Fugas - restaurantes e bares

Adriano Miranda

Rui Paula: “Não vinha para Lisboa para falhar”

Por Alexandra Prado Coelho

O restaurante Terraço, do Hotel Tivoli da Avenida da Liberdade, reabriu a 1 de Agosto com cara nova e novo chef: Rui Paula, que vem do Porto para conquistar a capital. E já a olhar mais para além, para um palácio em Sintra.

Aquilo de que o chef Rui Paula mais gosta é da adrenalina da abertura de um novo restaurante — e é precisamente isso que está a viver neste momento no último andar do Hotel Tivoli, na Avenida da Liberdade, em Lisboa. O Terraço, o histórico restaurante do hotel, com uma extraordinária vista sobre a cidade, foi o espaço que convenceu o chef do Porto a avançar para Lisboa. 

“Tive ofertas, e não foram poucas, recusei algumas”, conta, bem-disposto, de manhã cedo, quando nos encontramos num Terraço em plenos preparativos para a sua nova vida (que passa pelo chef mas também por um novo visual, mais claro, mais arejado, a prolongar-se para o Sky Bar, que também cresceu e está mais bonito).

Rui Paula prossegue: “Mas não podia vir para um sítio qualquer em Lisboa. Sou conhecido por ter restaurantes bonitos [o DOC, junto ao Douro, entre a Régua e o Pinhão, o DOP, no Porto, e a Casa de Chá da Boa Nova, projecto do arquitecto Siza Vieira, em Leça da Palmeira, onde conquistou uma estrela Michelin. Tem ainda um restaurante no Recife, Brasil]. O espaço é importante para o negócio, não é só a comida.”

O que é que procurava, exactamente? “Ou era um restaurante meu e fazia à minha maneira ou um restaurante que não é meu e faço à minha maneira também”, brinca. “Daí ter recusado algumas coisas porque, por mais dinheiro que me pagassem, não ia ter a liberdade que queria. O objectivo é fazer um trabalho em que a minha imagem esteja segura e eu tenha prazer e seja feliz. Não é fácil. É preciso acreditarem no nosso trabalho, deixarem-nos fazer, dar provas. E não se vão arrepender.”

Trouxe para a cozinha do Terraço uma equipa nova, chefiada por Mauro Silva, que será o chef residente e que é, desde há muito, o seu braço direito. “O Mauro esteve comigo na abertura de todos os meus restaurantes, excepto o Cêpa Torta [o primeiro que abriu, em 1994, em Alijó].” Para Rui Paula é vital ter à frente da cozinha uma pessoa da sua total confiança. Só assim é possível abrir novos espaços.

A ideia de que o chef que dá o nome ao restaurante tem que estar sempre na cozinha, à volta dos tachos, não faz sentido, explica. “É preciso muita coisa para um restaurante funcionar. Estar concentrado na cozinha, o que é isso? Se o restaurante tem 80 clientes, ele sozinho vai fazer a comida de todos? Vai fazê-la mal. Tem que ter uma equipa. E boa, se calhar com alguns elementos mais tecnicistas, a cozinhar melhor do que ele.”
A proposta do Grupo Minor — que comprou a cadeia Tivoli e está a renovar os vários hotéis — foi a que, finalmente, levou Rui Paula a fazer as malas e partir para Lisboa. Mas não se trata apenas do Terraço — o que tornou a proposta irresistível foi o Palácio de Seteais (ver caixa). A ida para Sintra, contudo, demorará ainda cerca de um ano, pelo que agora é tempo de o chef se concentrar no Terraço e na nova carta que estava a ultimar para poder abrir portas esta terça-feira, primeiro dia de Agosto.

No novo espaço há, evidentemente, uma continuidade do seu trabalho nos outros restaurantes mas com muitos pratos adaptados ou pensados especialmente para aqui. Rui Paula vai buscar a lista, ainda provisória, com anotações a lápis, mostrando que o trabalho ainda não estava concluído no dia em que o encontrámos. Tem vindo a discutir com a equipa porque é assim que gosta de fazer as coisas, ouvindo as ideias dos que trabalham consigo e, quando são boas, integrando-as.

“Não fazia sentido vir para Lisboa fazer um copy/paste dos outros espaços. Quero resgatar alguns pratos daqui, assim como trazer outros que me caracterizam, a minha maneira de empratar, o tratar o produto em três vertentes, por exemplo. E terei algumas influências do mundo, em pratos mais internacionais.” 

Garante, contudo, que não está a preparar um restaurante para os turistas que enchem Lisboa por estes dias. “Não pretendo que este seja um local para os hóspedes do hotel, embora eles também venham. Tenho a certeza de que vamos ter muitos clientes portugueses. É minha obrigação fazer isso. Restaurante que não tem portugueses, para mim não é restaurante.” 

Mostra a carta: nas entradas encontramos, por exemplo, carpaccio de polvo e romã; ceviche de camarão e lírio com manga verde e chili; carabineiros, citrinos e cenouras; rosbife no carvão com toro de atum, tutano e chicória; língua de vitela, ostra glaciada e puré de maçã assada; nos peixes podemos optar por um xarém de amêijoas e lingueirão com robalo; um salmão niçoise; uma caldeirada ou um arroz caldoso de peixe e lavagante. Nas carnes, as propostas passam por carne maturada no carvão com legumes grelhados; lombinho de novilho, isca de foie, puré de batata fumada e couve glaciada; pá de cordeiro ou carne de porco preto à alentejana. E nas sobremesas, para dar dois exemplos, haverá chocolate, caramelo e açafrão ou creme brûlée de chocolate branco.

Tem ainda a ideia de resgatar alguns pratos clássicos dos tempos em que o Terraço era um restaurante de referência. “Tenho clientes com 70 anos que vinham aqui com os pais e falam de pratos como o robalo ao sal. Isto quer dizer alguma coisa. Põe-nos em sentido.” Até porque, garante, gosta de desafios. “Sei que resgatar este Terraço é um feito. Não só porque ‘venci’ em Lisboa, como porque o trouxe de novo para a ribalta. Não é por ter uma estrela Michelin que penso que sou o rei da festa. Quero fazer bem e quero vencer. Não vinha para Lisboa para falhar.”

 

O sonho de Seteais

“Seteais foi determinante” para aceitar a proposta do Grupo Minor, proprietário da cadeia Tivoli, admite o chef Rui Paula. O Tivoli Palácio de Seteais, em Sintra, está também em obras e quando estiver pronto, dentro de um ano, receberá a cozinha de Rui Paula. “Gosto de trabalhar em coisas mais pequenas, Seteais tem uma beleza incontornável, posso fazer festas bonitas e trabalhar um restaurante gastronómico.” Ao nível da Casa de Chá da Boa Nova? “Ou mais… vai ser top.”

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