Fugas - restaurantes e bares

  • Rui Gaudêncio
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O alimento que é gesto e poesia

Há nove anos regressou a Portugal e começou à procura de um caminho que passava já não pela matemática mas pela cozinha – curso na Escola de Hotelaria do Estoril, mestrado de Ciências Gastronómicas, uma passagem pelas cozinhas dos cruzeiros de luxo – que foi uma experiência de “escravatura moderna” – mais algumas viagens, um estágio em São Paulo e, sobretudo, muitas ideias e, apesar da timidez que diz ter, “uma energia aqui dentro, uma vontade de fazer tudo”.

Retira as batatas-doces que cozeu sem água numa panela de pedra-sabão e começa a combiná-las com outros elementos. “Há muita nobreza na cozinha de família, de casa, muita honra, muita dignidade. É esse contacto que gosto de transmitir.” Na Galeria Monumental, os visitantes eram recebidos por uma roda de folhas de couve no chão e, suspensas sobre elas, a bata e a faca com que a avó de Patrícia faz o caldo verde.

“Tenho um fascínio pelo gesto”, explica. “Precisamos dele para dar dignidade às coisas.” As pessoas eram depois convidadas a usar uma máquina para cortar a couve e fazerem o caldo verde. “Vemos as coisas a transformar-se, vemos a passagem do tempo. Hoje em dia não nos permitimos isso. Fazemos auto-estradas para que o caminho seja mais rápido, para termos mais tempo, mas vamos integrando cada vez mais coisas em cada momento que ficou livre.”

Aqui é preciso parar, olhar, ouvir, cheirar, provar, sentir. À sua instalação na Monumental, Patrícia chamou Partage du Sensible. “Gosto que haja alguma magia. Por isso não gosto de prefácios.” Basta estar em contacto. Algures num tempo suspenso.

Três perguntas rápidas

Há uma poesia no que comemos?

Acho que, quase sempre, a poesia é o corolário da verdade. Já viste o que é dar um golo num copo de água gelada e sentir cada curva que nos percorre cá dentro? Só pode ser poesia.

O que sonhas capturar num prato?

Diria o sonho, sou uma daydreamer. Adoro o olhar pela primeira vez, a surpresa, os impossíveis. Mas depois é uma pertença que desagua em nós. 

És tu quem transforma os alimentos ou são eles que te transformam a ti?

Acredito que somos ambos alimento.

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