A subir todos os deuses ajudam. O problema de chegar ao cimo de uma pirâmide maia não são as dezenas de degraus íngremes a testarem-nos a resistência das pernas, nem o sol a bater-nos de chapa, nem a humidade que se cola à pele, deixando-a pegajosa. O problema é voltar cá para baixo quando não se tem asas.
O grito agudo dos pássaros contribui para a sensação de estarmos a descobrir pela primeira vez estes templos perdidos na selva, obra de uma enigmática e poderosa civilização nascida há três mil anos e cujos vestígios ocupam não apenas o México como três países vizinhos Guatemala, Honduras e Belize.
Em Ek-Balam um passo mal dado pode fazer-nos espatifar de uma altura de mais de 13 andares. Por isso, cada descida é uma prova de perícia. Há os que perdem a vergonha e descem de rabo colado aos degraus, agarrados à corda que foi ali posta para isso mesmo. Os que ficam parados a meio da pirâmide, à espera de um arroubo de coragem que os faça retomar a pavorosa viagem em direcção ao solo. E os que chegam cá abaixo num instantinho, porque descobriram o truque de atacar cada degrau de forma enviesada, assim como quem diz de lado, ziguezagueando ao longo da escadaria. Seja qual for a técnica improvisada na altura, por momentos somos obrigados a esquecer-nos das fascinantes serpentes emplumadas e dos guerreiros alados que nos ladeiam, figuras saídas da imaginação fértil dos maias e esculpidas nas fachadas dos imponentes edifícios do sítio arqueológico.
Para cá chegar é preciso percorrer uma vasta área de mata. Depois vem a recompensa, as ruínas do século IX a fazerem-nos abrir a boca de espanto. Os descendentes dos antigos maias são homens e mulheres atarracados, muitos deles iletrados, a morar em aldeias de cabanas. Quando a sua civilização estava no auge, entre o século IV e o século VIII, havia uma elite com conhecimentos excepcionais de astronomia e de matemática, como atesta a concepção das próprias pirâmides, que inventou uma escrita própria, hieroglífica, cujo significado só conseguiu ser desvendado pelos investigadores na década de 70 do século passado. Mas porque praticavam então uma agricultura tão rudimentar, baseada em queimadas, e praticamente sem recurso a utensílios agrícolas? Terá este método de subsistência contribuído para o inexplicável declínio da civilização maia? Alguns autores dizem que sim: que as secas ocorridas vários séculos antes da chegada dos espanhóis, aliadas à erosão dos solos provocada pelos próprios maias, levou ao abandono destas cidades feitas de templos.
De Ek-Balam avistam-se as famosas pirâmides de Chichén-Itzá, eleitas uma das novas maravilhas do mundo. Mas é sobretudo na tranquilidade de Ek-Balam, muito mais do que no campo pejado de turistas e de vendedores de "souvenirs" de Chichén-Itzá, que se pode sentir o espírito da civilização maia, com os seus rituais, magias e sacrifícios.
Para perceber que muitos dos templos foram um dia coloridos, e não de pedra crua, como nos chegaram até hoje, é preciso ir a Tulum. Nos edifícios espalhados por cima da praia ainda há vestígios da tinta vermelha e azul usada naqueles tempos. Depois há que descer ao areal, porque estamos numa das praias mais bonitas da região se é que é possível distinguir uma de entre tantas belas praias. Não é barato nem tem os luxos dos inúmeros "resorts" da região, mas nesta zona vale a pena alugar uma cabana para acordar em pleno areal, com o mar transparente e morno a meia dúzia de passos.