo Serra da Estrela, raiz de cerefolio, alcachofras, foie gras e cogumelos”. O naco de vitela assentava num puré de raiz de cerefolio com Queijo Serra da estrela, e, além do enunciado no nome no prato, ainda havia um pó de pistácio e um espargo verde a contrastar. E ainda havia um outro apontamento de Serra da Estrela: um crocante feito com queijo e sementes de sésamo.

Luca Arguelles trouxe a homenagem final, para a sobremesa. O nome, “Finger de alperce, Queijo Serra da estrela e Sopa de Eucalipto” não deixava adivinhar em nada o que haveria de chegar ao prato. Numa cama de palha e folhas de cardo, a apresentação era a de um miniqueijo Serra da Estrela. Na realidade era uma pequena madalena com cobertura de chocolate branco e um finger de alperce, finalizado com um chantilly de Queijo da Serra; para acompanhar, uma infusão de eucalipto e três citrinos servida bem gelada. Luca ainda preparou o petit four que foi servido com o café. Uma “Minitarte de castanha, Queijo Serra da Estrela e aguardente velha”.

“Não há dúvida que o Luca fechou em chave de ouro”, limitou-se a comentar, no final do almoço, por entre a azáfama de pratos, o chef anfitrião, depois de ter elogiado o desempenho de todos eles. “Não há dúvida que aprendemos todos muito, aqui, uns com os outros”, sublinhou Paulo Cardoso, satisfeito com tudo o que ensinou e tudo o que aprendeu. “Eu estou habituado a trabalhar o Serra da Estrela. O meu risotto não leva parmesão”, ironiza.

Mas, mais do que aprenderam e ensinaram os chefs, sobrou a sensibilização para o produto. E para a forma como de um produto tão genuíno e tão português o consumidor final sabe tão pouco.

A Fugas participou no almoço a convite da Comunidade Intermunicipal de Municípios Dão Lafões

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