Fugas - restaurantes e bares

  • Adriano Miranda
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“Uma fotografia de um prato meu não representa o que aqui é feito”

Por Alexandra Prado Coelho

O que é que uma fotografia tirada apressadamente para publicar numa rede social diz sobre um prato e sobre o pensamento e o trabalho que um chef colocou nele? Na opinião de Pedro Limão, nada.

“Já pensei pôr na porta do restaurante um papel a dizer: fotografia, só com conversa antes”, diz, meio a sério, meio a brincar. Pedro tem uma ideia muito concreta do que espera de um restaurante — pelo menos do seu. E desde há três meses tem no Porto (Rua Morgado Mateus, 49) um novo espaço, com o seu nome “de guerra” (Limão não é o seu verdadeiro apelido).

“O que espero que aconteça é que as pessoas venham com espírito crítico porque hoje em dia é o que acontece em todo o lado.” Parte dos clientes que entram pela porta do Pedro Limão — um espaço pequeno (apenas 22 lugares, só jantares) com cozinha aberta, uma condição indispensável para Pedro — já o conhecia de projectos anteriores. Houve o Clandestino, na sua própria casa (o pote nas fotos era onde recebia o dinheiro que os clientes entendiam pagar e a tábua da foto é também uma fiel companheira de sempre), e a Oficina de Cozinha, também no Porto. Todos marcados por um estilo muito próprio deste urbanista, hoje com 41 anos, que aos 30 decidiu mudar de vida e foi estudar cozinha para Barcelona.

Esses, e mesmo alguns dos que chegam aqui pela primeira vez, “são pessoas que vêm para comer, para conversar sobre comida, entrar na cozinha, ver o que estamos a fazer, pegar no sauté e saltear qualquer coisa”, como já aconteceu. Mas há outra parte dos clientes que “vêm tirar fotografias para postar no Instagram e no Facebook”, e essa é uma abordagem com a qual Pedro não se identifica.

“Não me interessa ter fotografias dos meus pratos no Instagram, quero que essa partilha seja directa e não virtual. Gosto muito mais de ver, como aconteceu ontem, um cliente levantar-se no final do jantar e estar meia hora a falar comigo na cozinha, a trocar experiências.” Sente que se, apesar da cozinha aberta, os clientes nem olham para o que se está a fazer do outro lado do balcão é porque “não têm um interesse genuíno na cozinha”.

Garante que quando vai a um restaurante nunca fotografa os pratos. “É como se os telemóveis ficassem lá fora e isto se tornasse um espaço de comunicação real.” Porque, diz, ele e a sua equipa, que inclui a mulher, Cátia, que ajuda na sala e em toda a organização, e João, o seu número dois, têm histórias para contar sobre os pratos que ali se fazem — um menu de degustação composto por uma sequência de dez pratos (mas com flexibilidade para uma escolha menor).

Por exemplo, este polvo com tapioca, que Pedro acaba de colocar à nossa frente, tem a sua história. “A ideia deste prato tem a ver com o formato dos tentáculos do polvo e da tapioca. Andamos à volta de círculos e texturas.” E, na verdade, à volta do sabor do polvo porque todo o prato é construído com base nele: há um tentáculo, a tapioca é cozinhada na água de cozer o polvo e a espuma que o acompanha é feita com a mesma água, o que o torna (quase) monocromático.

“Gosto de pratos com um só produto”, explica Pedro. “Já tive um que era só com bacalhau, os sames, as línguas, as caras, outro só com choco, e tenho um, que é um sucesso, só à base de cogumelos. É uma coisa que me interessa explorar.”

Outra coisa que o tem andado a entusiasmar é o peixe dos Açores. “Fui contactado por um produtor que me falou da pesca à linha e agora todas as semanas encomendo um peixe diferente.” Hoje serve-nos anchova braseada com ceviche de camarão, um caramelo feito com as cabeças dos camarões e uma espuma de amêndoa amarga e tangerina — dois sabores que lhe ficaram de uma passagem pelo Algarve onde trabalhou durante um curto período no restaurante da Casa Mãe, em Lagos.

O trabalho com os produtores é muito importante para o projecto. Cátia aproveita para nos dar a conhecer os azeites do Olival da Risca, em Serpa, com os quais estão a trabalhar. “Hoje temos uma panóplia enorme de coisas que podemos trabalhar”, declara Pedro. “Os produtores evoluíram muito e estão muito disponíveis e a lutar por fazer vingar as marcas que representam.”

Quando pensa um prato começa quase sempre pelo ingrediente que tem vontade de trabalhar e só depois passa para a técnica. Mas, porque precisa de estar constantemente a encontrar estímulos — o risco de se dispersar e querer passar para o projecto seguinte é algo que ainda está a aprender a gerir — optou por criar dificuldades a si próprio e à sua equipa para puxar pela criatividade.

Daí que o restaurante não tenha forno, obrigando o chef a encontrar técnicas alternativas para o substituir e, diz, no último ano a sua cozinha tem evoluído muito mais, recorrendo, por exemplo, às cozeduras a baixa temperatura, aos desidratados, aos curados, aos pickles e aos fermentados, embora estes “com muita calma”. Inicialmente tinha até pensado ter aqui só grelha e chapa — mas esse projecto, mais de comida de tasca, talvez fique para outra fase da sua vida.

Para já, está empenhado em consolidar o Pedro Limão e, quem sabe, mais para a frente fazê-lo crescer. “Não penso que dê muito mais trabalho ter dois restaurantes do que um.” E, apesar de defender a proximidade com os clientes, não acha que seja preciso estar pessoalmente sempre no restaurante. “Não acredito no one-man-show. O Pedro Limão tem que funcionar sem mim. E funciona.”

Com Pedro ou com a sua equipa, o importante é criar um ambiente descontraído, em que todos se sintam bem. “Não temos problema nenhum em estar na cozinha e a beber um copo de vinho em frente ao cliente. Esperamos que as pessoas se sintam em casa e para isso nós temos que nos sentir em casa também.”

Resposta rápida

O Porto é hoje, gastronomicamente, muito diferente do que era há cinco anos?

É. O Porto está a viver uma coisa para a qual não estava preparado. Abrem três ou quatro restaurantes todos os dias. Não sei se isso é positivo. Mas também existem mais coisas onde vale a pena ir e por esse lado está muito melhor.

Há algum ingrediente que o ande a obcecar?

Os pickles. Ando a planear um menu todo à base de pickles, desidratados, espumas, com a matéria-prima principal fumada ou braseada.

O que é que torna um restaurante inesquecível para si?

A comunicação que se consegue entre a equipa e os clientes. É fundamental criar-se espaço para que ela exista.

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